Um presidente forjado em West Point

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Formado na mais prestigiada academia militar dos Estados Unidos, o executivo Mark Clouse tem a missão de dobrar o faturamento da filial da Kraft no Brasil. E de bater seu maior inimigo, a Nestlé
 


O americano Mark Clouse é sempre uma atração na fila do restaurante dos funcionários da subsidiária brasileira da Kraft Foods, a segunda maior fabricante de alimentos do mundo. Primeiro, por seu porte. Com quase 2 metros de altura, mais de 100 quilos e a cabeça luzidia, Clouse chama atenção por onde passa. Depois, por seu cargo. Desde o início de janeiro de 2008, ele é o presidente da operação da empresa no país. Por tradição e cultura de hierarquia, os altos executivos da Kraft sempre mantiveram certa distância dos funcionários da base. Clouse vem tentando romper esse hábito, almoçando quase todos os dias no bandejão oferecido aos cerca de 600 funcionários que trabalham na sede da companhia, localizada em Curitiba. "As pessoas acham que liderança é um chefe ditando regras para um subordinado", diz Clouse. "Mas aprendi que a verdadeira liderança é conseguir convencer as pessoas a se engajar em torno de um objetivo comum."

 
  
A concepção de liderança de Clouse está diretamente ligada à sua biografia. Formado em economia pela Academia Militar de West Point, a mais prestigiada escola militar dos Estados Unidos, localizada no interior do estado de Nova York, Clouse serviu o Exército americano durante seis anos. Foi piloto de helicópteros, entre eles a unidade de ataque UH-1 Iroquois, conhecida como Huey, intensamente utilizada na Guerra do Vietnã. Aos 25 anos, assumiu o comando de uma base militar dos Estados Unidos na Coreia do Sul. Três anos depois, foi trabalhar na sede da Kraft Foods, nos arredores de Chicago. Seu maior desafio na carreira foi dirigir a filial da empresa na China. Lá, Clouse implantou uma estratégia baseada em inovação, reformulação de produtos, novos formatos de embalagens e foco em alguns mercados. Por anos, segundo Clouse, a Kraft vendeu produtos inadequados ao paladar do consumidor chinês. Sua missão foi adaptar uma multinacional tipicamente americana às especificidades de um dos mercados de maior crescimento no mundo. Em apenas dois anos -- entre 2006 e 2007 --, o faturamento da Kraft na China dobrou, chegando a 200 milhões de dólares. "No serviço militar, aprendi a dar prioridade ao que realmente é importante", diz Clouse. "Não interessa o quanto somos bons. Se não tivermos foco, não conseguiremos ir longe."

 

Foi o desempenho frente à filial chinesa que credenciou Clouse, hoje com 39 anos, a assumir a Kraft do Brasil, uma das dez maiores operações da companhia no mundo, com faturamento de 4 bilhões de reais em 2008. Quando ele chegou ao país, a empresa crescia à média de 8% ao ano, índice abaixo das expectativas da matriz. Durante seis meses, os 7 000 funcionários ficaram sem presidente. A liderança estava esfacelada. Clouse atacou o problema, trocando as funções de quatro dos 14 diretores e trazendo um forasteiro para ocupar o cargo de um alto executivo recém-aposentado. Em seguida, reorganizou a companhia em divisões, de acordo com a participação no faturamento. A Kraft passou a ter quatro áreas: chocolates e biscoitos, bebidas e sobremesas, a associação com a Sadia (para produção, venda e distribuição do queijo processado Philadelphia) e região Norte-Nordeste. "Hoje, administramos nosso tempo de acordo com o que cada produto merece", diz Romeo Lacerda, diretor da divisão de chocolates e biscoitos, a mais importante da empresa. Negócios pouco rentáveis, como a marca de sucos Maguary, foram vendidos.

 

Muitos fatores ajudaram empresas de bens de consumo de massa como a Kraft a ter bons resultados no Brasil nos últimos tempos: a ascensão de uma nova classe média, o aumento da renda e a manutenção dos níveis de emprego. Mas é provável que as mudanças promovidas por Clouse tenham contribuído para o aumento de 14% no faturamento da empresa entre 2007 e 2008. Nesse mesmo período, a Kraft consolidou sua liderança no mercado de chocolates, elevando sua participação de 34% para 36% atualmente. (Essa liderança considera Garoto e Nestlé como operações isoladas. No mesmo intervalo de tempo, a participação de mercado da Garoto cresceu de 25% para 26,7%. A da Nestlé, aumentou de 25% para 26%, segundo os dados da Nielsen.)

 

Recrutar executivos entre antigos membros das Forças Armadas é tradição entre as empresas americanas. Um levantamento conduzido pelo Ministério da Defesa dos Estados Unidos mostra que 10% dos presidentes das 500 maiores companhias americanas têm em seu currículo alguma experiência militar. "Esses profissionais têm uma capacidade quase ilimitada de trabalho, são líderes incontestes e têm um raciocínio lógico muito estruturado, qualidades essenciais para as organizações", diz a professora Maria Elisa Macieira, da Fundação Getulio Vargas do Rio de Janeiro. No caso de Clouse, a faceta militar aflora ainda na maneira como a Kraft passou a tratar sua maior concorrente, a Nestlé. A empresa suíça, líder mundial no mercado de alimentos, aparece como o inimigo a ser vencido num programa de motivação de funcionários lançado por ele no ano passado. (No evento de lançamento, Clouse entrou na quadra de um ginásio de esportes de Curitiba para disputar uma partida de basquete com o ex-jogador da seleção brasileira Oscar Schimidt.) Como soldado, ele aprendeu a perseguir a meta traçada pelo alto comando. A sua é dobrar o faturamento da Kraft brasileira até 2013 -- repetindo aqui, num período maior o que já havia feito na China. Para isso, sabe que será preciso transformar a Kraft na maior empresa do país na área de chocolates, biscoitos e lanches rápidos -- posição hoje ocupada pelo grande inimigo suíço, a Nestlé.

 

Veículo: Revista Exame


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