Com veto, só funcionárias de empresas de grande porte podem ter benefício ampliado.
Empresas tributadas pelo lucro presumido e optantes do Simples não poderão conceder mais dois meses de licença a trabalhadoras.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vetou dispositivos da proposta aprovada pelo Congresso que amplia a licença-maternidade de quatro para seis meses, o que restringirá, no caso do setor privado, o alcance das mudanças a funcionárias de empresas de grande porte.
Mais de 90% das empresas brasileiras deverão ficar de fora da nova lei, reduzindo o impacto fiscal da medida para o governo. Mas essas empresas, exatamente por serem maiores, empregam a maioria dos trabalhadores do setor privado.
No veto, o Palácio do Planalto eliminou o trecho do projeto que permitiria a empresas que pagam imposto no regime de lucro presumido ou que são optantes do Simples (programa simplificado de recolhimento de impostos) aderir ao programa "Empresa Cidadã".
Com o veto, a adesão ficou limitada a estabelecimentos tributados no lucro real, ou seja, as grandes empresas.
No mês passado, o Congresso concluiu a votação do projeto que amplia de quatro para seis meses a licença-maternidade. O benefício adicional, que é opcional, só vale para funcionárias de empresas que optarem pelo programa "Empresa Cidadã". Isso porque os dois meses extras de salário-maternidade serão pagos pelos empregadores e deduzidos do Imposto de Renda a ser pago pela empresa.
No caso das funcionárias públicas, a ampliação da licença-maternidade poderá ser feita a partir da publicação da lei no "Diário Oficial" da União, o que deve acontecer hoje.
Atualmente, 93 municípios e 11 Estados têm licença-maternidade de seis meses, segundo a Sociedade Brasileira de Pediatria.
Lula vetou ainda o artigo que garantia isenção da contribuição previdenciária sobre os dois meses extras da licença-maternidade. Essa renúncia teria impacto sobre as contas da Previdência, que neste ano deverá registrar déficit próximo de R$ 40 bilhões.
Só em 2010
Ontem, o Palácio do Planalto reforçou que a licença-maternidade ampliada só entrará em vigor em 2010. O projeto já previa essa possibilidade, pois não haveria tempo de incluir a renúncia fiscal já no Orçamento do ano que vem, em tramitação no Congresso Nacional.
O presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria, Dioclécio Campos Júnior, disse que o engajamento da sociedade brasileira em torno da licença ampliada permitirá reverter os vetos do presidente.
"Não podemos ter uma situação em que algumas mulheres terão o direito e outras, não. Algumas crianças serão beneficiadas e outras, não", afirmou Campos Júnior.
Segundo ele, a senadora Patrícia Sabóia (PDT-CE), que apresentou o projeto ampliando o prazo da licença-maternidade, já tem pronta uma emenda ao projeto de Orçamento de 2009, em tramitação no Congresso, para garantir a aplicação da lei já no próximo ano. Se tiverem sucesso e não houver veto presidencial, a ampliação nas empresas privadas poderia vigorar no próximo ano.
A nova lei estabelece que têm direito ao benefício de seis meses as funcionárias de empresas. Trabalhadoras autônomas e empregadas domésticas não terão direito aos dois meses adicionais.
Hoje, a licença de quatro meses é custeada pela Previdência Social, que gasta anualmente R$ 2,1 bilhões com o pagamento do benefício.
O salário-maternidade é pago diretamente pela empresa à trabalhadora, mas depois é deduzido das contribuições previdenciárias devidas pelo estabelecimento ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).
Para a CNI, competitividade da indústria pode ser "sacrificada"
A ampliação da licença-maternidade poderá "sacrificar" a competitividade da indústria brasileira, segundo avaliação feita em agosto pelo presidente do Conselho de Relações do Trabalho da CNI (Confederação Nacional da Indústria), Francisco Gadelha.
"Não é dureza de coração, mas quatro meses de licença-maternidade estão de bom tamanho", afirmou Gadelha em entrevista à Folha.
Também em agosto, o deputado Armando Monteiro Neto (PTB-PE), presidente da CNI, afirmou que "a intenção do legislador é generosa, mas o fato é que [a medida] tem um custo muito alto para o conjunto da sociedade" e que poderia haver outras prioridades.
Preocupado com o custo da medida para os cofres públicos, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, chegou a recomendar ao presidente Lula que vetasse o projeto aprovado pelo Congresso.
Foram dois os argumentos apresentados para a derrubada da medida: pressão do setor produtivo e o impacto fiscal, que deveria ultrapassar R$ 800 milhões anuais. Com os vetos presidenciais, esse custo deve ser reduzido.
No mês passado, em reunião com líderes partidários que integram o Conselho Político do governo, Lula não escondeu a insatisfação com o fato de o Congresso não ter barrado o projeto e disse, segundo relatos de participantes, que "não poderia arcar com o ônus de vetar um projeto tão popular, um projeto dessa magnitude".
"Vocês [congressistas] me botaram uma camisa de força e agora eu tenho que decidir", disse o presidente, segundo relatos de presentes ao encontro.
Veículo: Folha de S.Paulo