Convergência digital obriga a maior fabricante de computadores do País a se reinventar; produtos deverão ser voltados para a classe C
Em 21 anos de história, a Positivo Informática nunca havia passado por um momento de discussão sobre seu futuro tão rico como o atual. "A única coisa que sabemos hoje é que nós vamos fazer um novo produto. Só não decidimos ainda qual será", afirma Helio Rotenberg, cientista da computação que criou a Positivo com apenas 28 anos, ao lado de cinco professores de cursinho pré-vestibular.
Relatório recente de um banco de investimentos que acompanha o desempenho das ações da Positivo na Bovespa aponta a revolução tecnológica como um dos riscos para o futuro da companhia. "O mundo tem mudado constantemente seus parâmetros tecnológicos. Os computadores estão menores e os softwares e acessórios evoluíram bastante em poucos anos. O setor está excepcionalmente orientado para novas tecnologias e há riscos de um lançamento inovador deixar os produtos da Positivo rapidamente obsoletos, minando sua habilidade de se adaptar a uma nova tendência ou demanda."
Na lista de possibilidades da Positivo, os tablets são os produtos que mais se aproximam de um computador. Todos os concorrentes da Positivo já começaram a se mexer para não perder essa nova frente de batalha. Na semana passada, a Dell, segunda colocada no ranking brasileiro, anunciou o lançamento do seu Streak. O produto chegará às lojas da Grã-Bretanha e dos Estados Unidos em breve. Ainda não há data para estreia no Brasil.
O dispositivo, que está entre um notebook e um smartphone, foi uma das sensações da edição deste ano da CES, feira de tecnologia que ocorre anualmente em Las Vegas, nos Estados Unidos. No evento, HP e Motorola anunciaram que iriam lançar o seu tablet até o fim deste ano. Dias atrás, a HP confirmou que o seu Slate vai rodar em um sistema operacional desenvolvido pela Palm ? empresa recém-adquirida pela HP.
Os pesquisadores da Positivo estão testando o iPad, o tablet da Apple, lançado em abril. O próprio Rotenberg diz que passou uma semana usando o aparelhinho. "A convergência digital nos obriga a estudar todos os tipos de dispositivos: pequenos, médios e grandes. Até o e-book, que está meio esquecido, tem seu apelo", diz ele, sem dar pistas sobre qual produto terá prioridade e nem detalhes sobre a estratégia da companhia. No passado, a Positivo chegou a cogitar a fabricação de TVs.
Segundo o Estado apurou, o celular, a TV ou o tablet da Positivo não concorreriam diretamente com produtos de marcas como Apple, Nokia, Sony ou Samsung. Seriam uma opção mais barata, vendida em grandes cadeias varejistas, como Casas Bahia, Extra e Magazine Luiza, com as quais a companhia já tem um relacionamento sólido ? o que, nesse setor, leva tempo para ser construído. A Positivo vende, hoje, para 24 das 25 maiores cadeias de varejo do País. No ano passado, adquiriu a marca de computadores Kennex ? que tinha como sócio João Paulo Diniz, filho de Abilio Diniz ? para aumentar sua participação na rede Extra, do Grupo Pão de Açúcar.
A fabricação de aparelhos eletrônicos, inclusive TVs de LCD e smartphones, não exigirá uma grande revolução na empresa, segundo especialistas. A maior parte desses produtos já virou commodity. Os componentes são importados e as fábricas brasileiras funcionam como linhas de montagem.
Fenômeno. A Positivo é um fenômeno raro no seu setor. É a única empresa local a figurar no ranking dos maiores fabricantes de computadores do mundo. O salto espetacular foi possível graças a uma combinação de fatores: crescimento explosivo do mercado brasileiro, generosos incentivos fiscais ? que beneficiam todos os fabricantes locais de informática ? e uma bem-sucedida estratégia de relacionamento com o varejo e de desenvolvimento de produtos.
Na opinião de analistas que acompanham as ações da Positivo, a companhia, ao contrário dos seus concorrentes globais, pôde rapidamente se adaptar às necessidades e às tendências do mercado local graças ao seu rápido e flexível processo decisório. "Além disso, seu pós-venda tem um alcance grande e é reconhecido pela qualidade, o que é vital para o negócio", disseram os analistas em relatório recente de um banco de investimentos.
Há cinco anos, para não perder mercado, a Positivo lançou seu primeiro notebook. Em 2009 a empresa já estava na 13.ª posição entre as maiores fabricantes de computadores portáteis do mundo ? em desktops (computadores de mesa) ela aparecia em nono lugar. Neste ano, as vendas de notebooks devem ultrapassar as de desktops no País. Trata-se de uma tendência irreversível. Em 2012, a previsão é de que sete em cada dez computadores vendidos sejam notebooks.
Outro bom exemplo dessa capacidade de entender as características do mercado local é o PCTV, um computador que existe no resto do mundo, mas aparentemente só fez sucesso por aqui. A Positivo foi a primeira a colocar no mercado brasileiro um produto que integrava computador e TV. O produto foi lançado em 2005 e hoje é o modelo mais vendido da companhia ? representa 20% da receita total.
Erro de cálculo. Mas nem todas as inovações deram certo. Em 2007, quando a TV digital foi lançada no País, a Positivo foi a primeira a colocar um conversor no mercado. A empresa, que chegou com a proposta de oferecer o preço mais baixo, vendeu apenas 84 mil conversores. Sem demanda pelo produto, a Positivo interrompeu a produção.
A companhia, que disputa o mercado com multinacionais como HP, Dell e Lenovo, ainda amarga uma fama de fabricar computadores de menor qualidade. Especialistas que acompanham a evolução dos seus produtos, no entanto, dizem que eles melhoraram muito nos últimos anos. "O nível de reclamação hoje é bem baixo. A Positivo já tem padrão internacional", diz Ivair Rodrigues, diretor da consultoria IT Data. "Não é só preço que garante a liderança da Positivo. A empresa tem sido muito ágil, está muito antenada às tendências de consumo."
Veículo: O Estado de São Paulo