Uma inflação maior do que a inicialmente prevista elevou o valor nominal do Produto Interno Bruto (PIB) no ano passado e deverá fazer o mesmo este ano. Como a meta fiscal do setor público para 2011 foi fixada, pela primeira vez, em valor nominal, ela vai "encolher" em proporção do PIB. A projeção que já circula na área técnica indica que o superávit primário deverá ficar agora em 2,9% do PIB.
O Banco Central (BC) e o Tesouro Nacional trabalham com uma estimativa para o PIB em 2010 de R$ 3,657 trilhões. Se a esse valor forem acrescidas as previsões do mercado para o crescimento da economia (de 4,6%) e para a inflação (5,64% para o IPCA e 5,96% para o IGP-DI), expressas no Boletim Focus do final do mês passado, o PIB deste ano atingirá R$ 4,045 trilhões. No cálculo da estimativa do deflator do PIB, usou-se 70% do IPCA e 30% do IGP-DI, como fazem o BC e o Tesouro.
A meta de superávit primário do setor público para 2011 foi fixada em R$ 117,89 bilhões. Esse valor corresponde a 2,9% do PIB de R$ 4,045 trilhões. Para o governo central (Tesouro Nacional, Previdência e Banco Central), a meta de superávit é de R$ 81,76 bilhões, o que equivale a 2% do PIB. No caso dos Estados e municípios, o superávit é de R$ 36,13 bilhões ou 0,9% do PIB.
Superávit primário deve cair para 2,9% do PIB
A primeira versão da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) estabeleceu, por proposta do governo Lula, um superávit primário de R$ 125,5 bilhões para o setor público em 2011. Esse valor correspondia a 3,3% do PIB projetado para este ano, segundo estimativa da área econômica feita em abril de 2010. Naquela época, o valor para o PIB de 2011 foi estimado em R$ 3,802 trilhões.
Em novembro do ano passado, o governo Lula encaminhou ao Congresso uma proposta de alteração da LDO. O governo propôs, e o Congresso aprovou, a exclusão do grupo Eletrobras do cálculo do superávit primário. Com essa decisão, o superávit primário foi reduzido de R$ 125,5 bilhões para R$ 117,89 bilhões. O superávit das estatais federais estava fixado em R$ 7,61 bilhões, o que correspondia a 0,2% do PIB em abril de 2010. Com a mudança, o superávit das estatais foi reduzido a zero.
Se a meta fiscal de 2011 estivesse fixada em percentual do PIB, como em anos anteriores, a exclusão das estatais reduziria o superávit primário de 3,3% do PIB para 3,1% do PIB. Mas não foi o que aconteceu. Quando a mudança ocorreu, em novembro do ano passado, o novo valor do superávit primário do setor público (de R$ 117,89 bilhões) correspondia a 3% do PIB projetado pela equipe econômica para 2011 (R$ 3,927 trilhões). Os R$ 81,76 bilhões do superávit do governo central correspondiam a 2,08% do PIB.
Desde a última projeção para o PIB de 2011, houve uma piora significativa da inflação, tanto aquela registrada em 2010 quanto as expectativas para este ano. Por causa disso, o governo passou a trabalhar com uma estimativa de R$ 3,657 trilhões para o PIB do ano passado. Isso indica que o PIB de 2011 poderá ultrapassar R$ 4 trilhões. Dessa forma, os R$ 117,89 bilhões da meta fiscal do setor público estão mais próximos agora de 2,9% do PIB do que de 3%. E a meta do governo central mais próxima de 2% do PIB do que de 2,08% do PIB. O esforço fiscal este ano será, portanto, menor do que o imaginado inicialmente.
Mesmo com a redução significativa do esforço fiscal no ano passado, a dívida líquida do setor público caiu de 42,8% do PIB - posição de dezembro de 2009 - para 40,4% do PIB no fim do ano passado. No mesmo período, a dívida bruta caiu de 62% do PIB para 55% do PIB. Para esse último indicador, pesou muito a elevação dos depósitos compulsórios dos bancos no Banco Central, com a consequente redução das operações compromissadas feitas pela autoridade monetária. Os indicadores fiscais, que são apresentados sempre em proporção do PIB, foram beneficiados pelo excepcional crescimento de cerca de 7,5% da economia brasileira em 2010.
Os resultados mostram que o setor público brasileiro não enfrenta mais problemas de solvência, como ocorreu em passado recente. No longo prazo, ainda existem problemas de financiamento de algumas despesas, como é o caso da Previdência Social, que precisam continuar sendo discutidos. No curto prazo, a execução da política fiscal deve ser feita de forma coordenada com a política monetária.
No momento em que a inflação dá sinais de aceleração, não cabe apenas ao Banco Central combatê-la. O Ministério da Fazenda também pode dar uma grande contribuição para a redução da demanda da economia, com a diminuição dos gastos públicos. Isso permitirá que o BC não eleve muito os juros, afetando o menos possível a atividade econômica. O objetivo de qualquer governo daqui para frente deveria ser o de criar condições para que o Brasil deixe de figurar como o país com maior taxa de juro do mundo. Esse é um desafio que precisa ser enfrentado de maneira firme e determinada. E a coordenação das políticas fiscal e monetária é o primeiro passo nessa direção.
Veículo: Valor Econômico