Com o consumo em queda, fabricantes do tradicional destilado brasileiro, como Diageo, Campari, Tatuzinho e Pitú, querem transformar o popular produto em premium
“Todo mundo sô vê as pingas que tomo, mas não vê os tombos que levo” reza um conhecido dito popular. A novidade é que o mais famoso dos destilados brasileiro é quem está levando um tombo e tanto. Em 2010, foram consumidos no País 173 milhões de litros da “marvada”, um das dezenas de nomes pela qual a “branquinha” é conhecida. No ano passado, os apreciadores da bebida feita a partir da cana-de-açúcar consumiram apenas 157 milhões de litros, uma queda de quase 10% em dois anos, de acordo com pesquisa da consultoria britânica Mintel, obtida com exclusividade por DINHEIRO. O tombo é equivalente a mais de 16 milhões de garrafas da bebida. Isso acontece por basicamente dois motivos.
O primeiro é o aumento da renda do brasileiro, que possibilita a compra de bebidas importadas e mais caras. O segundo é que o gosto dos aficionados por destilados está mudando, principalmente entre os jovens. “O consumidor mais jovem está trocando a caipirinha pelo uísque com energético”, afirma David Turner, diretor de pesquisa da Mintel no Brasil. “É uma questão de aspiração social, os mais novos não querem ser vistos bebendo cachaça.” Essa tendência faz com que diversas empresas do setor repensem suas estratégias. Casos da britânica Diageo, dona da marca Ypióca, da italiana Campari, que detém a Sagatiba, e de tradicionais fabricantes locais da bebida, como a Tatuzinho, que produz a Velho Barreiro, e a Pitú.
Para reverter essa queda, elas buscam reposicionar a cachaça como uma bebida sofisticada. A Diageo é o principal exemplo dessa tendência. A empresa, que comprou a Ypióca no ano passado por R$ 900 milhões, acabou vendo diminuir sua participação no setor de cachaça. A saída encontrada para reverter a queda foi reposicionar a marca. Ela iniciou uma campanha para valorizar a bebida destilada brasileira. Além disso, lançou produtos de maior valor, com garrafas que chegam a custar R$ 40. “Não acredito que o consumidor substituiu o produto, mas que ele está consumindo outros também”, afirma Eduardo Bendzius, diretor de marketing da Ypióca. “O preço médio da cachaça cresceu, o que mostra que há consumo de produtos de maior valor e até redução da informalidade.”
Para as cachaças mais populares, o tombo foi, de fato, muito maior. “Em dez anos, esse mercado caiu 40%”, afirma Cesar Rosa, presidente da Tatuzinho. A fabricante de Piracicaba (SP) adotou uma estratégia parecida com a da Diageo para recuperar o terreno perdido. A marca Velho Barreiro passou a receber um tratamento diferenciado e a ser posicionada como premium. A empresa lançou uma edição limitada de uma garrafa incrustada de diamantes, que custava mais de R$ 200 mil. A versão sem as joias, no entanto, sai por pouco mais de R$ 100. A pernambucana Pitú também viu as vendas caírem. “Por isso estamos de olho em outros segmentos que têm obtido crescimento”, afirma Alexandre Ferrer de Morais, diretor comercial e de marketing da empresa.
De acordo com ele, a Pitú avalia o lançamento de um produto da linha Ice, mistura que leva bebida alcoólica e refrigerante e deve ser consumida gelada. Segundo a pesquisa da Mintel, os produtos misturados e com sabor representam boas oportunidades para os produtores de cachaça. Outra aposta da Pitú é no mercado externo. Recentemente, a cachaça brasileira foi reconhecida pelos Estados Unidos como produto brasileiro – antes era enquadrada na categoria de rum. “Isso dá maior visibilidade para o nosso produto lá fora, o que nos permite conseguir trabalhar com margens melhores na exportação”, afirma Morais. Os números, no entanto, ainda são pouco expressivos. No Brasil, pouco mais de 1% da produção anual de cachaça é exportada.
Veículo: Istoé Dinheiro