BNDES ofereceu R$ 2,65 bi a frigoríficos entre 2007 e 2009
Cristina Amorim
A ONG Greenpeace acusou ontem o governo brasileiro de financiar e lucrar com o desmatamento da Amazônia. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) é sócio de empresas frigoríficas que, segundo a organização, têm como fornecedores fazendas que derrubaram floresta recentemente.
Entre 2007 e 2009, as cinco maiores empresas do setor, responsáveis por mais da metade das exportações brasileiras de carne, receberam US$ 2,6 bilhões do BNDES em troca de ações, aponta o grupo em relatório divulgado ontem, no qual investiga a cadeia de custódia da carne amazônica.
O banco, vinculado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, tem 27% de participação na Bertin; 14% na Marfrig e 14% da JBS-Friboi, os três maiores frigoríficos, afirma o coordenador do trabalho, André Muggiati. "O governo está lucrando com o desmatamento da Amazônia."
Em nota, a Bertin afirma que "tod os os seus fornecedores são legais e não constam nem da lista suja - do Ministério do Trabalho e Emprego que condena práticas semelhantes à escravidão - nem de lista embargada publicada pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis)". A Marfrig e a JBS-Friboi foram procuradas pela reportagem, mas não responderam.
Segundo Muggiati, "o sistema é culpado por vários motivos", entre eles a falta de fiscalização, aplicação e cobrança de multas.
REDE DE PRODUTOS
Os produtos bovinos da Amazônia vão para indústrias da China, Estados Unidos, Itália e Reino Unido, além de brasileiras, onde são usados na produção de comidas congeladas e refrigeradas, calçados, bolsas, cosméticos, estofamento para veículos e móveis.
Os consumidores não têm acesso a essa informação. "Eu não tenho como pegar um tênis e falar que ele foi feito com couro que vem de desmatament o ilegal. Mas também não tenho como dizer que não tem", explica Muggiati.
O Carrefour, citado na investigação, afirma que "os produtos que comercializa são provenientes de contratos que seguem rigidamente as formalidades legais exigidas pelas entidades reguladoras". O Grupo Pão de Açúcar "convocou seus fornecedores para esclarecimentos a respeito das alegações e irá tomar as medidas cabíveis para que se faça cumprir o compromisso firmado em contrato com seus fornecedores". O Wal-Mart "considera muito graves as acusações e vai cobrar imediatamente esclarecimentos das redes de frigoríficos".
O Greenpeace comparou o desenho das fazendas com dados de satélite de desmatamento recente. Mais de cem foram multados desde 2006.
A ONG não diferenciou o corte permitido por lei (até 20% da propriedade na Amazônia) do ilegal. "Para nós, um desmatamento de mil hectares é um escândalo, seja ele legal ou ilegal", diz Muggiati. Um hect are equivale a um campo de futebol, aproximadamente.
Segundo o Greenpeace, pelo menos uma fazenda que forneceu carne a frigoríficos está instalada ilegalmente na terra indígena Apyterewa, no Pará, onde moram cerca de 500 índios parakanã. Há cerca de 1.250 fazendas dentro da reserva, com 30 a 2.500 hectares.
Minc estuda cortar recursos
Felipe Werneck
O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, reagiu ontem à divulgação do relatório do Greenpeace, que acusa o governo de financiar o desmatamento na Amazônia. Ele ressaltou que cortará benefícios da cadeia econômica dos criadores de gado para coibir o desmate ilegal.
Minc apontou que os pecuaristas foram os únicos a não firmar um acordo com o ministério, ao contrário dos produtores de soja, madeira e minério. E que os que estiverem na ilegalidade não receberão recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
De acordo com o ministro, o BNDES não financiará frigoríficos que comprem carne de pecuaristas que estão desmatando.
"Temos uma lista de 105 frigoríficos e dos fornecedores de cada um deles. Vamos ver um por um. O frigorífico é corresponsável por crimes cometidos por fornecedores. Quem comprar carne ilegal não receberá recursos do BNDES", apontou, durante lançament o do Fundo da Mata Atlântica, no Rio.
Veículo: O Estado de S. Paulo