Choitsu e Katsumi Abe trabalham pesado diariamente para livrar a enseada de Minamisanriku dos detritos deixados pelo tsunami que atingiu a porção nordeste do Japão em março, para que eles possam iniciar o cultivo de vieiras e algas novamente.
Mesmo antes do desastre, eles estavam longe de ser uma empresa familiar lucrativa. O retorno proporcionado pela aquicultura é tão escasso que o filho, Choki, não pôde entrar no negócio. Mas o casal, já na casa dos 70 anos, precisa do dinheiro para complementar suas aposentadorias, insuficientes para viver. "Se não limparmos o mar não podemos cultivar, e nossas aposentadorias não são suficientes", diz a esposa. "Não temos economias".
A família Abe não está sozinha nesta condição. Seis meses após o mais fatal desastre ocorrido no Japão desde a Segunda Guerra, muitos no setor de pesca, uma das principais indústrias do nordeste do país, enfrentam a reconstrução de empresas que já não eram rentáveis. "Se houvesse uma forma de trabalhar no mar que permitisse maiores volumes de produção, poderia valer a pena", diz Choki. O barco turístico que ele operava para um hotel local foi engolido pelo tsunami e ele também não tem economias, por isso está ansioso sobre o seu futuro.
A revitalização da indústria de pescado na região é importante porque as sete prefeituras costeiras mais prejudicadas pelo tsunami respondem entre 40% e 55% da produção total de pescados e aquicultura do país, de acordo com dados do Ministério da Agricultura. E o governo japonês está interessado em aumentar sua autossufiência alimentar, assim como construir uma marca para exportar alimentos de qualidade. Antes do tsunami, o casal Abe havia começado a exportar pequenas quantidades de frutos do mar, mas eles não sabem se terão outra chance.
Especialistas dizem que o desastre de 11 de março pode ser o catalisador para a região se reinventar, acompanhando as indústria da pesca e agricultura.
"Essa é uma oportunidade para desenvolver uma indústria eficiente e isso requer que setor privado crie uma indústria primária competitiva e uma "marca japonesa" para exportação, diz Chiharu Fujita, especialista em planos de continuidade de negócios da consultoria CFRMC, sediada em Tóquio.
Mas o perigo é a região simplesmente retornar a uma versão menor de si mesma, diz Fujita. Já um lugar esquecido, contribuindo com apenas 4% da economia, o nordeste do país precisa de uma reinvenção das indústrias existentes e a introdução de outras completamente novas para incentivar as gerações mais novas, impulsionadas pela migração anual para Tóquio, a ficar.
O governo tem uma proposta ampla para introduzir novos negócios, tais como energia renovável. E também planeja reconstruir a indústria de pescado da região, para torná-la mais eficiente e introduzir pescadores com conhecimento técnico nas empresas. Entretanto, muitas autoridades locais ainda precisam iniciar a execução dos planos de reconstrução, diz o ministério.
Em Miyagi, prefeitura onde está localizada a vila de Minamisanriku, o sindicato que administra a produção e lida com a grande maioria das vendas de frutos dos mar da prefeitura diz que ainda tenta reparar os danos que sofreu antes de executar as medidas de reconstrução.
As empresas de pescado terão acesso a empréstimos de longo prazo, concedidos por sindicatos e governo, para reconstruir. A orientação e o treinamento em gestão será vital, já que poderá ajudar as famílias a retomar as empresas de pescado de maneira mais rentável, ou mesmo considerar deixar a pesca e começar algo novo.
Oki Matsumoto, um dos mais conhecidos empresários do Japão e que fundou a maior corretora de varejo on-line, diz que o nordeste precisa de uma abordagem mais empresarial para reviver a pesca e a indústria da região em geral e que deveria incentivar o investimento estrangeiro ao invés de depender de empréstimos e outras formas de dívida para a reconstrução. "Nós deveríamos tentar criar alguma coisa em Tohoku que dê retorno. Uma fábrica de pescados completamente nova, usando tecnologia norueguesa, por exemplo", diz Matsumoto. "Não importa o que aconteça, primeiro pensamos em tomar dinheiro emprestado".
Choki Abe, por exemplo, está interessado em montar seu próprio negócio, mas diz que não tem o know-how e o dinheiro para tal. "Não tenho nem mesmo mil ienes em meu nome", diz. "Você conhece alguém que pode me ensinar?"
Veículo: Valor Econômico