A Justiça do trabalho é apontada como o principal algoz à volta ao mercado de empresas que enfrentam processos de recuperação judicial, baseadas na Lei n 11.101/05. Isso porque, passados 180 dias do deferimento do processamento de recuperação, caso não tenha sido aprovado o respectivo plano, é permitido que se prossiga a execução de dívidas da empresa recuperanda, fora do juízo específico. É aqui que o martelo da lei do trabalho é certeiro.
"A Justiça trabalhista tem sido a verdadeira pedra no sapato da recuperação judicial porque os princípios colidem. Isso porque quando uma empresa começa a ter dificuldades e cortar os custos, os contratos de trabalho são os primeiros a serem rescindidos", argumenta a juíza do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 2ª Região, Olga Vishnevsky Fortes.
O tema foi debatido ontem durante o seminário "A Recuperação Judicial na Visão do Poder Judiciário", realizado na sede da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). O evento promovido pelo departamento jurídico (Dejur) da Fiesp e o Instituto Nacional de Recuperação Empresarial (INRE) contou com a presença da ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Nancy Andrighi, o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Sydney Sanches, o juiz do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) e consultor do INRE, Carlos Henrique Abrão, dentre outros especialistas no assunto.
"O princípio da preservação da empresa - que é a base da lei de recuperação judicial - merece especial cuidado em face das dívidas tributárias e trabalhistas", analisou Nancy. Segundo ela, o juízo competente para analisar empresas nessa situação é o da recuperação. "O destino do patrimônio da suscitante [empresa recuperanda] em processo de recuperação não pode ser afetado por decisões prolatadas por juízo diverso do que é competente para a recuperação, sob pena de prejudicar o funcionamento da empresa e comprometer o sucesso do plano de recuperação", disse a ministra.
Já no entendimento da juíza do TRT-2, há outros créditos mais privilegiados do que o trabalhista e, por isso, a premissa de que execuções nessa área emperram o processo de recuperação de uma empresa é infundada. "Há outros créditos mais privilegiados, como os bancários. A lei pode reduzir o salário dos trabalhadores, mas não reduz as condições aos créditos privilegiados às instituições bancárias", argumenta Olga Vishnevsky Fortes, que defende: "A rapidez na Justiça do Trabalho muitas vezes é pela questão de sobrevivência do trabalhador."
A magistrada acredita que as questões trabalhistas, na ordem de preferência de uma recuperação judicial, são injustas. "Respeitemos as decisões que colocam a proteção ao trabalhador em quinto lugar, mas é importante observar que a realidade é mais poderosa que a letra fria da lei", argumenta.
Para o juiz do TJ-SP Carlos Henrique Abrão, a Lei n. 11.101/05 precisa de mudanças para atingir seu objetivo, a "preservação da empresa". Segundo ele, no direito norte-americano, 70% das decisões tomadas pelo juízo são aceitas sem nenhum grau de recurso. "Aqui, 85% das decisões tomadas em recuperação são recorríveis. Isso provoca o retardo na confiabilidade do plano", afirma o juiz do TJ-SP. De acordo com Abrão, o Brasil tem 1.500 recuperações em andamento.
Veículo: DCI