Algumas mudanças no Código de Processo Civil, em vigor desde janeiro do ano passado, trouxeram mais rapidez à execução de títulos extrajudiciais. Porém, advogados e empresários estão preocupados com a interpretação que o Fisco está dando à nova norma. "Essa mudança vale para pessoas particulares, não serve para a Fazenda Pública", diz o advogado Fernando Scaff, do escritório Silveira, Athias, Soriano de Mello, Guimarães, Pinheiro & Scaff Advogados. O especialista explica que obteve, na Justiça Federal do Pará, uma decisão que determina que o Fisco não pode executar os valores supostamente devidos pelo seu cliente sem o fim do processo judicial.
Ele conta que seu cliente perdeu um processo na fase administrativa contra o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS). "Ocorre que, antes mesmo de ser julgado o processo, o INSS decidiu levar os bens penhorados a leilão, argumentando que houve uma alteração no CPC que permitia isso", diz o advogado. "Recorremos à Justiça que considerou que os bens só podem ser levados à penhora caso o contribuinte perca a ação judicial", complementa Scaff.
O argumento usado pelo advogado é que a alteração no CPC não vale para as execuções fiscais, que são regidas por outros princípios e lei, como a Lei de Execuções Fiscais (LEF).
"A lei especial prevalece em relação à lei geral. Ou seja, a LEF e as determinações dessa norma são superiores às mudanças no CPC", comenta o advogado Murillo Villas, do escritório Braga & Marafon. Ele explica que a LEF, entre outras coisas, determina que caberá ao Fisco cobrar judicialmente os débitos fiscais depois do fim do processo administrativo. "Não cabe cobrança extrajudicial de débitos fiscais", diz Villas.
Embargos à execução
"A nova lei de execução civil só vale para pessoas físicas", concorda o advogado Nelson Lacerda, do escritório Lacerda & Lacerda Advogados. "Porém, o Fisco está tentando usar artigos dessa lei para fazer, também, a execução fiscal", complementa Lacerda.
Um dos pontos de maior controvérsia é o que trata dos embargos à execução. Na legislação anterior, os embargos (recursos) suspendiam a execução da dívida. Com a nova norma, os embargos não suspendem automaticamente a execução. "Mas isso vale apenas para execução entre particulares (ou seja, cheques, notas promissórias ou semelhantes). Entretanto, isso não vale para o Fisco que tem tentado usar isso a seu favor", diz Lacerda.
Diante disso, as empresas são obrigadas, após entrar com embargos, pedir também no Judiciário a suspensão da execução. "Com a mudança no CPC, agora todos são obrigados a provar ao juiz que têm direito ao efeito suspensivo (da penhora ou bloqueio)", comenta a advogada Sandra Sebben Bastos, do escritório Martinelli Advocacia Empresarial. "Ainda há muita divergência quanto a isso", complementa Sandra.
Para o advogado, Marcelo Dias Gonçalves Vilela, do escritório Portugal, Vilela, Behrens e Costa Cruz Advogados, a Lei de Execução Fiscal deixa claro que deve ocorrer a suspensão da execução fiscal enquanto não julgados os embargos do devedor apresentados pelo contribuinte. "Não há lacuna na lei em relação a esse ponto", diz Vilela.
"O Fisco sempre vai buscar uma forma mais rápida para cobrar a dívida - isso é até louvável considerando que esse é um dinheiro de toda a sociedade -, mas isso não pode justificar a arbitrariedade, como não permitir o devido processo legal antes de realizar a execução", dispara Villas.
O advogado do Braga & Marafon destaca que outro ponto usado de maneira equivocada pelo Fisco, e que deveria valer apenas para pessoas físicas, é o prazo para defesa do devedor. "De acordo com a Lei de Execução Fiscal, o contribuinte tem um prazo de 30 dias para fazer sua defesa. Mas o CPC dá um prazo de 15 dias e o Fisco tem usado esse prazo", explica Villas.
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional não teve nenhum representante para comentar o assunto até o fechamento dessa edição.
Veículo: Gazeta Mercantil