Empresas apelam a importados e temem futuro

Leia em 3min

Caso exemplar das adaptações na indústria do país, a Black&Decker, uma das principais empresas de eletrodomésticos de ferramentas no Brasil, prevê faturar US$ 470 milhões neste ano, quase 13% acima do faturamento em 2009 e bem além dos R$ 400 milhões de 2000. Mas vai exportar 20% a menos que no ano passado, produzirá 5,4 milhões de unidades, 400 mil a menos que em 2000, e passou a importar da Ásia produtos que fabricava localmente para venda no mercado interno brasileiro.

 

"O faturamento com a produção local foi substituído pelos ganhos com os importados", comenta o diretor de operações da Black & Decker, Domingos Dragone. Graças à barreira antidumping imposta a produtos da China, a empresa preservou a produção de ferro de passar, que vinha sendo reduzida "drasticamente" três anos atrás, mas produtos de menor saída, como faca elétrica e espremedor de fruta são 100% importados, diz ele. "Costumávamos fazer grill (tostadeira) aqui, hoje importamos tudo, 200 mil unidades por ano. Em ferramentas industriais, passamos a importar 65%, e algumas, como serra-mármore são totalmente importadas."

 

Dragone conta que já foi pior. Em 2007, a queda na competitividade em relação aos produtos chineses, mais baratos e subsidiados, quase levou ao abandono de linhas de produção inteiras. "Ainda fabricamos 60%, para 40% de importados. Essa relação já foi de 80% para 20% e caminhamos para 50% a 50% até o fim do ano", conta. O quadro de funcionários, 700 pessoas, é ligeiramente menor que os 800 de anos atrás, mas atividades antes terceirizadas, como usinagem de peças, agora são feitas na fábrica. Na prática, eliminaram-se 200 empregos na produção.

 

"Na indústria de máquinas e equipamentos há empresas que já tiveram 300 funcionários. Hoje têm 20, e o faturamento e rentabilidade triplicaram", diz o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimac), Luiz Aubert Neto. Ele comenta que os setores protegidos por tarifas de importação de 35% ainda mantêm percentual grande de produção local, como no caso do automotivo, mas, mesmo nesses casos, os fornecedores de partes e peças têm cedido à concorrência estrangeira. "Já não há praticamente produtora de autopeças de origem nacional. No setor aeronáutico, a Embraer tem engenharia própria, mas importa a maior parte dos componentes com tecnologia embarcada", diz, lembrando que o Brasil já foi o quinto maior fabricante mundial de máquinas e, hoje, é o 14º .

 

"Os equipamentos para Belo Monte serão todos importados, não temos preço para competir", comenta Humberto Barbato, da Abinee. "Em breve aparecerão, nas estatísticas, as importações de equipamentos, de negócios que a indústria nacional perdeu", prevê. A Abinee iniciou estudos para mostrar que, por baixo dos dados otimistas, há preocupantes indicadores negativos em setores importantes da indústria. "Há claramente um processo de desindustrialização acelerado", endossa o economista Márcio Holland, que coordenou estudos recentes da FGV sobre o tema.

 

Holland reconhece que a discussão do tema tornou-se um "quebra-cabeças" em que os dois lados do debate encontram "evidência empíricas" favoráveis e contrárias às suas teses, ao mesmo tempo. Na FGV, Régis Bonelli, que nega a desindustrialização, apresenta dados que, embora mostrem recuperação recente, apontam perda do peso da indústria em relação ao passado.

 

Na mesma FGV, Nélson Marconi e Fernando Barbi, que apontam indícios de desindustrialização, mostram gráficos que, ao mesmo tempo, revelam aumento da participação, no Produto Interno Bruto (PIB), de manufaturas de alta e média tecnologia.(SL)
 

 

Veículo: Valor Econômico


Veja também

Especialistas se dividem sobre ameaça à indústria

Para a maioria, alta das importações representa risco   O debate sobre a possivel desindustrializa&...

Veja mais
Intenção de compra no varejo de sobe para o 3º trimestre

O índice de consumidores que pretende adquirir bens duráveis ou semiduráveis entre julho e setembro...

Veja mais
Pesquisa diz que consumo deve continuar em alta

Segundo dados do instituto Provar, 75,6% dos consumidores estão dispostos a comprar bens duráveis no terce...

Veja mais
Desaceleração da economia já começou

Números mais modestos no varejo e na indústria em junho revelam que "crescimento chinês" já f...

Veja mais
Mercado duvida que Palocci controle Dilma

Autonomia de petista não preocupa, mas setor financeiro aposta em papel político do ex-ministro   O...

Veja mais
Sobe e desce marca economia no 2º trimestre

Conjuntura: Comportamento dos indicadores de abril a junho aponta busca de um novo nível de crescimento  &n...

Veja mais
PIB regional mais elevado não garante redução maior da pobreza, mostra Ipea

O crescimento econômico registrado no Brasil nos últimos anos não foi suficiente para elevar o padr&...

Veja mais
Inflação para terceira idade sobe 0,92% entre abril e junho

O Índice de Preços ao Consumidor da Terceira Idade (IPC-3i), que mede a inflação entre a pop...

Veja mais
Recuo do IPCA em junho faz mercado prever juro menor

A desaceleração do IPCA em junho reduziu as previsões do mercado tanto para o índice oficial...

Veja mais