Se confirmada, será a primeira retração do segmento desde 2006
Se nada de extraordinário acontecer até lá, o fim de 2015 deverá confirmar a primeira retração nos supermercados brasileiros em quase 10 anos, segundo a Associação Brasileira de Supermercados (Abras). As vendas, que já acumulam -0,2% de janeiro a julho, deverão fechar o ano com um volume financeiro real (descontada a inflação) 0,3% menor do que em 2014, ano em que o setor faturou cerca de R$ 300 bilhões. A situação marcará o fim de uma série de resultados positivos do segmento que acontecia desde 2006, últimas vez que as vendas encolheram, na ordem de -1,65%.
"Número negativo nunca é bom, mas, pelo menos, vamos conseguir mantê-lo relativamente baixo", comentou o presidente da Abras, Fernando Yamada, atentando também para o fato de que, no valor nominal, sem considerar a inflação, as vendas subirão 8,07%, o que classifica como "satisfatório". Os efeitos da própria inflação alta, aliás, são apontados como os principais freios de 2015, ano em que os brasileiros estão indo menos vezes às lojas e alijando de seus carrinhos os produtos que consideram supérfluos.
Segundo estudos da consultoria Nielsen, categorias como as bebidas não alcóolicas, por exemplo, com queda de 2,6% até aqui, são as que mais sofrem. "Esses produtos, como o refrigerante, são os primeiros a serem deixados nas prateleiras quando o bolso encolhe", argumenta a gerente de serviço de varejo da Nielsen, Maria Fernanda Celidonio. Mesmo assim, outros produtos, aqueles de consumo essencial, continuam puxando o resultado para cima, como os de higiene (+2,4%), alimentos perecíveis (+2,2%) e de limpeza (+1,1%).
Essas categorias, principalmente os alimentos perecíveis, impossíveis de serem estocados, também são apontados como o caminho para o setor combater outro dos principais percalços do ano - a diminuição no número de vezes em que o brasileiro vai ao mercado. "Cada vez que vai à loja, porém, o tíquete médio é maior; e, nesse contexto, se diferenciar se torna ainda mais importante", defende a diretora comercial da consultoria Kantar, Christine Pereira, sobre a maior aceitação dos clientes a produtos em embalagens promocionais ou em tamanhos "família", já percebido pela indústria.
Ganha destaque no ano o retorno da expansão dos hipermercados, mesmo que em uma dimensão pequena, de 0,4% em relação a 2014, já que vinha sofrendo quedas recorrentes nos últimos anos (no ano passado, a queda foi de 2%, por exemplo). O chamado "atacarejo", mercados que aliam atacado e varejo na mesma loja, também surfam na onda, com um crescimento relevante de 8,5% no primeiro semestre.
Fato curioso é que, diferentemente dos últimos anos, nos quais servia de força motriz da expansão do consumo, a classe C é, hoje, o segmento? da população cujos gastos menos crescem. Enquanto as classes A e B aumentaram seu tíquete médio em 6,1% e as classes D e E, em 9,3%, a classe C ficou praticamente estável, com crescimento marginal de 0,6% no valor de cada compra. "A classe média se endividou e é, hoje, a que tem o orçamento mais apertado", comentou Maria Fernanda.
Atento a isso, Yamada aproveitou para se posicionar de forma contrária às medidas de ajuste do governo federal anunciadas na segunda-feira, que envolvem aumento de impostos. "Nossos clientes, em especial a classe C, serão os que pagarão a conta pelos problemas do País", disparou. Outra medida, o congelamento dos reajustes dos servidores, é apontada pelo dirigente como um desafio para 2016, ano em que, já sem o peso da alta da energia e dos combustíveis, a Abras projeta retomar o crescimento, na ordem dos 0,4%. "Já tivemos crises bem piores", complementou Yamada, ressaltando que o setor está muito mais profissional para lidar com as adversidades.(Guilherme Daroit)
Veículo: Jornal do Comércio - RS