A importante retração da confiança de empresários e consumidores em julho deve ter levado o varejo restrito, que não considera o desempenho das vendas de automóveis e de material de construção, a mostrar crescimento moderado no início do segundo semestre, em um contexto em que a renda real também não dá suporte para uma variação mais expressiva do comércio, avaliam economistas.
Após alta de 0,5% do volume de vendas nesse conceito na medição anterior, a média de 14 consultorias e instituições financeiras ouvidas pelo Valor Data aponta para alta de 0,3% na passagem de junho para julho, feitos os ajustes sazonais. Apesar do avanço modesto, este é considerado o "novo normal" para o comércio, que diante da desaceleração do mercado de trabalho e do crédito não deve voltar a crescer a taxas mais fortes no médio prazo.
As estimativas para a Pesquisa Mensal do Comércio (PMC), a ser divulgada hoje pelo IBGE, vão de queda de 0,4% a expansão de 0,8% no dado mensal. Para o varejo ampliado - que inclui, além dos oito segmentos analisados no restrito, os ramos de automóveis e material de construção - dez analistas projetam, em média, retração de 0,9% no período.
Para Mariana Oliveira, economista da Tendências Consultoria, a massa de rendimentos dos trabalhadores deixou de contribuir positivamente para o desempenho do setor varejista, em função de ganhos reais de renda mais moderados e a baixa expansão da ocupação. "Do ponto de vista do varejo, o mercado de trabalho não ajuda mais como nos outros anos", afirma. Além disso, o aumento da inflação no início deste ano elevou o nível de preços, que continua alto mesmo com o arrefecimento recente do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
Por isso, afirma, as vendas nos super e hipermercados, que avançaram 0,3% no acumulado até junho deste ano, não devem ganhar muito fôlego nos próximos meses. "As vendas devem ter alguma aceleração, mas não será um forte impulso".
Mariana Hauer, do Banco ABC Brasil, projeta expansão de 0,2% do varejo em julho, em linha com o avanço sugerido pelo Indicador de Atividade do Comércio da Serasa Experian. De acordo com a entidade, as vendas nos mercados recuaram 0,1% nessa comparação. É por isso, comenta a economista, que o avanço de 1,5% mostrado pela Associação Brasileira de Supermercados (Abras) é visto com alguma cautela. "Os dados da Abras têm descolado um pouco da pesquisa do IBGE, por isso avaliamos que as vendas devem influenciar o resultado do mês pelo lado positivo, mas não com tanta força."
As manifestações que tomaram as ruas do país entre junho e julho também são um fator importante para explicar o ritmo moderado de avanço esperado para o primeiro mês do segundo semestre. "Mesmo que não tenhamos visto queda nos índices do varejo, o baixo crescimento nestes dois meses tem relação com o desempenho da confiança, que abala principalmente a venda de bens não essenciais, como vestuário e calçados", afirma.
De acordo com Sondagem do Comércio da Fundação Getulio Vargas (FGV), no trimestre encerrado em julho a confiança dos empresários do setor recuou 5,9% em relação a igual período do ano anterior. Os consumidores também ficaram menos otimistas entre julho e julho, quando o índice recuou 4,1%, para o menor nível desde maio de 2009.
No caso de móveis e eletrodomésticos, a dinâmica pode ser diferente por causa dos estímulos em vigor, entre eles o Minha Casa Melhor, que criou linha de crédito para compra desses itens a juros subsidiados por beneficiários do programa habitacional do governo. Em junho, por exemplo, o avanço de 1,8% dessa categoria de bens deu impulso importante para a alta de 0,5% das vendas no período. "É um programa com potencial de melhorar as vendas, já que as condições de financiamento são muito mais favoráveis do que se encontra atualmente no mercado de crédito privado", diz.
No varejo ampliado, as perspectivas são de um mês mais negativas. Mariana, do ABC Brasil, afirma que os dados compilados pela Fenabrave, entidade que reúne as concessionárias do país, sugerem retração de 1,9% do licenciamento de veículos na passagem mensal. Como o desempenho de materiais de construção também foi fraco, o ABC Brasil projeta queda de 0,9% do varejo nesse conceito em julho, na comparação com o mês anterior.
Jankiel Santos, economista-chefe do BES Investimento, também estima retração de 1,1% do comércio ampliado em julho. A fraca expansão no mês, diz, é "mau presságio para o desempenho dos serviços no período", deixando um carregamento estatístico de queda de 0,8% para o varejo no terceiro trimestre.
A economista do ABC Brasil avalia que o varejo continuará a mostrar variações positivas nos próximos meses, mas sem acelerar o passo, o que deve levar o setor a fechar o ano com alta de 4%, praticamente a metade do avanço de 8,4% de 2012. É o "novo normal" para o comércio, que não deve mais crescer a taxas tão robustas em função da moderação observada no mercado de trabalho, enquanto o endividamento continua a comprometer parte elevada da renda.
Veículo: Valor Econômico