Magos da cerveja

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O mercado nacional de microcervejarias está em expansão. A Brasil Brau, feira realizada no mês passado em São Paulo, e que reuniu cervejeiros do Brasil e de outros países mostrou o quanto essa indústria está crescendo e gerando novas oportunidades de carreiras, entre elas uma muito especial e que requer doses iguais de preparo e talento: a de mestre cervejeiro, que é o responsável pela criação de um novo sabor e aroma de uma cerveja. Um mercado que, inclusive, vem atraindo o paladar delicado e o apreço pelos detalhes das mulheres.

 

Rodrigo Silveira é mestre cervejeiro da microcervejaria Colorado, de Ribeirão Preto (SP), há dez anos. Começou na empresa fazendo engenharia de produção e ali se apaixonou pelos mistérios da bebida, especializando-se na área. O passo inicial foi um curso no Senai de cervejeiro, seguido por outros fora do País.

 

"Trabalho com Marcelo Carneiro da Rocha, dono da Colorado, e que também é um apaixonado por cervejas e sempre me lança o desafio de fazer uma nova cerveja e desenvolver novos produtos para cervejaria. Já fizemos cerveja com lúpulo e rapadura branca, com 7% de teor alcoólico; de mandioca, com teor alcóolico de 4,5%; de mel de abelhas africanizadas e européias, com 5,5% de álcool; a de café da região da Alta Mogiana, que ganhou o 1º lugar na categoria Porter do concurso European Beer Star 2008, em Nuremberg, na Alemanha e Cerveja do Ano de 2008, no ranking da revista Prazeres da mesa", diz Silveira.

 

O empresário informa ainda o lançamento, ainda este ano, da cerveja feita de rapadura preta, que terá 10,5% álcool e 65 de BU, que é uma unidade de medida de amargor, indicando que o produto terá cinco vezes mais de amargor do que uma pilsen, o tipo mais consumido.

 

Segundo Silveira, há 14 anos o consumidor brasileiro não tinha ideia do que era uma cerveja um pouco lupulada, ou turva, não filtrada, como a Weissbeer, o que exigiu esforço concentrado para explicar ao consumidor aquele outro estilo de uma bebida tão popular. "Hoje, já conquistamos um grande público e eu vejo um crescimento em todas as microcervejarias do Brasil. Este é um mercado que só tende a crescer. Em conversas particulares com outros profissionais da área, sei que surgem cervejarias todo mês, especialmente em Minas Gerais e no Rio Grande do Sul. Além disso, percebo, pelos meus clientes, que eles querem novas cervejas, por isso, acho uma boa oportunidade para uma carreira", avalia.

 

Quanto à hipótese de saturação de microcervejarias no Brasil, Silveira comenta que o risco não existe. "Hoje em dia o Brasil tem um pouco mais de 200 empresas, enquanto os Estados Unidos têm cerca de 2 mil. O País tem capacidade para ter mais de 3 mil microempresas do gênero. Entretanto, é bom acentuar que a carreira de um cervejeiro é difícil. É preciso estar sempre atualizado, até porque as mudanças são constantes no mundo da cerveja. A atividade exige alto grau de especialização e cursos de Engenharia Química ou de Produção", recomenda.

 

Seguindo essa mesma linha de produção de cervejas diferenciadas, a Bamberg Bier, de Votorantim, São Paulo, é a única no País a produzir o sabor Alt, que significa antigo em alemão. A inovação veio, é claro, do mestre cervejeiro da empresa, Alexandre Bazzo, formado em Engenharia de Alimentos, mas que, durante a faculdade, já trabalhava com fermentação e fez estágios em algumas indústrias de álcool antes de começar a trabalhar com cerveja.

 

O sabor Alt refere-se a uma cerveja tradicional da cidade alemã de Dusseldorf. Marrom avermelhada, de alta fermentação e bem amarga, agrega uma grande complexidade de sabores.
"Depois que me formei, há dez anos, passei um tempo na Alemanha e lá pude ver a grande quantidade de cerveja na prateleira de um supermercado local, enquanto aqui só havia sete marcas no mercado, todas do tipo pilsen. Foi então que comecei a ter contato com algumas microempresas no Sul do Brasil, que estavam surgindo, e comecei a aprender a ser cervejeiro", resume. "O cervejeiro é um engenheiro. Ao formular uma receita, usamos cálculos matemáticos na busca da cor, amargor, carbonatação, percentual de álcool e todas estas variáveis que determinam um estilo de cerveja. Devemos controlar o PH, a pressão do tanque, saber sobre bombas, troca térmica e outros detalhes que vão somando-se para no final do processo fazer a diferença", diz.

 

Segundo a consultora do Laboratório de Analise e Pesquisa e Consultoria em Alimentos e Bebidas (LABM), Amazile Biagioni, o mercado de bebida em geral no Brasil está em expansão. "O setor de cerveja está passando por um crescimento e está sendo estimulado, abrindo novas oportunidades profissionais", alerta.

 

As duas mestras brasileiras

 

Apesar de ser um mercado dominado pelo público masculino, no Brasil existem duas mulheres formadas em mestres cervejeiras. Cilene Saorin se formou na Espanha, na Universidad Politécnica de Madrid - Escuela Superior de Cerveza y Malta e em beer sommelier, com graduação na Alemanha pela Doemens Akademie. Com 16 anos de experiência profissional, Cilene trabalhou para a Brahma, Petrópolis, Antarctica e AmBev no Brasil e, ainda, na FlavorActiV, na Inglaterra, empresa da área de gestão da qualidade sensorial de cervejas.

 

Hoje, ela trabalha em consultoria como mestre cervejeira, no desenvolvimento de produtos e mercados e gestão sensorial, e como beer sommelier em eventos de degustação e harmonização.
"Desde que comecei até agora, notei um crescimento no número de profissionais, devido ao aumento do mercado de cervejas no Brasil e ao volume de produção, que aumentou, impulsionado pela maior demanda. O que aumentou também foi o número de mulheres como mestre cervejeiras no mundo em geral. Eu era uma das poucas e aqui do Brasil só há duas. Quando comecei me inspirei em pouquíssimas mulheres, cujo trabalho eu acompanhava", conta Cilene.

 

A segunda figura feminina nesta cena é a cervejeira Kátia Jorge, responsável cerveja caseira do restaurante Gattopardo, no Rio de Janeiro. Ela trabalha no segmento há 23 anos. "Essa área de atuação para mulheres mudou bastante, mas permanece difícil porque se trata de um segmento ainda muito masculino", diz.

 

Kátia estudou Química em Berlim, na Alemanha, acompanhando o marido que foi fazer um curso de cervejaria. "Eu saía da minha aula e ia assistir as aulas dele. Comecei, então, a achar aquilo interessante. Quando eu vi, já estava fazendo o curso dele e abandonei o meu. Voltei para o Brasil e o primeiro emprego que consegui foi na Brahma, na área de pesquisa. Nas verdade, queria mesmo era atuar como cervejeira, mas eu era química", ressalta.

 

Kátia conta que trabalhou na Brahma desenvolvendo refrigerante na área de pesquisa. Ficou sete anos na empresa, exerceu função como consultora, fez mestrado na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) focado em cervejaria, tudo custeado pela Brahma. Ao terminar o mestrado, a cervejeira já estava trabalhando por conta própria. "Eu e meu marido, que já era ex, trabalhamos juntos por mais sete anos montando hidrocervejaria em vários lugares, como Manaus, Blumenau, São Paulo e Piauí", relata.

 

De acordo com Kátia, o momento é propício para ingressar na profissão de cervejeiro. Ela argumenta que o mercado está amadurecendo. "É um bom negócio também montar o próprio bar. E essa parte da microcervejaria é o que vai alavancar. Temos cultura cervejeira, só não tínhamos cultura além da pilsen. Para quem deseja entrar nesse mercado recomendo consultar sites de cervejarias, de microcervejarias, e depois tentar um estágio numa empresa pequena, ou fazer curso no Senai, em Vassouras, no Rio de Janeiro", finaliza

 

Veículo: Jornal do Commercio - RJ


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