Cresce a produção de peixe em hidrelétrica

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Criação em cativeiros no mar e nos lagos de usinas já representa 1/3 de todo o pescado

 


Além da eletricidade, as represas das usinas hidrelétricas estão gerando um subproduto: pescados em cativeiro. Mais exatamente, tilápias, também conhecidas como Saint Peter''s fish, o peixe de São Pedro, por supostamente terem sido objetos do milagre da multiplicação.

 

A aposta do governo é que, no médio prazo, esses reservatórios se convertam numa nova fronteira de produção de alimentos no País, como ocorreu no cerrado nos anos 1970.

 

A pesca extrativa atingiu seu limite no mundo inteiro e a aquicultura é a alternativa para garantir o abastecimento. Atualmente, metade do pescado consumido no mundo vem de criatórios. No Brasil, a aquicultura em mar e represas responde por 33% da produção, que está na casa de 1,2 milhão de toneladas.

 

Pequenos produtores e empresas de médio porte já exploram as águas de usinas como Itaipu (PR), Furnas (MG), Três Marias (MG), Ilha Solteira (SP) e Tucuruí (PA). Há, porém, investidores de porte de países como China, Noruega e Chile atentos ao potencial do País.

 

"Se a gente quisesse, era estalar os dedos e teríamos investimentos estrangeiros fortes em aquicultura", disse ao Estado Felipe Matias, secretário de Planejamento e Ordenamento da Aquicultura do Ministério da Pesca. "Mas não queremos expandir a produção de forma desordenada." Ele observou que, sem a devida cautela, há risco de as áreas de exploração nos reservatórios ficarem concentradas nos grandes produtores. "Aí, daqui a dez anos teríamos de fazer a "reforma aquária"." A estratégia do governo é, primeiro, mapear a capacidade produtiva das represas. Cerca de R$ 20 milhões estão sendo investidos nesses levantamentos, que vão mostrar onde poderão ser concedidas as licenças, de que tamanho e para produzir quanto. Nas áreas já estudadas, a ocupação vem sendo feita gradativamente. A maior parte das cerca de 4 mil concessões já oferecidas foi para pequenas famílias.

 

O primeiro edital convidando empresários de médio porte a explorar os reservatórios das hidrelétricas será lançado esta semana, dando oportunidade a empresas que atualmente já produzem regularizarem sua situação. Em Ilha Solteira estão duas áreas da GeneSeas, que comercializa sob a marca Tilly. Ambas estão em processo de legalização, segundo informou Tito Livio Capobianco. Ele pretende implantar uma terceira área de engorda na mesma represa. A GeneSeas abateu 5 mil toneladas de peixes em 2009, 30% a mais do que no ano anterior. Um quarto da produção foi exportada.

 

No reservatório da hidrelétrica de Itaparica (PE), a empresa espanhola Pescanova produz tilápias em caráter experimental, segundo informou Elias Cordeiro, diretor técnico da subsidiária no Brasil. Ela tem planos de investir R$ 60 milhões em duas novas áreas em Furnas e Três Marias, que vão ser oferecidas em licitação nos próximos meses.

 

Também em Pernambuco, a Netuno abateu 8 mil toneladas de tilápias no ano passado, dos quais 5% foram para a França e os Estados Unidos. "A exportação é pequena porque o dólar não é favorável, mas queremos manter a porta aberta", disse o vice-presidente da empresa, Hugo Campos Bahamondes. Há planos de expandir a produção a 60 mil toneladas até 2016. A Netuno tem áreas de engorda em Itaparica e em Moxotó (PE) e uma fábrica de processamento em Paulo Afonso (BA).

 

Mão amiga

 

Para Matias, do Ministério da Pesca, a transferência tecnológica é fundamental para os estrangeiros pretendentes a aquicultores no País. "Os chineses têm mil anos de experiência. Temos 30."

 


Tilápias pululam na ilha solteira

 


As águas limpas do Rio Paraná significam economia e lucro para a GeneSeas, empresa que mantém uma unidade de engorda de tilápias no reservatório de Ilha Solteira, em Santa Fé do Sul (SP), na divisa de São Paulo com Mato Grosso do Sul. Em 2009, a GeneSeas transferiu para Santa Fé os 320 tanques-redes que possuía no rio Tietê, no lago da hidrelétrica de Avanhandava, em Buritama. A transferência fez a empresa reduzir custos e aumentar os índices de produtividade.

 

Com a mudança, a GeneSeas - que já possuía desde 2007 outros 300 tanques no rio Paraná - passou a contar com 620 tanques, dobrando sua capacidade de produção. Cada tanque, de 20 mil litros de água, recebe 8 mil alevinos e 2,5 mil peixes adultos. Os tanques ficam submersos, o que facilita o trabalho de alimentação com ração pronta. Desde o momento em que chegam como alevinos de 50 dias até quando saem para o abate, os peixes ficam na fazenda por cerca de seis meses. Atualmente, a produção total é de 240 toneladas por mês.

 

Para retirar os peixes adultos, a chamada despesca, os tanques são levados a cerca de 200 metros da margem, numa balsa. Lá, os peixes são retirados dos tanques e colocados em sacolas de borracha, que são levadas por trilhos suspensos até caminhões-tanques estacionados na margem do rio. Quando a sacola chega, funcionários despejam os peixes dentro dos tanques dos caminhões que transportam os peixes para o frigorífico da GeneSeas, em Promissão (SP), onde são abatidos. De lá, já cortado ou congelado, o peixe segue para São Paulo e para o exterior.

 

"Buscamos água mais limpa, porque queríamos dar melhor qualidade ao nosso produto", diz o engenheiro de produção da GeneSeas, Eduardo Yago Yamashita. Em comparação com a água do rio Tietê, a do Paraná é bem mais limpa e melhor para a criação e engorda. "No Tietê, os peixes eram obrigados a passar por processo de depuração antes de serem abatidos no frigorífico", diz Yamashita.

 

 

Margem de lucro de produtor oscila entre 80% e 100%

 


Se os planos de expansão da aquicultura forem adiante, tendência é de que só os profissionais se mantenham na atividade

 

No sertão do Ceará, as tilápias criadas no açude do Castanhão proporcionam uma renda média de R$ 1.000,00 a cada uma das 60 famílias que se dedicam à criação. São pessoas que moravam na área que foi alagada. "É uma renda muito boa para a região", comentou o engenheiro de pesca Osvaldo Segundo da Costa Filho, da Secretaria de Desenvolvimento Agrário do Estado. A produção é pequena: 600 toneladas ao ano, a maior parte comercializada in natura, "na porteira".

 


O custo de produção de um quilo de tilápia é de R$ 2,30 a R$ 2,50, enquanto o quilo do peixe é vendido por R$ 4,50 a R$ 5,00, informou o secretário de Planejamento e Ordenamento da Aquicultura do Ministério da Pesca, Felipe Matias. "Qual é o produto agrícola que tem margem de lucro de 80%, 100%? Não tem." Se os planos do governo se concretizarem e a produção de fato aumentar, a tendência é o preço baixar. "Aí, vão ficar só os profissionais", comentou.

 

As 140 pessoas que criam peixes na represa da hidrelétrica de Três Marias (MG) conseguem uma renda um pouco menor, cerca de um salário mínimo ao mês. Também lá, os peixes são comercializados na própria região.

 

Embora lucrativa, a criação de peixes não é simples. "Não dá para ver a tilápia o tempo todo, como se faz com galinhas ou porcos", disse o diretor-presidente da GeneSeas, Tito Livio Capobianco, que preside a Associação Brasileira da Indústria de Processamento da Tilápia (AB Tilápia). "Quando dá algum problema, é mais difícil de detectar." O empresário José Roberto Sales, integrante da associação Piscis, que congrega 40 pequenos criadores de tilápias na represa de Ilha Solteira (SP), concorda. ''Não adianta o governo dar uma área para um pequeno produtor e largá-lo, não vai dar certo", afirmou. "É preciso saber dar ração, e a ração custa caro. O negócio todo exige investimentos e não é simples administrá-lo." A Piscis conta com veterinário e gerente, e todo o lucro obtido em seus três anos de existência foi reinvestido.

 

Hoje a empresa tem uma pequena fábrica que produz filés de tilápia, vendidos a frigoríficos, para merenda escolar e para supermercados.

 


Veículo: O Estado de S.Paulo


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