Aceitar uma contraproposta exige cautela

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Em outubro do ano passado, nem mesmo a promessa de uma remuneração maior e a oferta de cargo de liderança em uma nova área foi capaz se reter Ulisses Abrahão, 30 anos, na Tivit. Formado em Processamento de Dados, ele já havia passado pela Itautec, Microsoft e Unisys e desde 2007 era o gerente de TI na companhia, que faz parte do Grupo Votorantim. Abrahão conta que assumira o posto com a missão de tornar o service desk (serviços de suporte realizado por telefone ou sistema remoto) vendável. Para isso, era necessário profissionalizar a operação e torná-la capaz de atender ao mercado como um todo, não somente a Votorantim. Porém, no final de 2008, um headhunter entrou em contato com Abrahão para lhe comunicar uma proposta de trabalho. "Foi indicação, pois eu não estava com o currículo do mercado", observa.

 

Ele se interessou pela oferta mesmo sem saber que a empresa que estava de olho nele era a Nestlé. A única informação que Abrahão possuía era que se tratava de uma multinacional. A proposta era que ele assumisse o cargo de gestor de service desk da companhia e, com isso, gerisse três equipes: uma em São Paulo, uma em Santiago (Chile) e outra em Saint Louis (Estado Unidos). O desafio era elevar a qualidade dessas operações e deixá-las tão eficazes quanto qualquer prestadora externa do serviços.

 

A Tivit até tentou reter Abrahão. E não com apenas uma, mas com duas contrapropostas. A primeira dizia respeito a uma remuneração maior. "Em momento algum foi colocado que o motivo da minha saída era financeiro", diz. Ela tampouco tinha desentendimentos graves na empresa, o que está longe de significar total satisfação. "A Tivit estava crescendo muito, mas não de uma forma que eu achava coerente, com a devida valorização dos profissionais", pontua. Ou seja, o que estava em pauta na troca de emprego não era o dinheiro. "Dificilmente uma contraproposta mudaria minha decisão, até porque a questão não era financeira. Não acho interessante ou coerente dar feedback a qualquer profissional apenas quando há risco de perdê-lo", critica.

 

Houve ainda uma segunda contraproposta, com a qual a Tivit acenou com a criação de uma nova área na empresa e que seria de responsabilidade de Abrahão. Mas ele continuou inflexível. "Acho cômodo esperar pelo o risco de perder um profissional para, só então, valorizá-lo. É uma postura puramente reativa, e foi isso que me trouxe mais desgosto e tirou a motivação do meu dia-a-dia", esclarece. Por outro lado, a Nestlé estava oferecendo a ele uma atenção diferenciada, com plano de carreira estruturado, entre outras coisas, sugerindo que a atenção aos colaboradores era uma parte concreta dos negócios.

 

Apesar de ter recusado as ofertas para continuar na Tivit, Abrahão não é categórico sobre o assunto. Para ele, cada contraposta precisa ser avaliada individualmente, tanto por empregadores quanto por empregados. Para ele, o histórico do profissional conta muito nessa hora. Se o desligamento estiver ocorrendo exclusivamente por questões financeiras, é viável oferecer uma remuneração maior. Mas se os motivos que o levam a buscar outro emprego estão vinculados a um relacionamento ruim do os chefes ou à falta de perspectivas na carreira, é mais aconselhável deixar que a mudança ocorra. "Já cheguei a presenciar turnovers de 20% a 30% da minha equipe, pois as pessoas não acreditavam mais na empresa. Alguns saem até por uma remuneração menor. Alguns dão um passo para trás, mas sabem que poderão avançar seis em um segundo momento", diz.

 

O diretor da Robert Half, Fernando Mantovani, tem uma ponto de vista semelhante sobre o assunto. Segundo ele, nos cargos mais elevados, a remuneração é o último elemento considerado na hora de aceitar um emprego. Antes dela os profissionais avaliam a relação com os superiores, a qualidade de vida que o trabalho permite e as perspectivas de carreira oferecidas. "Normalmente as pessoas aceitam uma contraproposta por questões financeiras. Dificilmente um novo escopo de trabalho está em questão nesses casos", observa.

 

O fato da aceitação de uma contraproposta estar relacionado, principalmente, a uma remuneração mais polpuda, em detrimento dos outros elementos decisivos para a satisfação profissional, ajuda a explicar por que a maioria dos optam por permanecer no mesmo emprego rapidamente se arrependem. "Segundo nossos estudos, 80% dos profissionais busca novamente um emprego cerca de seis meses após a aceitação de uma contrapropostas, pois aquilo que os deixou insatisfeitos continuará, provavelmente, ocorrendo", aponta Mantovani.

 

O consultor observa ainda que ao aceitar uma contraproposta o profissional corre o risco ficar "manchado" na empresa. Com isso, quando surgir uma possibilidade de promoção, ele poderá ser preterido em favor de um colega considerado mais "fiel" à companhia. Sem contar que os colegas, ao saberem de um eventual aumento devido negociação da permanência, também podem ficar incomodados.

 

Compromissos assumidos

 

Para Mantovani, quando alguém participa de um processo de seleção e chega até a última fase, revelando interesse pelo posto, está transmitindo - claramente ou implicitamente - um sinal verde ao seu futuro empregador, que muitas vezes já realiza planejamentos devido à chegada do profissional. Nesse caso, uma negativa é algo extremamente inesperado e inoportuno. "A decisão de mudar de emprego deveria ter sido tomada antes desse processo. Se ele é o selecionado, a única resposta possível é o sim. É um erro participar de processos de seleção para testar a empregabilidade", alerta. "Toma-se tempo da empresa e dos diretores com isso", lembra.

 

O consultor aconselha que antes de se colocar à disposição de outras companhias o profissional conserve com o atual empregador sobre as suas insatisfações. "A partir do momento que começa a olhar para o mercado, ele deve estar com sua decisão de deixar o atual emprego tomada", completa.

 

Veículo: Gazeta Mercantil


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