Aposentado eleva seus benefícios e ameaça INSS

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Cerca de 40 mil ações de aposentados que seguem na ativa pedem revisão do benefício


Onda de "desaposentadoria" no país pressiona contas da Previdência; cerca de 1,6 milhão de aposentados podem solicitar a revisão


Uma onda de ações judiciais contra o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) invadiu os tribunais do país para garantir aos aposentados o direito de se desaposentar. No ano passado, esse tipo de causa chegou a representar, só em São Paulo, mais de 40% dos processos distribuídos nas varas previdenciárias do Estado.


A "desaposentação", como está sendo chamada, permite a quem permaneceu trabalhando após se aposentar renunciar ao benefício que recebe para obter um novo benefício de maior valor. Com a permanência na atividade, o aposentado continua contribuindo para a Previdência e consegue reduzir o impacto negativo do chamado fator previdenciário, mecanismo que reduz o valor dos benefícios de quem se aposenta mais cedo, premiando quem passa mais tempo no mercado.


Especialistas ouvidos pela Folha estimam que 40 mil ações sobre "desaposentação" já estejam em análise no Judiciário. O Ministério da Previdência calcula que exista atualmente 1,6 milhão de aposentados no mercado de trabalho contribuindo para o INSS. Em tese, esse é o universo de trabalhadores que poderiam pedir a "desaposentação".


crescente do Ministério da Previdência. Neste ano, o governo deverá desembolsar o valor recorde de R$ 7,1 bilhões com o pagamento de todos os tipos de ações que o INSS perdeu na Justiça.


No STJ (Superior Tribunal de Justiça), já há tendência favorável aos aposentados nos casos de "desaposentação", apesar de ainda não existir jurisprudência sobre o assunto. Entre os juízes de primeira e segunda instâncias, as decisões têm sido diversas.


"A "desaposentação" é um fato, não tem jeito. Há um movimento bastante grande dessas ações nas varas previdenciárias e será crescente. É atualmente a ação que tem a perspectiva mais promissora na Previdência", afirma Marcus Orione, professor de direito da USP e juiz federal da 1ª Vara Previdenciária de São Paulo.


Proibido x permitido


Para se desaposentar, o trabalhador precisa recorrer à Justiça, pois a legislação não prevê o procedimento. "O que não é proibido pela lei é permitido. A "desaposentação" é a renúncia a um direito", diz o especialista em direito previdenciário Guilherme Carvalho. Segundo ele, no final do ano passado, o TRF 3ª Região decidiu em apenas um dia 51 ações favoravelmente aos aposentados.


Os especialistas alertam, porém, de que muitos juízes não aceitam a tese ou concedem a "desaposentação", mas determinam a devolução dos valores recebidos na primeira aposentadoria. No STJ, o entendimento predominante é contrário ao reembolso.


"Os tribunais superiores têm que sumular esse assunto, ou o governo tem de regulamentar, dizer como devem ser as regras", afirma o coordenador do Centro de Estudos de Seguridade Social, Wladimir Novaes Martinez. O Congresso chegou a aprovar um projeto sobre o assunto, mas o presidente Lula vetou a proposta em 2008.


Orione lembra que a "desaposentação" já passou por uma primeira fase, no fim dos anos 1990, quando aposentados do INSS, depois de passar em concurso público, queriam se aposentar como servidores.


O metroviário Antônio Destro, 55, se desaposentou no final de 2009 depois de esperar dois anos por uma decisão da Justiça. "Eu entrei com a ação, mas estava com medo. Achava que não ia conseguir. Em dezembro, saiu a sentença. Desaposentei, e o valor passou de R$ 1.800 para R$ 2.500", disse.


Ele se aposentou pela primeira vez em 1996. "Mas continuei trabalhando no metrô de São Paulo. Descobri a "desaposentação" quanto tentei entrar na Justiça com outro tipo de ação, e a advogada me explicou que não tinha direito, mas que poderia me desaposentar."

Previdência considera revisão ilegal


Ministério afirma que aposentadoria é um ato jurídico que não pode ser desfeito


Segundo o INSS, Supremo também não reconhece esse direito; "desaposentação" não gera desequilíbrio à Previdência, diz especialista


O Ministério da Previdência afirma que a "desaposentação" é inconstitucional e não encontra respaldo legal. Segundo a Procuradoria Federal especializada do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), o STF (Supremo Tribunal Federal) já avaliou recursos extraordinários e não aceitou a possibilidade de revisão da aposentadoria concedida para concessão de outra mais vantajosa.


"Ainda que existam decisões em primeiro grau nesse sentido, a tendência dos tribunais é não permitir a "desaposentação", por ser claramente inconstitucional. Ao alardear essa tese, infelizmente muitos poderão ser enganados sob argumento do ganho fácil, mas sem fundamento legal e constitucional", informou o INSS.


Para os procuradores da Previdência, a inconstitucionalidade se dá porque a "desaposentação" infringiria "princípios básicos da Previdência Social, como o da distributividade na prestação dos benefícios, e a solidariedade na participação". "Além disso implicaria a alteração de ato jurídico já perfeito e decorrente de ato espontâneo do segurado", afirma a Procuradoria do instituto.


O Ministério da Previdência ainda sustenta que foi vetado por inconstitucionalidade, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o projeto de lei aprovado pelo Congresso que regulamentava a "desaposentação". O veto foi mantido pelos parlamentares.


STF

Procurado pela Folha, o Supremo Tribunal Federal informou que nenhuma ação de "desaposentação" chegou ao tribunal até o momento.


Para o especialista Wladimir Novaes Martinez, o STF não aceitou os recursos extraordinários apresentados porque eles não se tratavam especificamente de "desaposentação", mas, sim, de transformação de benefício. "Sem contar que a "desaposentação" não gera desequilíbrios para a Previdência. A pessoa contribuiu para aquele benefício", afirma Martinez.


Na avaliação do juiz federal Marcus Orione, a ideia de que a "desaposentação" geraria desequilíbrios previdenciários parte de uma perspectiva "economicista". "As novas contribuições estão sendo recolhidas. Para onde vai esse dinheiro se não for gerado um novo benefício?", questiona Orione.

 

Veículo: Folha de S. Paulo


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