O impacto da nova rodada de valorização do câmbio sobre os preços deve ser modesto, mas pode ser o suficiente para que a inflação não supere o teto da meta perseguida pelo Banco Central neste ano, de 6,5%. A expectativa de um dólar mais próximo de R$ 1,50 no fim do ano pode tirar algo como 0,2 a 0,4 ponto percentual do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a depender da evolução da taxa ao longo dos próximos meses. Nas últimas semanas, vários analistas passaram a apostar num câmbio mais apreciado em 2011, depois que a moeda caiu abaixo de R$ 1,65 sem que isso provocasse uma reação mais enérgica do BC.
O economista Fábio Ramos, da Quest Investimentos, que esperava um dólar de R$ 1,65 no fim do ano, trabalha hoje com R$ 1,50. Para ele, isso deve trazer um alívio de 0,2 ponto para o IPCA. "Não é a salvação da lavoura, mas pode ser a diferença entre a inflação estourar ou não o teto da meta", resume ele, que espera um IPCA de 6,4% neste ano. "O câmbio mais valorizado tende a evitar novas revisões para cima da inflação." Pelas estimativas de Ramos, o câmbio médio em 2011 ficará em R$ 1,60, 8,6% abaixo do R$ 1,75 do ano passado.
O dólar barato ajuda conter a inflação dos bens comercializáveis internacionalmente (os tradables), diz Ramos. As já comportadas cotações dos bens duráveis (como automóveis e eletroeletrônicos) poderiam ter um resultado ainda mais favorável - em 12 meses até fevereiro, estão em alta de 0,53%, segundo o IPCA. Os alimentos também devem ter algum alívio, uma vez que um câmbio mais apreciado atenua eventuais altas - ou acentua quedas - das commodities, quando convertidas em reais. No caso de produtos têxteis, o dólar barato pode impedir novos repasses da disparada do algodão.
A Tendências Consultoria também acredita num câmbio mais valorizado neste ano. Segundo estimativas preliminares, o dólar deve terminar o ano em R$ 1,62, e não mais em R$ 1,70. O câmbio médio, por sua vez, deverá ser de R$ 1,60, e não mais de R$ 1,68. Esse quadro implica um IPCA 0,15 ponto percentual menor, diz o economista Thiago Curado, que estima um IPCA de 6,3% em 2011. No cenário anterior para o câmbio, aumentaria a possibilidade de o indicador se aproximar ou superar os 6,5% do teto da meta, acredita Curado. "A expectativa é que o dólar ficará em R$ 1,55 no segundo e no terceiro trimestres, subindo um pouco no fim do ano." Ele espera alguma redução da liquidez internacional no quarto trimestre, o que tenderia a diminuir os fluxos de recursos para o Brasil.
Curado também estimou qual seria o impacto sobre o IPCA de um dólar que a partir do terceiro trimestre ficasse em R$ 1,50, terminando 2011 nesse patamar. A média do ano seria próxima de R$ 1,55. Nesse caso, o alívio sobre o IPCA poderia ser de até 0,39 ponto.
No mais recente relatório de inflação, o BC fez uma decomposição da inflação nos últimos oito anos. Em 2010, quando o dólar médio recuou 12,5% em relação a 2009, o câmbio tirou 0,22 ponto percentual do IPCA.
O impacto do câmbio valorizado sobre a inflação tende a ser moderado neste ano porque há fontes importantes de pressão sobre os preços que não respondem à oscilação do real, pelo menos no curto prazo. É o caso dos serviços (como aluguel, condomínio e empregado doméstico) e preços administrados (como tarifas públicas), diz a economista Ariadne Vitoriano, da Rosenberg & Associados.
Em 12 meses até março, os serviços no IPCA sobem 8,53%, impulsionados pela combinação de demanda forte, indexação de alguns itens à inflação passada, como aluguel, ou influenciados pelo salário mínimo, como empregado doméstico. Os preços administrados, que encerraram 2010 em 3,13%, já estão em alta de 4,53% nos 12 meses até março.
Segundo Curado e Ramos, o dólar mais barato pode produzir algum efeito mais relevante - e indireto - em serviços e em preços administrados para a inflação de 2012, ao segurar as cotações ao produtor no Índice Geral de Preços de Mercado (IGP-M). O indicador corrige a maior parte dos alugueis no país e é uma das referências para o reajuste de tarifas públicas, como as de telefonia.
O economista-chefe da Máxima Asset Management, Elson Teles, diz que um real mais forte tende de fato a propiciar algum alívio sobre a inflação, mas destaca que é necessário que o novo nível das cotações seja duradouro, para que se consolide a percepção dos agentes econômicos sobre a nova cotação. Segundo ele, o coeficiente de repasse do câmbio para os preços costuma ser de 5%: uma valorização de 10% do real tende a produzir um alívio de 0,5 ponto no IPCA.
Veículo: Valor Econômico