Depois da morte de seu presidente Ângelo Salton Neto, a família se une para levar a empresa adiante e anuncia a nomeação de Daniel Salton para o cargo
A mesa ainda está lá. Os papéis de fax amontoados à espera de serem lidos, o computador desligado e os quadros de vinho pregados na parede permanecem intocados. Nem parece que Ângelo Salton Neto, o homem que liderou e ajudou a transformar a vinícola Salton em uma produtora de vinhos premium, se foi. "Venho trabalhar todos os dias e sinto como se ele estivesse aqui", diz Luciana Salton, herdeira de Ângelo e coordenadora de marketing da empresa, com a voz engasgada e os olhos marejados. Ângelo morreu de infarto, aos 56 anos, no dia 10 de fevereiro. De uma hora para outra, o executivo de personalidade afável deixou a empresa órfã. "É impossível substituir o Ângelo. Ele era muito carismático, para isso tem de mobilizar a equipe toda", diz Arthur Azevedo, diretor da Associação Brasileira de Sommeliers. A empresa que faturou R$ 180 milhões no ano passado, porém, não pode parar. Logo depois da morte do executivo, Antônio Salton, membro da família, assumiu interinamente e, apesar do recente trauma, o conselho acaba de anunciar Daniel Salton, primo de Ângelo e diretor comercial da empresa, como o novo presidente. "É um momento de dor, mas temos de levar o nome da vinícola adiante", disse Daniel à DINHEIRO.
Ângelo era para a Salton o que o comandante Rolim Amaro, que morreu em 2001, era para a TAM. "As empresas devem estar preparadas para momentos como esse", diz Heloísa Bedicks, diretora-executiva do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). "As sucessões devem ser planejadas, mesmo quando o executivo é novo." Ângelo, de certa forma, estava arando o terreno para que a quarta geração dos Salton assumisse a companhia. Além dos sobrinhos, trabalham na vinícola suas duas filhas, Luciana, de 27 anos, no marketing, e Stella, de 25 anos, na comunicação. As duas herdaram do pai a simpatia e o modo amigável de conversar com as pessoas - como se esse comportamento viesse impregnado no DNA. "Muitas vezes ele me perguntava se eu já havia falado com os clientes e eu dizia que havia respondido ao e-mail", diz Stella. "Ele rebatia dizendo que era para ligar e conversar com a pessoa." O contato pessoal era a alma do negócio.
Luciana também revela uma passagem curiosa com o pai. Certa vez, o dono de uma empresa de publicidade ligou para a Salton querendo vender espaço na placa de propaganda que estaria no jogo da Seleção Brasileira. "Eu quis fechar o negócio rápido e o meu pai pediu para esperar. Ele demorou para responder até que o publicitário ligou aceitando o que o meu pai queria pagar", diz Luciana. Não deu tempo de Ângelo terminar de preparar suas herdeiras para o comando, mas foi o suficiente para transmitir sua humildade. "A escolha do Daniel para a presidência foi muito sábia", diz Luciana. Daniel, de 55 anos, começou a trabalhar na Salton aos 15 anos pesando caixas de uva e, ao longo dos últimos 40 anos, passou por todas as áreas da empresa.
Baseado em Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul, ele imprimirá um novo ritmo para a vinícola. Sua meta é fazer a empresa, dona de rótulos premium como o vinho Talento e de 40% do mercado nacional de espumantes, faturar R$ 200 milhões em 2009. A força da Salton será posta à prova novamente. É que no fim dos anos 90 quase 99% do faturamento da empresa vinha dos populares Chalise e Conhaque Presidente. Em uma década, a Salton, que completará 100 anos em 2010, investiu mais de R$ 50 milhões em melhorias técnicas e hoje suas receitas são diversificadas: 35% vêm do conhaque, 29% de espumantes, 21% de vinhos finos e 5% de sucos. "Meu pai sempre dizia que pegaríamos a empresa melhor do que ele pegou", conta Luciana. Infelizmente, chegou a hora.
Veículo: Revista Isto É Dinheiro