Depois de sofrer na primeira metade do ano com a conjunção entre estoques elevados e preços em baixa, os frigoríficos de aves e suínos devem enfrentar um segundo semestre ainda mais turbulento. Com a disparada das cotações de milho e soja nas últimas semanas, as empresas do setor já trabalham com margens negativas nas operações de suínos e em cortes simples de carne de frango.
"O desespero bateu. As margens estão achatadíssimas para a agroindústria e o produtor", afirmou Valor o presidente da cooperativa catarinense Coopercentral Aurora, Mário Lanznaster, uma das maiores produtoras de frangos e suínos do país.
Responsável por cerca de 70% dos custos de produção de aves e suínos, a ração saltou mais de 30% nos últimos dois meses, para R$ 0,80 o quilo em Santa Catarina, segundo Lanznaster. A situação se agravou nas últimas semanas, com a aceleração da alta do farelo de soja e a reversão da tendência de baixa do milho. Juntos, os dois produtos são responsáveis por 85% da ração.
No caso do farelo de soja, o contexto que já era dramático por conta da forte quebra da safra brasileira da oleaginosa, ganhou contornos ainda mais negativos com a piora das condições climáticas nos Estados Unidos, que derrubou a produtividade do grão no país. Segundo Lanznaster, o preço do farelo praticamente dobrou nos últimos 40 dias, passando de R$ 0,60 para R$ 1,10 por quilo. "Mesmo com a quebra de safra nacional, o país continuou exportando".
E nem mesmo o milho, que impediu uma alta maior dos custos de produção no primeiro semestre, deve ajudar. No acumulado do ano, o indicador Esalq/BM&FBovespa para o milho registra uma queda de 14,4%, influenciado pela safra recorde do grão no Brasil. "Com a seca nos EUA, a saca já voltou para R$ 28", afirma o presidente da Coopercentral Aurora.
Para enfrentar a situação, uma das alternativas seria repassar a alta dos custos de produção para o consumidor, tarefa particularmente difícil num contexto de retração das cotações de sua principal concorrente, a carne bovina. "As carnes de frango e suína sempre vêm ancoradas no preço da carne bovina, que é sem dúvida a preferida do consumidor", afirma Ariovaldo Zani, vice-presidente executivo do Sindicato Nacional da Indústria de Alimentação Animal (Sindirações).
Com a dificuldade em repassar preços, os frigoríficos de aves e suínos dificilmente conseguirão boa rentabilidade. No caso da carne de frango, diz Lanznaster, apenas os cortes mais nobres, como coxa, sobrecoxa e peito, trazem alguma rentabilidade. "Ainda assim, de apenas 1% a 2%", diz ele. Para os cortes mais simples, acrescenta o executivo, o setor trabalha sem margem, enquanto que as vendas de frango inteiro acumulam um retorno negativo de até 10%.
Para o produtor de suínos, a situação permanece bastante delicada. O custo de produção tornou-se oneroso demais (R$ 1,15 por quilo) quando comparado ao valor recebido de R$ 1,50, em média, por quilo do animal.
Segundo dados do indicador Cepea/Esalq, o poder de compra do suinocultor frente ao farelo de soja está em processo de corrosão. No acumulado de 2012, a redução foi de 58% para o produtor catarinense - o mais afetado pela crise. Em relação ao milho, a perda foi de 26% do poder de compra durante o ano. Por essa razão, os suinocultores têm se perguntado: até onde vai o limite da desvalorização do animal?
A Associação Brasileira de Criadores de Suínos (ABCS) calcula que o prejuízo do setor soma R$ 4 bilhões no país, sendo R$ 1 bilhão em Santa Catarina, onde mais de 70 municípios da região oeste - respondem por 25% da produção nacional - decretaram situação de emergência no começo da semana. "O preço mínimo não deveria ser inferior a R$ 2,57 por quilo", diz o presidente Valdecir Folador.
Ele acrescenta à alta no custo de produção, a exagerada oferta de animais que levou ao excedente de 120 mil toneladas de carnes no mercado. "Foram feitas projeções para atender mercados que ainda não aconteceram", diz, ao se referir aos possíveis embarques para China, EUA e Japão.
A crise na suinocultura levou o Ministério da Agricultura a formular um pacote de socorros ao setor, lançado hoje. Por meio dele, o governo vai promover o alongamento de dívidas que vencem este ano, além de criar novas linhas de financiamento. Além disso, outras linhas de crédito serão propostas para o produtor. A primeira será para a compra de leitões vivos, com R$ 200 milhões disponíveis e juros de 5,5% ao ano. Outra é para a retenção de matrizes, com R$ 1,2 milhão de teto por produtor, e prazo de pagamento em até dois anos com juros de 5,5% ao ano.
Está sendo analisada, também, a criação de uma linha de crédito individual para o suinocultor que se endividou fora do sistema financeiro e a inclusão da carne suína na Política de Garantia de Preços Mínimos (PGPM).
Veículo: Valor Econômico