Com o acordo, até produto legítimo pode ser apreendido

Leia em 3min 30s

Isso poderá ocorrer durante o trânsito de cargas se um país fizer valer suas regras

Para especialistas, acordo deve definir com clareza a possibilidade de apreensão de produtos legítimos em trânsito por algum país

 

O texto recém-divulgado do Acta ainda está repleto de indefinições entre colchetes, o que dificulta saber o que de fato entrará na versão final. Nova reunião está programada para Genebra no final de junho, e o cronograma foi acelerado para buscar uma conclusão até o fim deste ano.

 

Até por isso nenhum dos centros de estudo consultados pela Folha, e tampouco os diplomatas, faz uma estimativa de qual poderia ser o impacto econômico do acordo.

 

Por ora, duas provisões têm arregalado os olhos dos especialistas. Uma diz respeito a baixar conteúdo da internet.

 

O texto em circulação prevê responsabilizar os provedores por vigiar o acesso de todos os usuários e repassar dados aos comitês de monitoramento que seriam criados com o acordo, o que os críticos veem como violação de privacidade.

 

A Justiça então notificaria o usuário. Com três infrações, o provedor seria obrigado a banir o internauta da rede.

 

"[O acordo] não tem nada prevendo expandir o acesso aos produtos culturais, mas tem provisões para que os países tirem alguém da internet", diz Sean Flynn, do Programa de Justiça da Informação e Propriedade Intelectual, aludindo ao fato de muitos internautas que querem pagar por conteúdo são impedidos por regras de distribuição regional.

 

O outro ponto de atenção é o controle de fronteiras, especialmente no caso dos genéricos. A versão vazada prevê maior policiamento e faz valer as regras do país em trânsito.

 

Isso significa que se o Brasil compra uma carga de genéricos da Índia e o navio para na Holanda para fazer manutenção, Amsterdã pode apreender a carga. É exatamente o episódio que ocorreu no ano passado, avalizado pela legislação da UE -que agora será expandida aos outros dez signatários.

 

"Nossa preocupação é que o Acta cristalize essa posição de apreensão de produtos de comércio legítimo, o genérico, e confunda com medicamento falso", diz Renata Reis, coordenadora do Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual, no Rio de Janeiro.

 

Segundo diplomatas, um caso assim pode ser levado à OMC. Mas especialistas temem que a dubiedade de fóruns, mesmo que a OMC pese mais por ora, trave o processo.

 

Pela estimativa mais recente da OCDE (o clube multilateral que congrega 31 países ricos), desde 2007 a pirataria causa prejuízo acima de US$ 250 bilhões ao ano e responde por quase 2% do comércio mundial, uma trajetória de alta contínua desde o início da década.

 

Os países envolvidos na negociação, capitaneados pelos EUA, argumentam que a OMC e a Ompi não são duras o bastante no combate à produção e à distribuição de produtos falsificados (comerciais ou não).

 

"A questão aí é o "forte o bastante'", disse à Folha uma fonte familiarizada com a discussão na OMC. "Os Trips lidam com copyright, propriedade intelectual em geral e acesso ao conhecimento, tanto do ponto de vista da proteção como do acesso, e permitem flexibilidade aos membros."

 

Para o embaixador Rubens Ricupero, ex-secretário geral do Unctad (braço da ONU para comércio e desenvolvimento), o contexto geopolítico hoje deve dificultar o avanço do acordo. Ele lembra de uma situação semelhante com o Acordo Multilateral de Investimentos, que acabou naufragando no meio dos anos 90 ante a falta de consenso dos participantes.

 

"Isso [impor o Acta a outros países] só seria possível com uma correlação de forças mais favorável a eles [países desenvolvidos]. No passado, os Trips catalisaram a oposição à OMC. Acho que um acordo como esse hoje provocaria reação ainda mais virulenta." (LC e AM)

 

Veículo: Folha de São Paulo

 


Veja também

Cartão facilitará a retirada da nota fiscal em SP

Para auxiliar o consumidor no momento de pedir a Nota Fiscal Paulista, a Secretaria da Fazenda de São Paulo criou...

Veja mais
Decisão fortalece prazo de cinco anos para indenizar consumidor

Uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou o entendimento firmado pelo Código de ...

Veja mais
Walmart perde apelação nos EUA

Funcionárias do Walmart, a maior varejista do mundo, venceram ontem um julgamento histórico por discrimina...

Veja mais
Empresas fazem acordo para reduzir reclamações

Acordo firmado com o Ministério da Justiça prevê que elas cumpram metas de redução de ...

Veja mais
Rússia versus Nestlé

O órgão de defesa do consumidor da Rússia anunciou, segundo informou a Reuters, que está pro...

Veja mais
Por escrito

Campeãs de reclamações registradas nos Procons de todo o país, algumas das maiores empresas ...

Veja mais
Produto com defeito: lojas não seguem lei

Empresas desrespeitam prazo legal para conserto ou substituição de mercadoria com defeito   Quando...

Veja mais
Justiça livra supermercado de nova alíquota da previdência

Uma decisão proferida pela Justiça federal paulista livrou cerca de 1,5 mil supermercados - de pequeno, m&...

Veja mais
Empresa deve mover ação de ressarcimento até junho

Empresas que pagaram tributos indevidamente nos últimos dez anos podem ser ressarcidos até junho deste ano...

Veja mais