O Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (Para) da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) encontrou irregularidades em 15,28% das 1773 amostras de alimentos analisadas em 2008. Mas sobre esse índice de inconformidade apurado em 17 culturas pesa muito mais o uso de defensivos agrícolas não autorizados para determinadas plantações, do que a aplicação de produtos banidos ou excesso de outros permitidos.
De acordo com Sérgio Henrique Monteiro, pesquisador do Laboratório de Resíduos de Pesticidas do Instituto Biológico da Agência Paulista de Tecnologia do Agronegócio vinculada à Secretaria de Agricultura do Estado de São Paulo, os resíduos em excesso de agrotóxicos nos alimentos aqui produzidos não ultrapassam os limites traçados pela Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO, sigla em inglês).
De acordo com o monitoramento da Anvisa, o produto que apresentou maior índice de irregularidade foi o pimentão. Das 101 amostras analisadas, 65 apresentaram irregularidades - 18 ingredientes ativos não autorizados para a cultura e outros quatro acima do limite regulamentado pela legislação. Os agrotóxicos não autorizados aplicados nas amostras irregulares são, contudo, autorizados na cultura do tomate, "o que indica um desvio de uso desses produtos, considerando a similaridade botânica, e consequentemente a incidência de pragas e doenças entre as culturas", avalia a Anvisa.
No entanto, a Agência pontua a detecção de resíduos de dicofol, agrotóxico do grupo químico dos organoclorados e que pertence à classe toxicológica II (altamente tóxico). O defensivo em questão tem o uso restrito em determinados países pelo impacto que provoca ao meio ambiente e também pelo risco à saúde humana. No Brasil, o uso é autorizado apenas para nas lavouras de algodão, citros e maçã.
Esse e outros usos não autorizados são medidas compensatórias adotadas para suprir a carência de produtos específicos para combater as pragas que atacam "culturas menos privilegiadas", como no caso do pimentão. O pesquisador Monteiro explica que é a indústria de defensivos quem financia o registro do produto oferecido por ela ao mercado, "mas, no caso da culturas menores, a viabilidade comercial não é tão atraente assim".
Segundo Monteiro, o pimentão têm 38 ingredientes ativos de diferentes classes para a proteção da cultura, e ainda assim o produtor precisa recorrer a outras composições químicas para defender a lavoura. A culturas de baixo, ou nulo, suporte fitossanitário, como a do alho poró por exemplo, não são oferecidas quaisquer composições orgânicas defensivas, "apenas quatro produtos inorgânicos, que não chegam a ser um agrotóxicos", pondera o pesquisador.
José Otávio Menten, diretor-executivo da Associação Nacional de Defensivos Vegetais (Andef), argumenta que, assim como em monitoramentos anteriores, 90% das amostras irregulares acusam o uso de produtos não registrados. Mas, para ele, tanto a aplicação excessiva quanto o uso alternativo de defensivos apurados pela Anvisa demandam "treinamento dos agricultores para que eles sigam as doses e as carências de acordo com o produto escolhido". De acordo com ele, só no ano passado 870 mil agricultores brasileiros foram instruídos quanto ao uso correto dos produtos. "O problema persiste entre os pequenos agricultores", avalia.
A cultura do tomate foi a que apresentou maiores avanços quanto à diminuição dos índices de irregularidades. Em 2007, 44,72% das amostras de tomate analisadas apresentaram resíduos de agrotóxicos acima do permitido. No último ano, esse número caiu para 18,27%.
Veículo: Gazeta Mercantil