Os múltiplos segredos de um grande rioja branco

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Nos últimos anos, venho ficando cada vez mais impressionada pelos vinhos feitos de uma uva da qual quase não se escreve e da qual as autoridades da região onde é mais importante parecem envergonhar-se.

 

Essa variedade histórica de vinho é conhecida como Macabeu ou Maccabéo no sul da França, Macabeo em grande parte de sua terra nativa, a Espanha, e Viura, em La Rioja, onde é de longe a uva de vinho branco mais plantada. Possui a incomum virtude de ser capaz de produzir vinhos brancos secos, frequentemente em cortes, com verve e caráter que melhoraram com o tempo.

 

Recentemente, a comissão administrativa do Rioja decidiu que seria uma boa ideia permitir que as variedades internacionais Chardonnay e Sauvignon Blanc fossem usadas para produzir Rioja branco, com corte de até 49%, mantendo uma (ligeira) maior parte de Viura - embora as variedades locais, Garnacha Blanca e Malvasia, assim como as mais desconhecidas Maturana Blanca, Tempranillo Blanco e Turruntés também sejam permitidas pelas novas regulamentações do Rioja branco.

 

O Conselho Regulador do Rioja informa que está introduzindo os intrusos internacionais para tornar o Viura/Macabeo mais fresco e frutado, para responder à demanda, de forma que proibiu qualquer nova plantação de Viura. Parece ser algo desnecessário. O mundo não sofre de escassez de Sauvignons e Chardonnays - e será que são realmente as únicas uvas que trazem frescor e aroma de frutas? Eu imagino que o Garnacha Blanca, que já é permitido no Rioja branco, é bastante frutado e que a baixa acidez não é uma falha comum nos Riojas brancos de hoje em dia. A maioria de nós pensa em La Rioja como uma região de vinho tinto, mas - de acordo com Miguel Ángel Gregorio, da Finca Allende, o homem responsável pelo Allende 2003, o melhor Rioja branco que já experimentei - até 1975 a produção de vinho branco era maior do que a de tinto.

 

"Em 1999, na Allende, iniciamos um projeto para descobrir um novo caráter para nosso vinho branco", diz Gregorio. "Pedi uns barris Montrachet ao famoso tanoeiro francês Jean François, da François Frères. Em nossa primeira preparação deixamos três meses com borras semanal. Descobrimos que nossos vinhos responderam bem quando mantidos mais tempos com borras e com mais 'bâtonnage'. A partir de 2002, fizemos a agitação duas vezes por semana por oito meses e nossos brancos ficaram no total entre 15 e 16 meses no barril - sempre barris novos da François Frères", relembra.

 

A primeira produção da Allende, de 1999, era de 60% Viura e 40% Malvasia, mas à medida que a proporção de Viura foi sendo aumentada, o mesmo ocorreu com a qualidade, com o deliciosamente gostoso e estimulante 2003 sendo feito de 80% de Viura e 20% de Malvasia.

 

A Allende possui apenas 51 vinhas de Garnacha Blanca, portanto essa variedade praticamente não contribui para o corte. As uvas para vinho branco foram plantadas, em geral, em torno a 1964. "Na Rioja, ninguém plantou Viura depois disso", diz Gregorio. Se ele estiver correto, a região deve ser um local de uvas Viura que são muito mais velhas do que o normal na maioria das regiões vinícolas.

 

Como a qualidade do vinho tende a melhorar com a idade da vinha, pergunto por que não há mais Riojas brancos de grande qualidade. Com a exceção de um punhado de Riojas brancos tradicionais que podem envelhecer de forma soberba (mas possivelmente caem no gosto de apenas uma pequena minoria), como os da Viña Tondonia, de López de Heredia; e os brancos aveludados da Marqués de Murrieta, os Riojas brancos atualmente tendem a ser produtos simples consumidos quando bem jovens.

 

O problema é que as vinhas Viura/Macabeo tendem a ter superprodução, com uvas grandes que podem ter uma proporção baixa de pele e sabor em relação à polpa. Os cachos são tão apertados que as uvas apodrecem com facilidade, especialmente no oeste de La Rioja, influenciado pelo Atlântico. Portanto, para produzir um Rioja branco saudável, é preciso colher as uvas antes. Essas uvas normalmente terão apenas 12% de álcool. Para obter-se maturidade aromática, é preciso 13%. Então, deve-se podar a colheita forte e magra - o que a maioria dos produtores não está preparada para fazer.

 

Na Allende, houve tanta aceitação por seus vinhos brancos, que, a partir da produção de 2008, passaram a produzi-los em seu vinhedo no monte Calvario, em Briones. Gregorio acha que seu vinho seria melhor com mais Viura e menos Malvasia porque, embora o Malvasia certamente não careça de caráter, oxida-se com facilidade.

 

Outra boa notícia para os fãs dos vinhos brancos finos Rioja é que, enquanto 2006, 2007 e 2008 apresentaram desafios para as uvas dominantes Tempranillo, de vinho tinto, eles foram espetaculares para a Viura, segundo Gregorio, que não é mais o único produtor que está levando o vinho branco a sério.

 

As vinhas são cultivadas amplamente no nordeste da Espanha, sendo usadas em vários vinhos, tanto de corte como varietais.

 

A variedade tem ótimo rendimento em Roussillon, seu lar francês. Mesmo aqui, contudo, é uma planta exigente. "Tende a ter doenças fúngicas e vírus da folha em leque e solta acidez de um dia para o outro, o que significa que a data de colheita é crucial", diz Jonathan Hesford, da Domaine Treloar. Portanto, é ainda mais extraordinário que tantos vinhos brancos secos finos sejam feitos com a Macabeu nos terrenos variados de Roussillon. Aqui, contudo, tende a ser misturado com vinhos cheios, como os de Grenache Blanc (a Garnacha Blanca da Espanha) e Grenache Gris, que são muito plantadas em Roussillon na envergadura dos vinhos doces e fortes de Rivesaltes e Maury.

 

A Gayda, no entanto, uma empresa logo ao norte de Livoux, no Languedoc, conseguiu ter pelo menos duas safras bem-sucedidas, 2005 e 2007, com 100% de Macabeu, de vinhas plantadas em granito no Agly Valley, onde Domane Gauby vem fazendo cortes secos inspiradores, a partir das antigas vinhas daqui, incluindo Macabeu, há anos. Esses vinhos possuem uma qualidade elogiada e fortes traços minerais o que parece ser uma consequência lógica
 


Veículo: Valor Econômico


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