O Código de Processo Civil permite a prolação de decisões parciais, que dizem respeito a apenas parcela do objeto litigioso. Assim, a 25ª Vara Cível Federal de São Paulo determinou a certificação do trânsito em julgado parcial de uma sentença, com relação à parte da decisão que discutia o mérito do processo.
O advogado tributarista Tiago Laguna Paim, atuante no caso, explica que, a partir da nova decisão, a parte poderá prosseguir com o cumprimento de sentença, enquanto ainda está em discussão a questão dos honorários advocacítios sucumbenciais.
Na prática, a cliente não precisará esperar a tramitação de eventuais recursos para iniciar o cumprimento de sentença, e assim conseguirá receber o indébito reconhecido pelo Juízo.
Histórico
A sentença havia afastado a incidência do imposto de renda sobre proventos de aposentadoria e pensão da autora. A União foi condenada a ressarcir os valores do tributo já pagos desnecessariamente, a serem apurados na fase de cumprimento. A ré não foi condenada a pagar a verba sucumbencial.
A defesa da autora recorreu da sentença somente com relação aos honorários advocatícios. Quanto à isenção do IR, nenhuma das partes interpôs recursos.
Fundamentação
O juiz Djalma Moreira Gomes ressaltou que o CPC possui previsões expressas sobre julgamento antecipado parcial do mérito, homologação de autocomposição parcial e reconhecimento de decadência ou prescrição de um dos pedidos cumulados.
O código também permite a delimitação voluntária do objeto do recurso, que pode ser direcionado apenas contra parte da decisão. Segundo o magistrado, admite-se o recurso parcial. O §1º do artigo 1.013 diz que serão apreciadas pelo tribunal "todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas, desse que relativas ao capítulo impugnado".
Gomes explicou que, no processo civil, as sentenças têm ao menos dois capítulos: um que analisa o pedido ou a pretensão, e outro que define os encargos sucumbenciais. "A depender da solução dada em cada capítulo da sentença, as partes poderão apelar de apenas um, de alguns ou de todos os capítulos", indicou.
De acordo com o juiz, "há, então, a possibilidade de serem proferidas, ao longo do processo, várias decisões com aptidão para tornarem-se indiscutíveis pela coisa julgada. Um mesmo processo poderá produzir tantas coisas julgadas quantas tenham sido as decisões que tenham sido proferidas e que possuam essa aptidão. Obviamente, cada decisão resolve uma determinada questão".
O direito da autora à isenção do IR e ao ressarcimento foi reconhecido em um capítulo da sentença que não foi objeto de recurso. Gomes concluiu que tal capítulo "transitou em julgado e ora se encontra ao abrigo da coisa julgada material", pois não será atingido pelo resultado da apelação relativa à condenação honorária. O julgamento da apelação não poderia violar a coisa julgada referente ao pedido principal, que já está pacificada entre as partes.
Jurisprudência
O magistrado reconheceu que há divergência jurisprudencial sobre o trânsito em julgado parcial. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento consolidado contra tal possibilidade (REsp. 1.553.568), devido à unicidade da ação.
Porém, Gomes lembrou que o próprio STJ, antes da vigência do atual CPC, já decidiu (REsp. 212.286) que o termo inicial do prazo decadencial para a propositura da ação rescisória não é contado a partir da última decisão proferida no processo, mas sim a partir do trânsito em julgado da decisão que resolveu a questão que a parte pretende rescindir. A corte também já chegou a reconhecer o trânsito em julgado de capítulos não impugnados (REsp. 203.132).
Por fim, o Supremo Tribunal Federal já admitiu a coisa julgada parcial e contagem autônoma do prazo para a propositura de ação rescisória. A Súmula 354 da corte também aponta que "em caso de embargos infringentes parciais, é definitiva a parte da decisão embargada em que não houve divergência na votação".
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Processo 5036155-90.2021.4.03.6100
José Higídio – Repórter da revista Consultor Jurídico.
Fonte: Revista Consultor Jurídico – 10/12/2022