Desde que se tornou executivo-chefe da Procter & Gamble (P&G) em 2000, A.G. Lafley nunca enfrentou uma situação tão difícil. As ações da maior fabricante mundial de bens de consumo perderam cerca de 30% do valor desde o quarto trimestre.
Os consumidores dos Estados Unidos trocam os produtos de marcas com preços mais caros, como a Tide, Gillette e Pampers, da P&G por produtos de marca própria. O mau momento econômico disseminou-se para os países em desenvolvimento, nos quais a empresa registra suas melhores taxas de crescimento. Lafley, contudo, mostra-se destemido.
Sentado em seu escritório em Cincinnati, o executivo de 61 anos falou à "BusinessWeek", sobre como administrar negócios em tempos de recessão. Seguem abaixo os principais trechos da entrevista:
Prioridades de gastos - Continuamos a investir em nossos pontos fortes essenciais. Primeiro, não economizamos na compreensão do consumidor. Segundo, a inovação. Nossas despesas de capital aumentarão em 2009 para novas tecnologias industriais e de engenharia. E terceiro, a construção de marcas. Embora, na verdade, estejamos gastando menos dólares em publicidade porque o preço na mídia caiu, estamos enviando mais mensagens aos consumidores.
Fracasso de produtos - Em nossa indústria, apenas 15% a 20% dos novos produtos têm êxito. O índice de sucesso da P&G é um pouco superior a 50%. Nos anos 90, porém, estávamos nessa média do setor. Melhoramos nossa média de acertos ao simplificar o processo de inovação. Criamos pontos de controle com medidas claras para cada fase do processo, desde a concepção até o desenvolvimento e comercialização. Se um projeto dá a impressão de que não dará certo, o largamos. Aprende-se mais do fracasso do que do sucesso, mas a chave é fracassar mais cedo, fracassar mais barato e não cometer o mesmo erro duas vezes.
Preços mais altos - A chave a ser compreendida é que não estamos em um negócio de commodities. Não vendemos itens que flutuam baseados nos preços dos insumos. Vendemos uma marca. Podemos criar mais valor com o novo Downy, um produto de limpeza de pratos no México, por US$ 1. Podemos fazê-lo por US$ 5 ou US$ 10, com um produto de limpeza doméstica como o Tide, ou por US$ 40 a US$ 50, com itens de cuidados pessoais como alguns cremes faciais Olay. Tudo se resume a quem é a consumidora e o que tem valor para ela.
Criatividade e inovação - É preciso criatividade e inovação, mas até que se consiga vincular essa criatividade ao cliente na forma de um produto ou um serviço que mude sua vida de forma significativa, eu sustentaria que ainda não se obteve alguma inovação. Nos anos 60, inventamos um material que absorvia muita água. Até transformá-lo na fralda descartável de bebê Pampers, era apenas um novo tipo de material. Criamos esta categoria inteiramente nova de produto e isso criou um segmento industrial. Gostaríamos que esses tipos de inovações intermitentes fossem entre 20% e 25% do que fazemos. Para sustentarmos o crescimento das vendas e do lucro, temos de inovar.
Relações com os varejistas - Praticamente todo varejista com o qual trabalhamos gosta do fato de que lideramos em matéria de inovação. Isto cria aumento nas vendas das categorias existentes. Cria novas categorias que são fontes de crescimento das vendas e do lucro no futuro. Leva consumidores a suas lojas para experimentar novos produtos e os volta a levar às lojas, onde podem conseguir produtos nos quais confiam.
Ascensão das marcas próprias - As marcas próprias representam menos de 1% do mercado varejista nos Estados Unidos e ganham força em segmentos que carecem de inovação. É difícil inovar em categorias de alimentos comoditizados, nos quais as marcas próprias mais avançam. As marcas próprias são imitadoras. As marcas e produtos da P&G são inovadoras.
Oportunidades de expansão - Hoje temos alcance a mais da metade dos 6,7 bilhões de consumidores do mundo. Daqui a vários anos, queremos chegar a mais 1 bilhão de pessoas e grande parte desse crescimento será nos mercados emergentes, onde a nasce a maioria dos bebês e está sendo formada a maioria das famílias. Prevemos crescimento em toda nossa carteira de produtos.
Aquisições - Nosso foco é o crescimento sustentável de longo prazo. Aquisições e vendas de operações sempre fizeram parte dessa estratégia e continuarão a ser no futuro.
Alianças de negócios - Lá atrás, em 2000, estabelecemos a meta de ter parceiros para metade de todos nossos produtos. Atingimos esse objetivo em 2007/2008. Isto, obviamente, nos poupa muito dinheiro. Podemos pegar US$ 1 da P&G e transformá-lo em US$ 1,50 ou US$ 2. Praticamente todo o trabalho não se vê - receber uma encomenda de um varejista ou atacadista, processar as encomendas, o trabalho dos cientistas nos centros de pesquisa. Tudo é executado conjuntamente, por trás da cena, com sócios. Portanto, nossa margem de lucro operacional aumenta, mesmo quando ainda estamos investindo em pesquisa e desenvolvimento, construção de marcas e capital para reforçar a inovação.
Aposentadoria - Por favor, não tenho nem 62. Tenho algum caminho pela frente. Neste momento, estou direcionado como um laser na P&G e nos acionistas da P&G. Provavelmente será algo bem diferente aos 65 ou mais. Este é um trabalho de sete dias por semana e ainda me sinto jovem.
Veículo: Valor Econômico