Ricardo Camargos, diretor da ABF: "O governo baixou as taxas de juros, mas as dos cartões continuam elevadas" ."Antes, as operadoras de cartão diziam que as taxas eram altas porque não havia escala. Agora, há escala, mas eles não mexeram nas taxas". A reclamação é João Baptista Júnior, diretor da rede Rei do Mate e coordenador do comitê das varejistas de alimentação na Associação Brasileira de Franchise (ABF).
Segundo Baptista Júnior, o meios eletrônicos de pagamentos (vale refeição, cartão de crédito e débito) já representam 30% das vendas da rede de cafeterias, que recebe uma grande parte dos pagamentos à vista. Nas redes de fast-food, os cartões têm uma participação ainda maior, em torno de 50%. Nas redes de restaurantes, esse percentual já atinge até 70%.
Para Baptista Júnior, os valores cobrados são "desproporcionais e absurdos". "Os percentuais são mais altos que os impostos que os pequenos estabelecimentos pagam com o Simples. Há uma clara distorção", afirmou o executivo.
Os estabelecimentos pagam às operadoras de cartões 6% do valor da transação para pagamentos com vale refeição. A taxas dos cartões de débito variam entre 1,8% e 3% , enquanto as taxas do cartões de crédito oscilam entre 2,5% e 3%. Além disso, as empresas que fornecem os terminais cobram R$ 60 de aluguel por mês por máquina.
De acordo com o diretor da ABF, Ricardo Camargo, vários estabelecimentos franqueados não conseguem arcar com o custo do uso do cartão. Os lojistas acabam sendo obrigados a não aceitar os cartões, mas correm o risco de perder clientes, diz Camargo. "Trata-se de um contra-senso econômico soberbo. O governo baixou as taxas de juros, mas as dos cartões continuam elevadas", disse o executivo.
As varejistas, sobretudo as redes de menor porte, alegam que as altas taxas cobradas pelos bancos e bandeiras de cartões elevaram os custos operacionais com a disseminação dessa forma de pagamento nos dois últimos anos. Como grande parte dos pagamentos que antes era feita em dinheiro ou cheque agora é feita com cartão, a "mordida" dos cartões no faturamento dos estabelecimentos comerciais passou a ser maior.
O economista-chefe da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) Marcel Solimeo, espera que o Banco Central melhore as práticas da indústria de cartões. Ele disse que a Associação é frequentemente procurada por varejistas descontentes com as empresas de cartões. "As queixas são mais frequentes entre os pequenos lojistas", afirmou Solimeo.
Os principais motivos de reclamação dos lojistas são as taxas cobradas, o custo do aluguel das máquinas (POS) e o fato de ser necessário ter um equipamento para cada bandeira. Como os grandes varejistas acabam conseguindo condições melhores dos cartões, os pequenos ficam em desvantagem.
O governo está atento a essa situação e prepara medidas. Estudo feito pelo Banco Central divulgado no início de abril constata que a indústria brasileira se caracteriza por uma verticalização, que "gera ineficiência por minimizar possíveis ganhos de escala e introduzir barreiras à entrada no mercado".
Conforme antecipou o Valor na coluna da página A2 da edição de ontem, o governo prepara medidas para combater a concentração, especialmente nos negócios de credenciamento.
As empresas adquirentes do setor de cartões não quiseram comentar a intenção do Banco Central. A Visanet alegou, por meio da assessoria de imprensa, que está no período de silêncio que antecede o processo de abertura de capital e lançamento de ações. A Redecard afirmou que qualquer manifestação a respeito seria feita pela associação do setor, a Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs). A Abecs afirmou, por meio de nota, que "prefere não se manifestar sobre o assunto neste momento".
A expectativa é que as empresas do setor se manifestem a respeito do assunto no prazo final de entrega de críticas e sugestões ao diagnóstico sobre a indústria de cartões feito pelo Banco Central. O prazo para entrega das sugestões termina em 30 de junho.
A presidente da CVM, Maria Helena Santana, disse em Brasília que, no lançamento de novas ações, as empresas de credenciamento de cartões "terão que deixar muito claro nos prospectos, essa tendência da regulação". Ela explicou que é preciso que os potenciais compradores dos papéis sejam informados "com muita transparência", o que exige das empresas que lançarão os papéis incluir nos prospectos uma avaliação sobre a possibilidade de desconcentração.
Veículo: Valor Econômico