Pacote americano de US$ 700 bilhões não traz nenhum alívio ao mercado, e nervosismo se espalha no mundo
Nada parece aliviar os mercados. A aprovação pelo Senado dos Estados Unidos, na noite da quarta-feira, do pacote de US$ 700 bilhões para sanear o sistema bancário não acalmou nem um pouco os mercados mundiais. A aprovação ainda pendente na Câmara dos Representantes, os temores de uma recessão global e a percepção crescente de que a crise bancária atinge também a Europa e até o Japão fizeram da quinta-feira outro dia negro, com fortes quedas nas bolsas, alta do dólar ante outras moedas e a continuidade da crescente asfixia do crédito interbancário.
“O pacote do Senado americano pode ajudar, mas ainda temos de ver como eles vão operacionalizá-lo; de qualquer maneira, como a avalanche foi muito longe, não se deve esperar uma cura milagrosa”, analisou Armínio Fraga, sócio e fundador da Gávea Investimentos, e ex-presidente do Banco Central (BC).
No Brasil, a quinta-feira foi particularmente ruim, com alta de 5,37% do dólar comercial, que fechou em R$ 2,021, superando o nível de R$ 2 pela primeira vez desde 29 de agosto de 2007. O Índice Bovespa caiu 7,34%, para 46.145 pontos, depois de ter perdido até 9,41% (chegando perto dos 10% que acionam o circuit breaker, o sistema que paralisa temporariamente as negociações).
A ansiedade atingiu até os juros, que subiram, depois de terem caído de forma comportada durante alguns dias. Temores sobre novas perdas de grandes empresas com operações de derivativos e a preocupação com a liquidez de bancos pequenos (apesar do consenso sobre a solidez do sistema financeiro nacional) compuseram o quadro de mal-estar.
No exterior, as notícias ruins vieram tanto do setor financeiro quanto da economia real. O site do jornal Financial Times informou que, em uma semana, houve queda de US$ 95 bilhões no volume de investimentos em “commercial papers” (CP) nos Estados Unidos - a maior queda semanal desde que o indicador começou a ser divulgado em 2001. Os CPs são uma fonte vital de crédito de curto prazo para empresas e bancos, e o aperto reflete a intensa retração do crédito interbancário.
Na economia real americana, como nota Luís Fernando Lopes, sócio e economista-chefe da gestora de recursos Pátria Investimentos, “os indicadores são todos muito ruins, no desemprego, nos imóveis, na produção industrial”. Ontem, foi divulgado que o índice de gerentes de compras da atividade industrial caiu de 49,9 em agosto para 43,5 em setembro, muito mais do que a projeção média de 49,5, e o nível mais baixo desde outubro de 2001. “O problema é que a economia pode já estar bem fraca, antes mesmo de que esta última fase mais violenta da crise se transmita à atividade”, diz Gino Olivares, economista-chefe do Opportunity Asset Management.
Outra preocupação é a disseminação da crise. “Caiu a ficha agora de que o negócio é muito sério e não se limita aos Estados Unidos, é global”, acrescenta Olivares. Para Lopes, do Pátria, “os problemas são os mesmos nos Estados Unidos, na Europa Ocidental e no Japão, como a presença de investidores entupidos de derivativos dos quais ninguém sabe o valor”.
Ontem, o Índice Dow Jones, da Bolsa de Nova York, recuou 3,22%. A perda de valor de 1.240 empresas americanas acompanhadas pela Economática foi de US$ 560 bilhões. No Brasil, houve uma redução de R$ 91,6 bilhões no valor de mercado das ações das empresas que compõem o Ibovespa. A desvalorização do real ante o dólar em setembro, de 18,5%, perdeu para poucas moedas do mundo, como a coroa da Islândia (25%) e o dólar do Zimbábue (83%). Para Lopes, “o dólar não pode continuar a valorizar 5,5% num dia”. Ele teme o efeito inflacionário e espera que o BC tenha uma estratégia para conter a desvalorização do real.
Veículo: O Estado de S.Paulo