Liminares também foram suspensas no Espírito Santo e na Bahia, sob o argumento de forte impacto nos cofres públicos
Os presidentes dos Tribunais de Justiça do Estado do Ceará (TJCE) e de Pernambuco (TJPE) suspenderam liminares que permitiam a empresas não pagar o diferencial de alíquota (Difal) do ICMS neste ano. No mesmo sentido, também haviam decidido os desembargadores à frente das cortes estaduais da Bahia e do Espírito Santo. As decisões frustram as tentativas judiciais de dezenas de contribuintes para recolher o tributo apenas em 2023.
O Difal ICMS incide sobre operações em que o consumidor final não é contribuinte e está em outro estado, como no caso do ecommerce. Desde o início do ano, há um impasse entre empresas e as Fazendas estaduais sobre a data em que o imposto pode ser cobrado – se desde o início deste ano, a partir de abril ou apenas em 2023.
No Ceará, a desembargadora Maria Nailde Pinheiro Nogueira, presidente da Corte estadual, suspendeu 12 liminares que impediam a Secretaria da Fazenda de cobrar o Difal em 2022. Todas as decisões provisórias eram da 5ª Vara da Fazenda Pública de Fortaleza.
Na avaliação da presidente do TJCE, as decisões têm potencial de gerar um efeito multiplicador, o que já está acontecendo. Apenas em fevereiro, segundo a magistrada, foram deferidas 13 medidas de urgência contra o Estado do Ceará para não recolher o imposto em 2022, o que poderia acarretar até R$ 50 milhões de perdas mensais aos cofres públicos.
Em Pernambuco, o desembargador Luiz Carlos de Barros Figueiredo suspendeu três liminares contrárias à cobrança do Difal em 2022, concedidas pelas 2ª e 3ª Varas da Fazenda Pública do Recife. Ele afirmou que é plausível o argumento da Fazenda, ao defender que legislação estadual sobre o Difal ICMS é válida, e que manter as decisões representaria “perigo de grave lesão à ordem econômica estadual”.
O efeito multiplicador dessas disputas para evitar a cobrança neste ano em Pernambuco poderia chegar a R$ 653,7 milhões, o que representa 3% da arrecadação total do ICMS esperado no período, segundo o governo estadual. A administração ainda comparou a perda estimada com os gastos extraordinários em razão da pandemia, na ordem de R$ 1,6 bilhão.
As suspensões foram decididas em fevereiro. Elas tramitam com os números 0622655-06.2022.8.06.0000 (Ceará) e 0001114-23.2022.8.17.9000 (Pernambuco).
O porquê do imbróglio tributário
As regras do Difal foram introduzidas por pela Lei Complementar 190/2022. Ela veio em resposta à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que entendeu que esse imposto só poderia ser cobrado após edição de lei nacional – antes, a cobrança do imposto ocorria baseada em leis estaduais e convênios.
A nova legislação resolveu essa lacuna, porém o fato de ela ter sido publicada apenas em 5 de janeiro deste ano abriu interpretações para os contribuintes de que o recolhimento deveria começar apenas em 2023, para atender à anterioridade do exercício financeiro.
O Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) orientou a cobrança pelos estados neste ano, no Convênio 236, publicado em 6 de janeiro. Levantamento do Comitê Nacional dos Secretários de Estado da Fazenda (Comsefaz) mostra que os estados podem ter perdas em arrecadação da ordem de R$ 9,8 bilhões caso o diferencial não seja recolhido. A maior parte dos estados têm anunciado, individualmente, as datas em que começam a cobrar o tributo.
No final de janeiro, o governo do estado de Alagoas ajuizara uma ação direta de inconstitucionalidade para garantir a cobrança do diferencial de alíquota de ICMS desde a publicação da Lei Complementar 190, em 4 de janeiro. Trata-se da ADI 7.070. O relator é o ministro Alexandre de Moraes.
A Associação Brasileira de Indústria de Máquinas (Abimaq) pede no STF a suspensão imediata dos efeitos da Lei Complementar por todo ano de 2022 e postergação da vigência a partir de 1º de janeiro de 2023. O relator da ADI 7.066 também é o ministro Alexandre de Moraes.
Início da cobrança do Difal ICMS no Ceará e em Pernambuco
A Secretaria da Fazenda do Ceará planeja voltar a exigir o Difal no estado a partir de 1º de abril. “O princípio da anterioridade visa evitar surpresa ao contribuinte. Mas, se estamos falando de uma mesma carga tributária e de um imposto que já existe, não tem como falar em surpresa”, afirmou a secretária Fernanda Pacobahyba em entrevista ao jornal local O Povo.
O planejamento é baseado em um dispositivo da Lei Complementar 190 (mais especificamente, alterações presentes no artigo 24-A, § 4º da Lei Kandir). Ele determina que a exigência aos contribuintes só poderia ser feita após a disponibilização de um portal de informações sobre o Difal. Os efeitos começariam “no primeiro dia útil do terceiro mês subsequente ao da disponibilização do portal”. O site está disponível desde o final de dezembro.
No final de 2021, Pernambuco alterou sua lei estadual mais antiga sobre o Difal para se adequar à LC 190/2022. Além disso, estabeleceu que a nova legislação, a Lei 17.625/2021, passaria a produzir efeitos junto com a publicação da legislação federal. Portanto, o estado já cobra o imposto.
LETÍCIA PAIVA
Fonte: JOTA – 07/03/2022