O presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luciano Coutinho, tentou transmitir ontem uma mensagem de confiança aos empresários, dizendo que o banco não deve ter problemas de funding para financiar projetos de investimento num cenário de retração na oferta de crédito externo. "Nós estamos líquidos e tranqüilos e vamos poder, na medida do possível, suprir parte das necessidades para manter o investimento em curso", disse Coutinho, acrescentando que "o banco tem folga e não há dificuldade para que se possa atingir R$ 85 bilhões de desembolsos neste ano [nos 12 meses até agosto, somam R$ 81 bilhões]". Otimista, ele afirmou ter "confiança" de o que o Brasil poderá crescer acima de 4% no ano que vem.
Segundo ele, a questão da disponibilidade de recursos para o BNDES em 2008 já está resolvida. "A situação para boa parte de 2009 também já está equacionada" , disse Coutinho, lembrando que o BNDES acabou de receber um empréstimo de R$ 15 bilhões do Tesouro. "Nós ainda não sabemos a extensão dessa situação internacional, mas o banco tem recursos para iniciar o ano que vem com tranqüilidade." Coutinho ressaltou ainda poder assegurar que já está tratando do funding para a segunda metade de 2009 e para 2010. Ele disse que haverá "fontes complementares" de recursos, mas preferiu não antecipar detalhes sobre uma "discussão que está em curso". Coutinho participou da 20ª Reunião do Fórum Nacional da Indústria, promovido pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), na sede da Associação Brasileira da Infra-estrutura e das Indústrias de Base (Abdib).
Alguns líderes empresariais presentes ao fórum relataram que algumas companhias já sentem algum efeitos da piora das condições de crédito e, embora não tenham apontado um quadro dramático, salientaram a importância do papel do BNDES neste momento. O presidente da CNI, deputado Armando Monteiro Neto (PTB-PE), disse que "empresas médias e até mesmo algumas de grande porte têm dificuldades para renovar linhas externas". "Até mesmo algumas exportadoras já sentem um pouco esse novo quadro", afirmou ele, para quem, com a contração na oferta de recursos estrangeiros, "o papel do BNDES vai ser fundamental para a sustentação da taxa de investimento no Brasil". Monteiro Neto destacou "ter motivos de confiança na atuação do banco", mas ponderou que não se pode imaginar que o BNDES por "si mesmo possa prover todos os recursos necessários ao financiamento da economia brasileira".
Coutinho disse que o BNDES está equipado para enfrentar as circunstâncias: "A mensagem é de que os investimentos continuarão fluindo e continuarão a receber o apoio do banco". Ele descartou um cenário em que empresários que baterem à porta do banco possam ficar ficar sem recursos, devido ao impacto da crise externa sobre o crédito. "Essas coisas não ocorrem de modo precipitado. Projetos de investimento resultam de decisões maduras, de uma avaliação de risco", afirmou ele. "Nós temos uma carteira de intenções de investimento muito firme e esperamos, na medida do possível, com toda a serenidade e racionalidade, dar suporte às decisões de investimento do setor privado". Ele alertou, porém, que "ninguém está pensando em financiar qualquer coisa a qualquer custo".
Coutinho destacou o ciclo de investimento em curso no país, que dá uma caráter saudável ao crescimento da economia brasileira. Segundo ele, é importante que a sustentação do investimento persista para que a expansão do PIB possa criar oferta futura, mantendo "estabilidade e crescimento". Coutinho, acredita que o ritmo de avanço do PIB deverá diminuir um pouco da casa dos atuais 6%, mas não vê "por que a taxa tenha que cair para 3% no ano que vem". "Eu tenho confiança de que nós podemos crescer acima de 4% em 2009." Mais cauteloso, Monteiro Neto avalia que o Brasil possa avançar entre 3,5% e 4% no ano que vem. Para 2008, a expectativa dos analistas é uma alta superior a 5%.
O presidente da Abdib, Paulo Godoy, disse que, dada à crise externa, "as operações de crédito estão extremanente seletivas". "Qualquer pessoa física, pequena ou média empresa que não tenha acesso a uma estrutura de crédito de longo prazo está sofrendo essa restrição." Godoy afirmou, porém, que os projetos de infra-estrutura não devem ser abalados pela crise externa. Graças em grande parte aos financiamentos do BNDES, há, segundo ele, um descolamento das condições de crédito de longo prazo para projetos intensivos em capital da situação dos empréstimos de prazo menor. "A preocupação agora é com o restabelecimento dessas linhas de curto prazo."
Godoy defendeu ainda a capitalização do BNDES e "a manutenção do fluxo de recursos para o banco, para atender os investimentos". Para complementar, afirmou que é favorável à constituição de novos fundos de investimento em participações (FIPs), que podem contar com dinheiro de empresas, fundos de pensão, pessoas físicas e do próprio BNDES para projetos na área de infra-estrutura.
Para o presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), Humberto Barbato, é possível que a crise internacional leve ao adiamento de alguns investimentos por parte das empresas brasileiras. "É normal que as companhias aguardem um pouco num momento como mo esse, mas não espero nada de dramático, porque a saúde da nossa economia é boa." Barbato disse que, por enquanto, as empresas do setor não sofrem efetivamente com a piora nas condições de crédito. "Em conversas com bancos, porém, há informações de que o crédito pode ficar mais raro e mais caro."
Veículo: Valor Econômico