Setor de carne agora defende TAC 'nacional' para Amazônia

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A indústria brasileira de carne bovina dá indícios de uma mudança importante de postura. Às voltas com questões jurídicas, o setor se mobiliza para costurar um compromisso único de defesa da Amazônia, traduzido em um futuro acordo com a Justiça de não comprar animais para abate de áreas com problemas ambientais e trabalhistas.

Até hoje, tem funcionado assim: pego em flagra por aceitar bois de áreas desmatadas, o frigorífico firma um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) com o Ministério Público Federal e tenta resolver o problema. A questão é que esses TACs, de forma individual, não conseguem salvar a floresta e ainda promovem o que o setor chama de "competição desleal" entre as indústrias.

"Se um frigorífico não compra de um fornecedor que não faz a coisa certa, outro vai lá e pega [os bois] ", afirma Antônio Camardelli, presidente da Associação Brasileira da Indústria Exportadora de Carnes (Abiec).

Sinal disso veio com um relatório da JBS, maior empresa de carne bovina do mundo, apresentado no mês passado ao MPF. O documento afirma que a empresa rejeitou desde o início do ano passado dois milhões de bois para o abate por serem de áreas de conservação ambiental, terras indígenas e fazendas que usam trabalho análogo à escravidão.

Segundo o relatório entregue à Justiça, 3.864 propriedades rurais no Mato Grosso e Amazonas enquadram-se nesses casos. Do total, 2.217 fazendas se encontram em áreas embargadas pelo Ibama, 81 criam gado em área de desmatamento e 1.127 ocupam unidades de conservação. "Diante das irregularidades, a JBS evitou adquirir o gado, mas verificou que os animais foram vendidos a outros frigorífico", fez questão de salientar a empresa, que tem capital aberto na bolsa.

A necessidade de firmar tantos acordos, cada qual com a sua peculiaridade, tornou-se uma dor de cabeça jurídica para os frigoríficos. Além de consumir tempo e recursos humanos, ainda arranha a imagem da empresa. Somente no Pará, as indústrias de carnes somam cerca de 38 TACs, incluindo indústrias de pequeno, médio e grande porte. No Acre, foram firmados 14. No Mato Grosso, outros três acordos.

"Não faz sentido cumprir uma coisa em um Estado e em outro não", diz o procurador do Pará, Daniel Azeredo Avelino, que há pelo menos dois anos defende a necessidade de um compromisso nacional do setor de carnes. "As indústrias nunca toparam. Mas acho que agora perceberam que este é um processo irreversível. O próximo passo é eles fazerem uma proposta ao MPF".

A ideia de unificação de prazos de execução, e que obriga todos a seguir as mesmas regras, foi apresentada pela Abiec no dia 11 de novembro, durante reunião da indústria com os representantes do MPF da Amazônia, em Brasília. Participaram do encontro procuradores do Pará, Rondônia, Acre, Mato Grosso e Amazonas, além da Abiec, Uniec (União Nacional da Indústria e Empresas de Carne), Abeg (Associação Brasileira de Exportadores de Gado), e a própria JBS, alvo de acusação recente do MPF do Mato Grosso.

Nada de concreto existe ainda sobre a mesa. Até o momento, está tudo no plano das intenções. Mas a Abiec e outros parceiros dizem acreditar nesse caminho.

"Nós fomos ousados ao assinar todos os TACs, mas o concorrente não assina. Por isso, essa carne tá indo para o varejo", diz Francisco de Assis Silva, diretor jurídico da JBS. "E isso provoca uma desvantagem econômica brutal para um setor que já opera com ociosidade. Porque eu não compro carne [ilegal], mas o concorrente compra". Ele diz não saber se a carne que vai para a concorrência é vendida a preço mais baixo.

"É uma ideia ótima. Tomara que seja um sinal de que o setor está entendo que essa exigência do mercado chegou para ficar", diz Márcio Astrini, da campanha Amazônia do Greenpeace.

O mais difícil, avaliam fontes do mercado, será trazer para a negociação pequenos e médios frigoríficos, que tendem a ser menos pressionados e visados que os grandes frigoríficos.


Veículo: Valor Econômico


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