Em um período em que fusões, grandes conglomerados e ganhos de escala predominam na economia, na região Sul são as marcas regionais que estão tendo melhor desempenho.
Levantamento da empresa de pesquisas Nielsen, obtido com exclusividade pelo Valor, mostra que as vendas de produtos regionais em supermercados e hipermercados crescem 38% acima das registradas por marcas nacionais.
"O crescimento se deve principalmente à melhor distribuição das marcas regionais. Como elas conhecem muito bem as regiões, conseguem pulverizar a distribuição e atingir mais consumidores", afirma Daniel Silveira, analista de mercado da Nielsen,
A pesquisa aponta que o varejo de autosserviço - formado basicamente por supermercados, hipermercados e lojas de conveniência - está concentrado em cadeias regionais. Das 40 mil lojas do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, 90% são de redes locais, que respondem por 74% do faturamento.
Apesar de manterem o "jeito" local, são empresas enormes, com receitas na casa dos bilhões. De acordo com o último ranking da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), quatro redes do Sul estão entre as dez maiores do país: Zaffari (RS), Irmãos Muffato (PR), Condor (PR) e Angeloni (SC).
Apesar da fama de bairrista dos sulistas, para Paulo Müeller, professor de marketing da Universidade Federal do Paraná (UFPR), é a tradição que favorece as empresas locais na hora das vendas.
"Historicamente, várias marcas fortes, como Batavo e Polar, foram criadas e conquistaram o consumidor do Sul antes das nacionais aparecerem. São fábricas com 50, 100 anos de vida, uma marca nacional não vai simplesmente chegar e vender mais", disse.
Na região, as marcas locais tiveram melhor desempenho em categorias mais básicas, como leite longa-vida, refrigerante, papel higiênico, refresco em pó e farinha de trigo. Segundo dados da Abras, em leite desnatado e semidesnatado as líderes na região são as marcas Tirol (SC) e Piá (RS), que desbancaram rivais nacionais. A marca de farinha de trigo que mais vende é a Orquídea (RS).
Já em produtos como bolacha, macarrão e café, as nacionais se saíram melhor. Silveira atribui o desempenho às ações feitas pelas grandes marcas nos pontos de venda e aos preços mais competitivos nesses produtos. "O consumidor da região Sul é o mais sensível a preço do país. Qualquer aumento de preço ele deixa de comprar e se tem uma promoção, ele compra mais também", disse.
Para Silveira, enquanto o desafio das marcas nacionais é melhorar a distribuição e conhecer o terreno das regionais, as últimas terão que aumentar as ações no varejo para continuar crescendo. "Só ter o produto disponível no ponto de venda não será suficiente para sustentar o crescimento das regionais a longo prazo", disse.
O levantamento mostra que o consumidor da região Sul tem o que a Nielsen chama de perfil "europeu": 40% da população pertence às classes A e B (no Brasil essa fatia é de 31%), quase metade dos domicílios não tem crianças e 38% dos lares têm até duas pessoas. A região será a primeira do país a zerar a pobreza, o que deve acontecer até 2016, tem a menor taxa de desemprego entre as capitais e melhores indicadores de educação.
Com renda maior e custo de vida menor do que locais como São Paulo e Rio de Janeiro, no Sul sobra espaço no orçamento para bens secundários e terciários, ultrapassando a média nacional de compra desses produtos, principalmente em veículos próprios, móveis e artigos para o lar.
O crescimento no consumo, porém, fica abaixo da média nacional, o que já se reflete em desaceleração na indústria. "No Sul está ocorrendo uma qualificação no consumo, em vez de comprar mais produtos baratos, eu compro um pouco menos, mas de marcas de maior valor", afirmou Silveira.
Veículo: Valor Econõmico