Déficit no FAT ameaça formação profissional

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Em 2013, rombo no Fundo de Amparo ao Trabalhador pode chegar a R$ 1,5 bilhão e vai agravar a falta de mão de obra especializada

 

O Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), de onde saem recursos para pagar benefícios como o seguro-desemprego, caminha para um déficit cada vez maior. Os dados são do Ministério do Trabalho, com base numa projeção do fundo até 2013.

 

Segundo a estimativa, de 2010 a 2013, o déficit operacional do FAT deve aumentar 1.309,3%. O rombo daqui a três anos chegará a R$ 1,561 bilhão. O principal problema, segundo conselheiros e representantes de empregadores e empregados ouvidos pelo Estado, é a dificuldade para obter recursos para a qualificação de mão de obra.

 

Com a previsão de crescimento anual do Produto Interno Bruto (PIB) na casa dos 5% para os próximos anos, a geração de empregos deve continuar em expansão. Sem qualificação, a rotatividade dos trabalhadores será cada vez maior. Como consequência, crescerá o número de pedidos de seguro-desemprego, o que irá aumentar as despesas e piorar as contas do FAT.

 

Um dos pontos que tem alarmado os conselheiros do FAT é o fato de os pedidos de seguro-desemprego não pararem de crescer, apesar do aumento de vagas geradas, explica Luigi Nese, presidente do Conselho Deliberativo do FAT (Codefat), que administra o Fundo. "Isso vem sendo percebido há mais de 10 anos, mas agora vem acontecendo de forma exponencial", diz.

 

De 2010 a 2013, as despesas com o pagamento do seguro-desemprego, de acordo com o Ministério do Trabalho, vão crescer 45% ? em parte por causa da correção do valor do benefício, atrelado ao salário mínimo, mas também pelo aumento da demanda pelo benefício. O abono salarial, outra despesa bancada pelo Fundo, poderá dobrar de tamanho no mesmo período, segundo estimativa dos técnicos.

 

Membro do Codefat que representa a Força Sindical, Sérgio Luiz Leite alerta para o desencontro entre receita e despesa. "Cerca de 40% da mão de obra no Brasil se movimenta todo ano de um emprego para outro. E neste meio tempo, utiliza o seguro-desemprego", explica.

 

Qualificação. Leite está preocupado também com a falta de recursos para qualificar os trabalhadores: "O Brasil mal começou a crescer e gerar postos de trabalho e já se vê a ausência de mão de obra qualificada. Se seguirmos no mesmo ritmo a situação poderá ficar grave e chegarmos a um apagão".

 

No Orçamento Geral da União (OGU) deste ano ficou definido um total de R$ 226 milhões de recursos para qualificação, menos que os R$ 300 milhões do ano passado e infinitamente inferior aos cerca de R$ 1 bilhão pedidos pelo Codefat.

 

Quintino Marques, representante da Central Única dos Trabalhadores (CUT) no Codefat, diz que nas próximas reuniões os conselheiros deverão discutir formas de restringir o giro da mão de obra.

 

Um dos caminhos, segundo Marques, seria conseguir que o Congresso ratifique a Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que acaba com as demissões arbitrárias e obriga os patrões a justificá-las.

 

Ministério. Há uma compreensão divergente entre o que o ministro Carlos Lupi, do Trabalho, entende sobre as despesas do FAT e a opinião dos técnicos da pasta e parte dos conselheiros.

 

Quem convive com o ministro no Codefat diz que, para ele, o repasse de 40% do orçamento do Fundo para os cofres do BNDES, como prevê a Constituição, não equivale a despesa, mas sim a um empréstimo. Daí o fato de o ministério informar, por meio de nota, que entre os exercícios financeiros de 2010 e 2013 "projeta-se que o Fundo continue apresentando resultados econômicos superavitários".

 

Pelas contas da pasta, em 2013 o resultado econômico será positivo em R$ 18,7 bilhões. "Pela Constituição o empréstimo compulsório ao BNDES é considerado despesa. Não há o que discutir", diz Leite, da Força.

 


'Qualificação pode ser a diferença entre ter ou não um emprego'

 

Entidades afirmam que dependem dos recursos do FAT para treinar maior número de pessoas para o mercado de trabalho

 

O Plano Nacional de Qualificação do Trabalhador do FAT tem uma série de programas e, de acordo com seu orçamento, faz chamadas públicas para receber propostas de governos e entidades interessadas em receber recursos. Em contrapartida, exige a empregabilidade de 30% do total de pessoas qualificadas.

 

Recentemente a Fundação Pró-Cerrado, que atua em dez Estados e tem sede em Goiânia, foi beneficiada. Nas próximas semanas a ONG, voltada à qualificação de pessoas entre 14 e 29 anos, começará a treinar turmas para trabalhar em shoppings e na área de serviços. Terá ainda programa para afrodescendentes que entram no mercado de trabalho. "A qualificação pode ser a diferença entre ter ou não um emprego", diz Valdinei Valério da Silva, um dos executivos da fundação.

 

Adair Meira, presidente da ONG, diz que os recursos do FAT permitirão aumentar de 10 mil jovens treinados por ano para 15 mil. "Ter os recursos pode significar a diferença entre fazer mais ou fazer menos por quem precisa de qualificação para ter chance no mercado de trabalho. Imagine o que será do País sem pessoas preparadas para atender a tantas demandas, como a dos grandes eventos esportivos dos próximos anos", alerta.

 

Presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Telemarketing (Sintratel) de São Paulo, Marco Aurélio Coelho de Oliveira acaba de fechar parceria com a Secretaria do Trabalho da cidade de São Paulo para oferecer cursos de capacitação. A maior parte dos recursos virá do FAT ? a aprovação está na reta final, segundo ele. Com os cursos, será possível treinar entre 7 mil e 10 mil pessoas. O telemarketing, explica, é uma das atividades que mais atraem jovens que procuram o primeiro emprego.

 

Os shopping centers também estão prestes a fechar acordo para ampliar o treinamento da mão de obra. A parceria será com o Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e terá ajuda financeira do FAT. O Brasil tem 711 shoppings que empregam 1,015 milhão de pessoas.

 

"O setor de shoppings sente cada vez mais dificuldades em ter mão de obra que atenda a demanda. Com exceção das grandes redes de varejo, que treinam os funcionários, a maioria chega ao mercado de trabalho sem conhecer o que vende. O consumidor quer um vendedor que conheça o que está oferecendo", diz Luís Augusto Ildefonso da Silva, da Associação de Lojistas de Shopping (Alshop)./ P.P.

 


Veículo: O Estado de S.Paulo


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