Responsáveis por 70% das vendas do setor no estado, redes mineiras que atuam fora da capital vão investir R$ 270 milhões para abrir 39 lojas neste ano e encarar concorrentes
Pequenos e médios supermercados de Minas Gerais seguem à risca a tese de que tamanho não é documento, com uma nova onda de investimentos estimados em R$ 270 milhões no interior do estado neste ano. Os recursos serão aplicados na abertura de 39 lojas, sem nada dever ao conforto, modernidade e qualidade de estoques dos grandes concorrentes do setor, aliados, ainda, à gestão eficiente e ao profissionalismo que as redes menores adotaram.
Mais próximas do consumidor, elas souberam aproveitar o crescimento da renda do brasileiro, a inclusão das classes C e D no consumo, e os efeitos da valorização do salário mínimo para crescer e chegar bem perto dos hipermercados. O desafio agora é manter a capacidade de investir e enfrentar nuvens que rondam o cenário de expansão da economia brasileira, em especial, os rumos da inflação.
Há 20 anos no ramo, Hercílio Araújo Diniz Filho e cinco irmãos, sócios do supermercado Coelho Diniz, de Governador Valadares, no Vale do Rio Doce, conhecem bem a concorrência. A rede prepara a abertura de lojas em Ipatinga e Coronel Fabriciano,, distantes mais de 100 quilômetros da matriz, com a experiência acumulada no comando de cinco lojas em Valadares, uma em Caratinga, na mesma região, e outra em Manhuaçú, na Zona da Mata mineira. “Vivemos uma década de ouro. A crise recente da economia não chegou ao nosso segmento”, garante Hercílio Filho.
Como mineiro típico, o supermercadista não revela o orçamento destinado à expansão, mas avisa que os planos estão apoiados numa política sustentável, que combinou o reinvestimento dos lucros no próprio negócio e a sensibilidade para entender e atender os desejos do consumidor. Ainda em 2013, o Coelho Diniz terá a oitava loja em Valadares e entra em Teófilo Otoni, no Vale do Jequitinhonha. O número de empregados sobe de 1.500 para 2.300.
Conforme as estimativas da Associação Mineira de Supermercados (Amis), o interior do estado vai levar 90% das lojas projetadas e dos investimentos previstos pelo setor em 2013, que totalizam R$ 300 milhões na abertura de 43 unidades e na reforma de 58 lojas. Do bolo do faturamento, que deve ter alcançado R$ 14 bilhões em 2012, elas teriam movimentado algo em torno de 70%, ou seja, R$ 9,8 bilhões. A extensão territorial de Minas e a riqueza gerada em polos industriais e do setor de serviços desenvolvidos, fora da Região Metropolitana de Belo Horizonte, abriram oportunidades e atraem as redes menores, segundo o superintendente da Amis, Adilson Rodrigues.
Essa característica particular do varejo mineiro favoreceu a pulverização da atividade, diferentemente uma tendência de concentração do setor em outros estados, como São Paulo. Outro detalhe em benefício das redes menores é o conhecimento que elas adquiriram para lidar com a logística da distribuição no interior. “Essas redes conhecem mais os mineiros do interior, em meio ao misto de sotaques, de baianos a cariocas, e culturas muito diferentes que encontramos em Minas. É algo que se torna mais difícil para as empresas transnacionais”, afirma.
Culturas diferentes A proximidade com o consumidor foi decisiva para o crescimento da rede Bahamas, de Juiz de Fora, na Zona da Mata, primeira no interior e a quarta maior no estado, que desembarca este ano no Triângulo mineiro, abrindo três lojas em Uberlândia, dona do quarto maior PIB de Minas (Produto Interno Bruto, medida de valor da economia). “É um desafio fantástico chegar a uma região mais rica, com uma grande população e outra cultura (influenciada por São Paulo e o interior paulista). Levamos nossa experiência, uma política de preços agressiva e o envolvimento com o consumidor”, diz Nelson Júnior, gerente de marketing da rede.
Com 28 lojas na Zona da Mata, que sofre a influência do Rio de Janeiro, 4,650 mil empregados e 12 mil itens comercializados, o Bahamas detém as bandeiras Bahamas (supermercado), Empório Bahamas (lojas segmentadas) e Bahamas Mix (atacarejo). Só para viabilizar os planos de expansão no Trângulo, a rede prevê desembolso de R$ 40 milhões, incluindo a abertura das lojas e a construção de um centro de distribuição. A concorrência na região com os hipermercados Carrefour e o Bretas não é novidade.
Atendimento de qualidade é também prioridade para a rede Super Luna, de Betim, na Grande Belo Horizonte, que lançou seu programa de expansão em 2000 e, hoje, comanda sete unidades, com presença em Brumadinho, Igarapé, Contagem e Sarzedo, e um universo de 1.600 empregados. Os principais investimentos neste ano serão feitos na construção de um centro de distribuição em terreno já adquirido e a reforma e ampliação da matriz em Betim, informou o sócio-proprietário Navarro Agostinho Cândido. “Novas lojas também poderão ser abertas, estamos sempre atentos a demandas e oportunidades do mercado”, afirma.
O QUE NOS INTERESSA
Concorrência pode beneficiar clientes
Se as leis da economia vingarem, os planos de expansão dos pequenos e médios supermercados têm o dever de beneficiar o consumidor, entendidos como estímulo à concorrência. E não se trata só de uma competição por meio de políticas de preços, mas da oferta de serviços associados às compras e de atendimento qualificado. O Brasil nem sempre tem assistido a essa lógica; pelo contrário, o cliente tem ficado desamparado em setores marcados por baixa concorrência, apesar da atuação de muitas empresas, a exemplo da telefonia e dos serviços bancários. A perspectiva de um crescimento da economia mais animador neste ano será um teste para a dona de casa perceber que vantagens surgirão da briga dos supermercados.
Redes ganham em eficiência
Ganhos de escala, linguagem corriqueira nas maiores bandeiras dos hipermercados, explicam, da mesma forma, a expansão das redes menores de supermercados, que como a Bahamas, de Juiz de Fora, inclui a possibilidade de aquisições. A escala permite às empresas ganhar em eficiência, observa o professor Nuno Fouto, do Programa de Administração do Varejo (Provar), da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA/USP).
Ao se tornarem redes, os supermercados se veem obrigados a trabalhar num sistema profissional e a usar tecnologia, que é fundamental para lidar com grande volumes. “As demandas e exigências do consumidor também qualificam a oferta dessas redes e nesse aspecto elas não perdem para os hipermercados”, diz Nuno Fouto. Elas oferecem lojas modernas, climatizadas e com estacionamento próprio. Os planos dos supermercados do interior de Minas não se resumem a uma visão otimista do setor para 2013, pondera o especialista, convencido de que Minas Gerais e o Brasil oferecem espaço para que elas se fortaleçam. “O que pode atrapalhar é uma inflação que volte, retirando o poder de compra do consumidor. Ou mesmo, a incapacidade dessas empresas de investir”.
Recursos não parecem ser um empecilho. A pequena rede Faria Supermercados, de Itapecerica, no Centro-Oeste de Minas, avalia oportunidades de crescimento com apoio de crédito de instituições como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A sócia-proprietária Dolores Antônia Fonseca, planeja a abertura em 2014 da quarta loja, com 7 mil itens em estoque, atenta à capacidade de expansão da economia local. “Temos sempre de buscar desafios, trabalhando uma política de lojas que atendam bem no mix, na estrutura e no relacionamento com o consumidor”, afirma.
Planejamento No Bahamas, o gerente de marketing Nelson Júnior conta como a empresa se apoiou num extenso estudo de oportunidades para crescer em cinco regiões de Minas. O planejamento definiu uma empresa com 50 unidades em 2015, portanto, a ambição de abrir 22 lojas em três anos nem poderia descartar prospecção e aquisições. A expectativa de crescimento da rede neste ano é de 20%. Junto ao investimento no Triângulo, serão abertas mais duas unidades na Zona da Mata.
Além do esforço das próprios supermercados, Nelson Júnior lembra que os fornecedores contribuíram com produtos e embalagens de melhor qualidade, leiautes atrativos e equipamentos modernos. Hercílio Filho, sócio da rede Coelho Diniz, considera o logística o principal gargalo dos planos de crescimento. “Já enfrentamos trânsito congestionado no interior e restrições para os caminhões trafegarem em vias urbanas”, observa. Entre as metas da empresa, está a preparação de um centro de distribuição para que a partir de 2014 toda a mercadoria comercializada passe por essa infraestrutura.
Veículo: Estado de Minas