O mercado brasileiro de cervejas deve começar a perder força. Depois do forte crescimento nos últimos anos, a indústria de bebidas pode iniciar um aumento da disputa por participação de mercado, embalada por trajetória de desaceleração nas vendas.
De acordo com a Euromonitor International, o volume de vendas de cerveja no País subiu 17,6% entre 2009 e 2014. No entanto, a previsão da consultoria é que de 2014 a 2019 esse ritmo de crescimento passe para 7,9%. "Existe uma desaceleração do consumo em 2015 e também neste ano para marcas populares [de cerveja], especialmente quando comparadas às vendas de 2014 no período da Copa do Mundo", explicou a analista de pesquisa da Euromonitor, Angélica Salado.
Em sua avaliação, os rótulos premium continuarão avançando no mercado nacional, apesar da deterioração da economia no País. "Por uma questão de preço médio, a situação econômica atual inibe, para a grande maioria dos brasileiros, o consumo exclusivo destas bebidas [de maior valor]. Mas a grande lição que as marcas premium têm deixado para empresas que oferecem cervejas populares é que existe demanda por cerveja de posicionamento superior e cujo apelo vai além de preço", disse a analista.
Já o diretor de contas da consultoria Kantar Worldpanel, Thiago Torelli, chamou a atenção para a perda de espaço das cervejas mainstream (intermediárias) por dois movimentos distintos. Segundo ele, enquanto marcas premium como Stella Artois e Budweiser, da Ambev, e Heineken estão avançando sobre uma parte do mercado até então dominada por rótulos mainstream como Skol, Brahma e Schin, as cervejas mais baratas também podem tirar uma fatia dessas marcas tradicionais para o brasileiro.
Estratégia
Torelli observa diferentes movimentos no mercado atualmente, com avanço de cervejas de maior e menor valor. "Mas é fato que a renda do brasileiro está menor e, se ele [o consumidor] identificar vantagens poderá migrar. Nesse cenário, o preço pode ser a estratégia de algumas empresas", acredita o executivo.
Ele destacou, por exemplo, o avanço da marca Itaipava, da Petrópolis, sobre rótulos líderes da gigante Ambev. "Itaipava tem um preço médio menor que o praticado pelas concorrentes. Isso somado a um investimento em comunicação tem feito a marca ganhar mercado", comentou.
Mas a Ambev, cujo foco tem sido ampliar as vendas do segmento de cerveja premium, não deve deixar de investir nos rótulos populares. "O premium é interessante, porém, o grande volume está com as marcas mainstream do nosso portfólio, que fazem o volume [de vendas] de fato acontecer na companhia", disse a diretora de marketing da Ambev, Maria Fernanda Albuquerque. A executiva, responsável pelas marcas das marcas Antarctica e Polar, contou que a companhia vem apostando na diferenciação dos rótulos intermediários de cerveja, para que o preço não seja o principal fator de decisão na compra da bebida pelo consumidor final.
"Estamos de fato num momento difícil para a economia como um todo, mas tentamos agregar valor para as nossas marcas populares e também estamos preocupados em oferecer alternativas para os consumidores que buscam economizar, como as garrafas retornáveis, que exigem um desembolso menor", afirmou ela.
Embalagem
Para o consultor Adalberto Viviani, a principal motivação das fabricantes de cerveja ao investirem na oferta de garrafas retornáveis é a redução no custo com embalagens e menos uma preocupação com o preço médio final do produto.
"O grande interesse da embalagem retornável é que ela dá lucro para indústria de cerveja, porque ela pode ser reutilizada muitas vezes e oferece um aproveitamento melhor da estrutura de distribuição, possibilitando um melhor ciclo de logística reversa. Quando o entregador leva os produtos para reabastecer o varejo, volta para a fábrica com as embalagens vazias", acredita o consultor.
Para que a estratégia funcione, Viviani lembrou que a fabricante precisa contar com uma boa estrutura de distribuição ou o modelo pode acabar gerando gastos adicionais à empresa.
A paulista Socorro Bebidas, dona da cerveja A Outra, tem nas garrafas retornáveis a maior parte do volume comercializado, mas não vê vantagem competitiva adicional no formato. "A lata de alumínio pode ter custo maior, mas a despesa para o transporte dos produtos nesse tipo de embalagem é menor se comparado à garrafa de vidro, então no final não faz muita diferença para nós. E o preço final nos dois tipos de embalagem não muda muito", afirmou o gerente comercial da Socorro Bebidas, Maurício Cruz.
Regional
Cruz, responsável pela gestão da marca A Outra, revelou que as vendas da cerveja cresceram 20% em volume no último ano. Para 2016, a meta é ampliar em mais 20% as vendas, consolidando participação nas regiões em que o produto já é negociado. "Vamos focar no mercado regional, porque líderes estão estabelecidas e contam com uma rede de distribuição muito automatizada em todo o País, enquanto nós ainda exploramos muito o diferencial do contato direto com distribuidores."
A Brasil Kirin também está investindo na atuação regional, onde consegue melhores resultados. Para Thiago Torelli, da Kantar, as indústrias de bebidas têm optado disputar mercados mais específicos, como os regionais, para avançar no País.
"As empresas estão escolhendo algumas guerras. Como a marca Schin é mais forte no Nordeste, vemos a Brasil Kirin direcionando mais investimentos lá. Já a Kaiser [da Heineken] é mais forte no Sul, então recebe mais investimentos lá para brigar com os rótulos de Ambev e Petrópolis", destacou Torelli.
A Brasil Kirin anunciou recentemente mudança na embalagem e aportes no marketing da cerveja No Grau, vendida nas regiões Norte e Nordeste. "Enxergamos a chance de ampliar a nossa participação com essas novas ações para a No Grau, que já registra um bom desempenho nessas regiões", disse a gerente de marketing da Brasil Kirin, Gabriela Pamplona Ianelli. A No Grau é o rótulo de combate da Kirin na região para o segmento de menor preço (econômico).
Veículo: Jornal DCI