A transição para uma economia sustentável esbarra em um ponto crítico: o fato de que o consumo, nos padrões atuais, continua a ser o motor de muitas economias, inclusive a do Brasil. Nos debates da Rio+20, esse é um tema crucial, que tem apoio de muitos países e blocos, como a União Europeia e os africanos, mas também enfrenta resistências de peso, como dos EUA. Há quem entenda que a posição americana tem cunho ideológico, segundo o qual há áreas em não é papel do Estado interferir.
O pano de fundo dessa discussão na Rio+20 é a inclusão, no documento-base da conferência, de compromissos para a futura implementação de um programa-marco de dez anos sobre padrões de consumo e de produção sustentáveis. A versão do texto negociado que está circulando indica que o cumprimento desse programa pelos países deve ter caráter voluntário e não obrigatório.
A iniciativa visa dar meios de capacitação e apoio a comunidades em níveis locais e regionais. "É possível ter uma moldura global sobre o assunto. Mas isso está sendo negociado", diz Charles Arden-Clarke, do Programa da ONU para o Meio Ambiente (Pnuma).
Ele diz que A União Europeia (UE) tem um programa chamado "Switch Asia", de € 150 milhões, que vem ajudando 18 países asiáticos a mudar para padrões sustentáveis de produção e de consumo. Clarke lembra que o Brasil também tem uma estratégia nacional para produção e consumo sustentáveis. O caminho nessa direção pode ser mais demorado a partir de escolhas do governo, como a recente decisão de tentar estimular a economia reduzindo o IPI dos carros. "Isso não vai ajudar", disse
Uma pergunta nesse debate é como fazer para continuar a crescer a partir de um consumo menos focado em bens e mais em serviços. Esse movimento requer não só políticas governamentais, mas um trabalho de longo prazo de educação e de mudança de hábitos de consumo. "Isso pode levar a que uma pessoa opte por aproveitar a praia ao invés de usar um jet ski."
Ao incluir o tema na declaração da Rio+20, abre-se um caminho para continuar trabalhando. Esse processo exigirá produzir conhecimento científico que permita criar políticas ligadas a consumo sustentável. "É o início de um processo que, depois, terá que ser [mais bem] definido", diz Luis Flores, responsável de políticas e campanhas do escritório regional da ONG Consumers International, que reúne entidades de consumidores.
Flores entende que a Rio+20 discute a produção e o consumo com foco no impacto sobre o ambiente. A ideia é que, ao mudar padrões de consumo e produção, seja possível produzir bens de modo mais eficiente, com menos custos e maior rentabilidade para as empresas, poluindo menos e reduzindo o impacto ambiental.
"Queremos reforçar o vínculo do consumo sustentável, além do ambiente, em temas como saúde pública e crise financeira", diz Flores. Um exemplo está no efeito que o consumo excessivo de açúcar e de sal tem sobre a saúde humana e, por consequência, sobre os orçamentos públicos dos governos.
Essa mudança requer investimento, tecnologia e politicas que contemplem vários tipos de incentivos. "Consumo e produção são o centro do desenvolvimento sustentável", diz Arden-Clarke. "Não teremos desenvolvimento sustentável a menos que a gente mude para um novo padrão."
O economista Jeffrey Sachs, da Universidade de Columbia, de Nova York, chama a atenção para a urgência do assunto. "Se apenas expandirmos a economia fazendo o mesmo tipo de coisa, vamos ultrapassar limiares cruciais, criando um grande problema para a biodiversidade e para a humanidade."
Veículo: Valor Econômico