O conselho de administração da fabricante de alimentos BRF oficializou ontem, em reunião extraordinária que durou menos de duas horas, a indicação de Abilio Diniz para a presidência do novo conselho da empresa. Com os votos da maioria, formada pelos conselheiros dos fundos Tarpon e Previ, saiu vitoriosa a chapa única apresentada - apesar do voto contrário da Petros, também acionista da empresa. Sergio Rosa, ex-presidente da Previ, foi indicado pela Previ para ocupar a vice-presidência do futuro conselho, no lugar de Heloisa Helena Silva de Araújo.
A indicação de Abilio e Rosa será submetida a votação na assembleia geral de acionistas, em 9 de abril. A proposta foi feita por Nildemar Secches, presidente do conselho de BRF. Foram dois votos contrários à chapa e um deles veio da Petros, que não apoiava a eleição do empresário à presidência do conselho.
Sócio de Abilio no Grupo Pão de Açúcar, o Casino deve reagir à decisão nos próximos dias. Há uma expectativa de que o controlador tome medidas legais contra Abilio, apurou o Valor. Para o Casino, se Abilio ocupar a presidência dos dois conselhos, fica caracterizado o conflito de interesses. Há a possibilidade de o Casino convocar assembleia geral extraordinária da Wilkes Participações, holding do GPA, para pedir a destituição de Abilio da presidência do conselho do Pão de Açúcar, com base na Lei das S.As, que trata de situações de conflitos de interesse. Também é possível pedido de liminar para a sua saída. Abilio diz que sua permanência no conselho está em contrato com o Casino, assinado em 2006, e é um direito vitalício.
Em nota, a Petros declarou que a decisão de indicar a chapa não precisaria ter sido tomada ontem e citou o conflito de interesses dos sócios. Informou que os votos do representante da Petros, Luís Carlos Fernandes Afonso, e do membro independente, Décio da Silva, foram favoráveis à composição de uma chapa, mas contrários ao nome de Abilio. "Com relação ao processo de escolha do conselho de administração da BRF, a Petros manifesta não ter restrições aos nomes propostos para compor a chapa [...]. No entanto, avalia que o prazo para a decisão sobre quem presidirá o colegiado não precisaria ser hoje, o que abre espaço para a busca do consenso".
Segundo a nota, "tal posicionamento pondera que essa definição precisa ser amadurecida, considerando fatos que ainda necessitam ser melhor compreendidos e consolidados, sobretudo aqueles que envolvem potenciais conflitos de interesse e que devem ser ponderados por todos os acionistas da companhia". A Petros, que ampliou sua participação acionária na BRF para 12,9%, indicou Carlos Costa para ocupar uma segunda cadeira no conselho.
"Estou satisfeito com a formação da chapa única do conselho com Abilio [Diniz] na presidência e Sergio Rosa como vice, o que vai ser muito bom para a companhia", disse Dan Conrado, presidente da Previ, ao Valor. Conrado e Marco Geovanne, diretor da Previ, destacaram que Sergio Rosa foi uma indicação do fundo. Na avaliação de ambos, a ida de Diniz para a presidência do conselho da BRF, caso a assembleia confirme seu nome, não configura "conflito de interesses" com o GPA.
"Não tem nada que proíbe Abilio de estar lá (Pão de Açúcar) e cá (BRF). Há vários exemplos de fornecedores e compradores que estão no conselho de empresas, como a Mitsui no conselho da Valepar", disse Conrado. Ambos evitaram comentar a possibilidade de retirada de Abilio da presidência do conselho do Pão de Açúcar.
Secches, que renunciou ao cargo de presidente do conselho da BRF, propôs a formação de uma chapa de conciliação, evitando um "racha". Sua sugestão, acatada por unanimidade, foi a de manter a maioria dos conselheiros.
Horas antes do início da reunião ontem, Jean-Charles Naouri, presidente do Casino, disse, em Paris, que a possibilidade de Abilio se tornar presidente do conselho da BRF "cria um conflito de interesses e é totalmente contrária à ética e à governança empresarial".
"A BRF é o principal fornecedor do GPA, que, por sua vez, é o primeiro ou segundo maior cliente da BRF. Acredito que presidir o conselho da maior varejista do Brasil e do principal fornecedor agroalimentar do país ao mesmo tempo cria um claro conflito de interesses", disse Naouri.
"Imagine se nos Estados Unidos o presidente do Walmart quisesse presidir a Procter & Gamble. Imagine que quando fosse dito que há conflito de interesses, ele respondesse que não há conflito. Isso provocaria gargalhadas", ironizou. "Tenho confiança de que a ética e a governança vão triunfar no Brasil e que a hipótese de que o senhor Diniz se torne presidente do conselho da BRF não vá se concretizar". A Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro e a Federação Única dos Petroleiros questionaram ontem a indicação de Abilio.
Veículo: Valor Econômico