Alvo de quase 300 manifestações de partes interessadas, o processo para aplicação de salvaguardas às importações de vinho terá sua primeira consulta pública em junho, informou a secretária de Comércio Exterior do ministério de Desenvolvimento, Tatiana Prazeres. Defensores da barreira aos importados, os produtores nacionais já se movimentam para buscar um acordo com os produtores de Argentina e Uruguai, que ficarão a salvo das salvaguardas. Planejam uma reunião na próxima semana, para uma "estratégia comum" dos vitivinicultores do Mercosul.
"Quando falamos em salvaguarda, não temos o objetivo de reduzir a oferta do mercado, mas balizar o crescimento de todos", disse, ao Valor, o diretor-executivo do Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin), Carlos Paviani.
Uma eventual salvaguarda sobre os vinhos importados seria aplicada sob a forma de cotas - limites - de importação, que, segundo imagina Paviani, deverão preservar os valores de importação atuais e prever até um pequeno aumento, garantindo aos produtores nacionais, porém, uma fatia maior do mercado brasileiro. Para evitar que essa fatia seja tomada pelos produtores vizinhos, livres da cota, os fabricantes nacionais de vinho contam negociar a extensão do acordo hoje firmado com os produtores do Mercosul, pelo qual eles não vendem ao Brasil vinhos abaixo de determinado limite de preço.
Paviani admite que o atual limite combinado com os argentinos e uruguaios, de US$ 10,00 por litro, é considerado baixo pelos fabricantes nacionais, o que indica uma expectativa de rever esse limita, para cima. "Queremos estabelecer plano ação conjunto", adianta Paviani. "Ele contemplaria algumas questões para mercado interno do Mercosul e estratégias para atingir terceiros mercados em conjunto".
Representantes dos importadores e produtores estrangeiros contestam, porém, os argumentos dos fabricantes nacionais em favor das salvaguardas, que, segundo as normas da Organização Mundial do Comércio (OMC), só podem ser aplicadas se for comprovado um surto imprevisto de importações que ameace a produção nacional. Um dos principais alvos das contestações à salvaguarda é o argumento, apresentado pelos produtores nacionais, de que a retração econômica mundial levou os fabricantes tradicionais a buscar alternativas, inundando os mercados dinâmicos como o do Brasil.
Para o consultor da Barral M. Jorge Associados, Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior, os países que reduziram suas vendas à Europa foram Austrália, Estados Unidos e África do Sul, que não buscaram compensação no mercado brasileiro. Um dos principais exportadores com aumento de vendas ao Brasil, o Chile, até aumentou as exportações à Europa nesse período. No caso dos Estados Unidos, embora as importações de vinho pelo país tenham decrescido no auge da crise, em 2008, elas se recuperaram, indicando aumento no consumo, a ponto de chegarem, em 2010 e 2011, a um patamar superior ao de antes da crise.
Para Barral, outros fatores, como as condições climáticas, que provocaram a quebra de safra, e a opção pela produção de suco de uva integral, explicariam a queda na produção nacional, e não a crescente concorrência dos importados. Paviani não aceita essa análise, argumentando que a produção não equivale à venda do produto no mercado, e que são as perspectivas negativas para o produto nacional que têm desencorajado os fabricantes de vinho no Brasil.
Entre os argumentos contrários à salvaguarda, o governo recebeu também o reconhecimento, pelos países da União Europeia, de que tem havido um decréscimo no consumo de vinho no Velho Continente. O fenômeno, porém, é mais antigo que a crise econômica, e está ligado a mudanças nos hábitos de consumo na Europa, que vem migrando para vinhos de melhor qualidade, em quantidades menores, segundo argumentam os europeus. Ontem, autoridades portuguesas levaram ao ministério o temor de barreiras injustificadas aos vinhos dos países da Europa.
Veículo: Valor Econômico