Agronegócio já pode crescer sem desmatar

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O seminário "Segurança Alimentar e Sustentabilidade no Agronegócio", realizado durante o evento Humanidade 2012, mostrou que o agronegócio brasileiro amadureceu nos últimos anos e até admite, ao menos no discurso, que já não precisa de mais desmatamento para seguir crescendo e que voltar a mexer no bioma amazônico está fora de questão. Mesmo a senadora Katia Abreu (PDT-TO), presidente da Confederação da Agricultura e da Pecuária do Brasil (CNA), conhecida por seus embates com os ambientalistas, já prega o preservacionismo e admite que o setor não precisará de novas terras "por muitos anos".

"Na verdade, neste momento e por muitos anos adiante, não vamos precisar desmatar mais porque a área que temos aberta dá para dobrarmos, triplicarmos a produção de carnes e de grãos, implementando tecnologias", disse em rápida entrevista após exposição em que mostrou os esforços que vem fazendo para modificar a imagem negativa do setor. Ainda assim, na apresentação, a senadora não resistiu a alfinetar várias vezes os ambientalistas, como quando os comparou a uma melancia, verde por fora e vermelha por dentro, em alusão a ideais comunistas que estariam por trás de parte do discurso ambiental. Mas, no geral, mostrou abertura ao diálogo.

"Eu concordo que é possível compatibilizar a agricultura e a produção com a preservação do meio ambiente. Não é nem uma questão de concordar, é uma obrigatoriedade. Temos que usar toda a força da inteligência humana para minimizar os impactos ambientais e produzir conforto para as pessoas", disse. A senadora, festejada pelos presentes, disse ao Valor que as necessidades de terras adicionais para a agropecuária serão supridas "principalmente" pela recuperação de pastos degradados, iniciativa que, disse, ela mesma está tomando na sua fazenda no Estado do Tocantins.

Uma das iniciativas bem sucedidas apresentadas no seminário (fazenda no município goiano de Ipamari), combina plantio de milho e capim braquiária em uma mesma área de pasto degradado, com o acréscimo posterior de eucalipto para extração de madeira. A esse respeito, o agrônomo da Embrapa João Kluthcouski, conhecido como João K, disse, disse em reportagem do "Globo Rural" usada como ilustração, que se o Brasil investir, com a tecnologia já disponível, na recuperação dos 100 mil hectares de pasto degradado hoje existentes, não será necessário mais desmatamento para ampliar a área agropastoril do país.

Realista, o diretor-geral do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone), André Nassar, disse ao Valor que a expansão do agronegócio até 2030 vai precisar de 5,5 milhões de hectares de áreas novas, o que corresponde à redução de 61% para 60%, da área total preservada. Segundo ele, esse desmatamento adicional seria "100% no Cerrado, já que na Amazônia não se desmata mais".

Nassar ressaltou que, caso sua estimativa se concretize, haverá redução dos atuais 750 mil para 250 mil hectares por ano do nível de desmatamento do Cerrado. Hoje, segundo o especialista, o Cerrado tem 98 milhões hectares preservados, de um bioma total de 200 milhões de hectares. Confirmada sua estimativa, ela representará a redução da atual área preservada em cerca de 2,5% e do bioma total em cerca de 5%, em números arredondados.

Mas o diretor do Icone admitiu que o desmatamento até 2030 pode vir a ser maior do que sua estimativa. "Claro, isso que estou falando tem a ver com o que a agricultura necessita. Agora, é preciso ver o desmatamento ilegal. Aí são outros quinhentos! Talvez o desmatamento não seja esse que estou falando, talvez seja maior porque tem outros fatores como a informalidade, a falta de direito de propriedade da terra, falta de legalização do produtor..." Nassar admitiu que as terras desmatadas ilegalmente poderão, no momento posterior, ser até incorporadas pela agropecuária, mas que não será um desmatamento que possa ser imputado ao setor.

Ingo Plöger, diretor da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), é outro que admite não haver necessidade de desmatar mais para ampliar as áreas agricultáveis e que aposta na recuperação dos pastos degradados. "Nós não precisamos mexer em mata nativa para ampliar nossas áreas de agricultura, não precisamos", disse ao Valor, concordando com João K quanto ao papel do uso de tecnologia para a recuperação de áreas degradadas.


Produtividade é o grande desafio


Os produtores rurais têm um desafio e tanto nas próximas décadas: garantir a segurança alimentar de 9,5 bilhões de habitantes no planeta em 2050, sem que a agricultura e a pecuária degradem o meio ambiente. Hoje, a produção mundial de grãos está estimada em 24,42 bilhões de toneladas e o consumo, em 24,41 bilhões. "É um equilíbrio apertado", diz Antônio Carlos Costa, gerente do departamento de agronegócio da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). "Se o consumo de carne bovina per capita na China aumentar apenas um quilo, as exportações mundiais de carne precisariam crescer 18% para suprir a demanda", explica.

Para atender ao crescimento de consumo e diminuir o impacto ambiental, será preciso aumentar a produção por unidade de área, diz Costa. "O Brasil vem dando uma resposta boa a esse desafio. Se fôssemos produzir a safra de hoje com a tecnologia de 1990, precisaríamos de mais 50 milhões de hectares", afirma.

Para Carlos Fávaro, presidente da Associação de Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT), o país tem condições de atingir níveis de produtividade atendam às demandas de segurança alimentar sem prejudicar o meio ambiente. "Só em Mato Grosso, são 7 milhões de hectares de pastagens degradadas, que podem ser recuperadas, o que dobraria a área para plantação, sem necessidade de desmatamento", diz.

A produtividade da pecuária também é chave para uma estratégia sustentável de segurança alimentar. O Brasil, maior produtor de carne bovina do mundo, cria 1,1 cabeça de gado por hectare de pastagem. Segundo Luís Cláudio Paranhos, produtor de gado zebu na Bahia e diretor da Associação Brasileira de Criadores de Zebu, um dos meios de aumentar a escala de produção é o melhoramento genético do rebanho, além de boas práticas de manejo e investimento em controle de sanidade do gado.


Veículo: Valor Econômico


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