Lei paulista acirra guerra fiscal entre os Estados

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Fazenda pretende intensificar fiscalização de operações interestaduais


   
Uma lei editada pelo governo de São Paulo, às vésperas do Natal, promete intensificar a guerra fiscal entre os Estados. Um dos dispositivos da Lei nº 13.918, de 22 de dezembro, que altera o regulamento do ICMS, estabelece que a Fazenda poderá adotar ações de fiscalização, incentivos compensatórios ou atos administrativos para minimizar os efeitos dos benefícios concedidos por outros Estados sem a autorização do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) - órgão que reúne os secretários de Fazenda de todo o país. "A lei permite que São Paulo tome medidas retaliatórias para preservar a sua competitividade", diz o coordenador da administração tributária da Secretaria da Fazenda de São Paulo (Sefaz-SP), Otávio Fineis Júnior.

 

A legislação dá continuidade à política tributária agressiva adotada pelo governador José Serra (PSDB). Em seu mandato, já instituiu incentivos fiscais e fechou o cerco à sonegação, ampliando o leque de setores que devem se submeter à substituição tributária. Agora, quer acirrar a fiscalização sobre as empresas paulistas que compram produtos de Estados que concedem incentivos fiscais e tentam aproveitar o crédito integral do ICMS em São Paulo.

 

Para o secretário da Fazenda da Bahia, Carlos Martins, a nova lei não surpreende. "Desde que Serra assumiu o governo, São Paulo tem tomado medidas cada vez mais fortes no sentido de ampliar a guerra fiscal", diz. "Essa legislação nada mais é do que uma declaração de guerra." Já o secretário da Fazenda do Paraná, Heron Arzua, considera a nova lei paulista uma medida legítima de defesa, mas lembra que, desde 2007, o seu Estado não reconhece os incentivos dados pelo governo de São Paulo. Segundo ele, os benefícios paulistas "não têm autorização do Confaz".

 

De acordo com Fineis, com o início da discussão sobre a proposta de reforma tributária de autoria do deputado Sandro Mabel (PR-GO), houve um acirramento da guerra fiscal, "tornando-se necessário tomar ações rápidas como as previstas na nova lei". O projeto de lei de Mabel estabelece, por exemplo, a tributação do ICMS no destino da mercadoria, o que derrubaria a arrecadação de São Paulo.

 

Com a nova lei, a Fazenda paulista quer inibir o creditamento integral de ICMS e, com isso, reduzir as discussões administrativas e judiciais e arrecadar mais. "Hoje, quase a metade dos autos de infração lançados são relativos a esses créditos", afirma o advogado Adolpho Bergamini, do escritório Martins, Chamon e Franco Advogados e Consultores.

 

O texto original da Lei nº 13.918 previa a responsabilização solidária do fornecedor localizado em outro Estado, beneficiado por tais incentivos, mas o dispositivo foi retirado no curso do processo legislativo. Em compensação, foram incluídas no texto algumas medidas para acirrar a fiscalização dos contribuintes de ICMS, utilizando estratégias já adotadas na esfera federal. Uma delas é o cruzamento de dados de declarações para a localizar omissões de receita. Outra ferramenta que será empregada é a responsabilização solidária do sócio, ou administrador, da empresa que simula operações para não pagar ICMS. Nesse caso, a empresa compra mercadorias com benefício e registra a saída delas em vendas para outro Estado. Mas esses produtos, na verdade, acabam sendo comercializados em São Paulo.

 

Para combater esse tipo de simulação, a lei permite que o governo paulista exija o recolhimento do imposto relativo ao benefício fiscal, concedido à revelia do Confaz, na entrada da mercadoria no território paulista. "Seria uma forma do Estado inibir esse tipo de operação", diz o advogado Allan Moraes, do escritório Neumann, Salusse e Marangoni Advogados.

 

A Fazenda solicitou, inclusive, à Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP) o desenvolvimento de uma tecnologia para criar uma barreira eletrônica nas estradas. Outros Estados já adotam o mecanismo. Segundo o advogado Eduardo Pugliese, da banca Souza, Schneider, Pugliese, Sztokfisz e Custódio Advogados, Minas Gerais e Goiás barram o caminhão e exigem a diferença de ICMS no ato.

 

Especialistas afirmam, no entanto, que várias das sanções previstas na Lei nº 13.918 podem ser questionadas na Justiça. A mais polêmica é a que aumentou os juros cobrados por atraso, que foram elevados da taxa Selic - que hoje não chega a 1% ao mês - para 0,13% ao dia, o que totaliza 3,9% ao mês. Além disso, se a empresa tiver débito vencido e não pago, mas houver recursos para quitá-lo, ainda que em empresas coligadas, controladas, ou na conta dos respectivos sócios, passa a ser qualificada como "inadimplente fraudulenta". Isso poderá ocasionar a suspensão da inscrição estadual do estabelecimento contribuinte do ICMS. "Se a empresa tiver que parar por causa disso, terá que ir à Justiça. E provavelmente ganhará", diz o advogado Pedro Lunardelli, do escritório Advocacia Lunardelli. Ele argumenta que a medida não está prevista no Código Tributário Nacional (CTN).
 

 

Veículo: Valor Econômico


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