Varejistas procuram espantar "enochatos"

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No começo da década de 1990, o consumo de vinhos se restringia, praticamente, a um pequeno público de maior poder aquisitivo e nível de informação. Os varejistas imaginavam os apreciadores de vinho como degustadores de alto nível que sabiam diferenciar com exatidão os tipos de uvas e as safras, bem como seus mais ínfimos impactos no sabor e no aroma da bebida. Assim foi até que vinhos menos "tradicionais" que os alemães, franceses e italianos - como os chilenos e argentinos - invadissem os supermercados com seus preços mais acessíveis e conquistassem adeptos que não estavam interessados no que os puristas da enologia (que passaram a ser apelidados de "enochatos") pregavam como evangelho.

 

Em pesquisa recente, o Instituto Brasileiro do Vinho revelou que os brasileiros estão cada vez mais interessados em vinhos de melhor qualidade a bom preço. Também ficou constatado que o consumo brasileiro da bebida está mais elevado - 350 milhões de litros por ano. A previsão é de 13% de aumento para 2010-2011. Como não podia deixar de ser, atentos às mudanças de hábito dos consumidores, lojistas e importadoras desse segmento começaram a colocar em prática estratégias para desmistificar a visão dos clientes em relação ao produto.

 

O restaurante, delicatessen e adega Apreciatti, inaugurado em 2008 no Shopping Tijuca, tem sua culinária focada na tradicional gastronomia italiana. Possui uma adega climatizada com mais 800 rótulos e 4,2 mil garrafas de vinhos. Dentre esses, 70% são tintos, 10% brancos e rosés, 10% espumantes e 10% fortificados. A gerente do restaurante, Andrea Bruno, explica que a média de consumo mensal dos últimos seis meses foi de 2.240 garrafas, sendo que 45% foram consumidas no restaurante e 55% levadas para casa. Os que mais vendem na loja são vinhos entre R$ 30 e R$ 50

 

Acesso. "Ajudou muito o fato de os supermercados começarem a vender vinhos chilenos e argentinos mais baratos. Assim, o produto acabou ficando mais acessível. Hoje, conseguimos comprar vinho importado por R$ 15. Junto a isso, começaram a chegar as uvas diferentes, que não existiam no Brasil, o que despertou cada vez mais a curiosidade das pessoas", conta.

 

Andrea, que trabalha há 20 anos nesse mercado, diz que o cliente vem à loja sedento também por informação. Pensando nisso, a loja investiu em estratégias como degustação e jantares harmonizados. "Na degustação, oferecemos de três a quatro vinhos diferentes, incluindo vinho de sobremesa, que é mais doce. Explicamos o básico para os clientes. Não adianta ser nada muito profundo, porque esses consumidores estão começando a se interessar", afirma.

 

As importadoras, cada vez mais, acumulam funções. Exemplo disso é recém inaugurada Confraria Carioca, que é importadora, distribuidora e loja para atender ao consumidor final. O dono é o empresário, consultor e membro da Associação Brasileira de Sommeliers (ABS) e da Sociedade Brasileira dos Amigos do Vinho (SBAV), Duda Zagari, que afirma ter como principal objetivo atrair a cada dia novos apreciadores.

 

"Queremos oferecer os benefícios do vinho, que evoca cultura, saúde e amizade, ao maior número de pessoas, sem importar conhecimento, idade, sexo, raça ou condição social", diz.

 

O vinho conquistou um espaço considerável no Brasil, de acordo com Zagari. "Há 10 anos, em qualquer restaurante no Rio, a bebida mais consumida era chope ou uísque. Hoje, não importa o nível do restaurante, sempre tem muitas opções na carta de vinhos. O Rio, por ter sido sede da Coroa Portuguesa, e pelo contato com a cultura daquele país, tem uma tendência ao vinho português. Já em São Paulo, pela colônia italiana, tem mais predileção por vinhos italianos", analisa.

 

A World Wine, uma das três maiores importadoras de vinhos do Brasil, tem cerca de 1,2 mil rótulos safrados de mais de 70 produtores exclusivos de 14 países, como França, Itália, Chile, Argentina, Portugal, Espanha, Alemanha e Hungria. A empresa, criada em 2000, atende os clientes finais, ou seja, loja de vinhos, hotéis e restaurantes. Foi criada pelo empresário Celso La Pastina, herdeiro da tradição da família La Pastina, que atua no Brasil há 60 anos no setor de bebidas e alimentos finos.

 

Segundo o gerente nacional de Vendas da empresa, Matthieu Peluchon, o consumo de vinhos vem aumentando. Nos últimos cinco anos, diz ele, houve crescimento de 10% na importação. "O Brasil consome cerca de cinco milhões de garrafas por ano. Desse total, 70% são importadas; dentro desse percentual, 40% são argentinos e chilenos", explica.

 

A importação também incentivou a melhoria na qualidade do vinho brasileiro. Seu consumo, dizem os especialistas, só não ultrapassa o dos argentinos e chilenos devido ao preço, mais elevado por causa dos impostos. Há dez anos, os mais requisitados eram os italianos e alemães. No fim dos anos 1980, a Alemanha exportava dois milhões de garrafas de vinho branco, sua especialidade, para o Brasil. Era o tipo mais apreciado pelos brasileiros.

 

Diferenças regionais. "O consumo varia de acordo com a localização. A Região Sudeste é a que mais consome. São Paulo é onde fazemos 70% das nossas vendas. Até 2002, o importador também distribuía, e tínhamos 20 mil consumidores diretamente da importadora", afirma Peluchon.

 

A World Wine importa em sua maioria, 70%, vinhos europeus, por atender um público que prefere pagar um pouco mais caro e poder degustar vinhos mais refinados, com tipos específicos de uvas. "Este ano, tivemos crescimento de 30% em relação ao ano passado. As afirmações dos médicos sobre os benefícios do vinho para a saúde favoreceram muito o mercado", explica.

 

O mesmo argumento é usado pelo gerente da loja Lidador no Botafogo Praia Shopping, Sérgio Lima. Funcionário da tradicional casa de comidas e bebidas finas há mais de 20 anos, ele afirma que a procura pela bebida aumenta a cada dia, e uma das principais razões é a divulgação constante dos benefícios que o consumo moderado de vinho traz para a saúde.

 

O aumento de clientes em busca do produto estimulou a loja a convidar clientes, por meio do banco de dados ou quando visitam a loja, para participar de degustações gratuitas. São oferecidas cinco degustações por semana no bar dentro da loja. A cada dia, um sommelier de vinícola ou enólogo vai até lá no horário pré-agendado, transmitir informações sobre a bebida. No futuro, a loja pretende realizar um curso básico, de 15 aulas, ministrado por um sommelier

 

Sérgio Lima diz que é preciso investir em estratégias. Eventos realizados na loja aproximam o cliente do vendedor, o que gera confiança. "Isso é muito importante porque cativa e faz com que a pessoa volte e peça sua opinião sobre qual vinho comprar. Esse ano, tivemos um crescimento de 10% em relação ao ano passado. Esperamos subir mais ano que vem", afirma.

 

Veículo: Jornal do Commercio - RJ


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