O Planalto e as equipes do BC e da Fazenda buscam o apoio de formadores de opinião para a defesa da estratégia anti-inflação
O Planalto e a equipe econômica têm procurado, nas últimas semanas, ampliar o diálogo com segmentos dos mercados financeiro e empresarial em busca de apoio para a estratégia de combater a inflação sem precisar aumentar muito a taxa Selic. A coordenação das expectativas é essencial para a travessia da fase atual, de divulgação de indicadores desfavoráveis, como o IPCA em 12 meses que se aproxima do teto da meta (6,5%).
O ex-ministro Delfim Netto, interlocutor frequente do Palácio do Planalto, é um dos nomes com quem o governo já reforçou o diálogo - esteve com a presidente Dilma Rousseff antes de ela embarcar para a China. Em artigos e entrevistas recentes, Delfim tem dito que é "coisa do passado" a ideia de que a taxa de juros (Selic) pode controlar a inflação, dando respaldo teórico às chamadas medidas macroprudenciais pelo presidente do BC, Alexandre Tombini.
A lista de apoios e elogios públicos também inclui o economista-chefe do Bradesco, Octávio de Barros - que classificou de "estupendo" o trabalho do BC. O ex-secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy, e o sócio da Mauá Investimentos e ex-diretor de Política Monetária do BC durante o governo FHC, Luiz Fernando Figueiredo, são outros dois nomes que dialogam com a equipe econômica.
São economistas de destaque no cenário nacional, que têm saído em defesa do governo, numa espécie de "rede de proteção das políticas diferenciadas" que o BC e a Fazendo têm adotado. A rede serve de contraponto às críticas de analistas que veem o governo "patinando em gelo fino" na condução econômica.
Sangue frio. O argumento do governo tem sido o mesmo: mostrar que não há nenhum país combatendo a inflação e enfrentando a guerra cambial com os instrumentos que o Brasil está usando. O momento agora, na visão do governo, "é de sangue-frio e calibragem de ações de curto prazo", como a alta do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para capital externo e empréstimos de pessoas físicas, até a consolidação de uma agenda de médio prazo.
A mobilização dos governo justifica-se porque o Brasil é um dos países "queridinhos" dos investidores internacionais, mas, internamente, a equipe econômica enfrenta um decisivo teste de credibilidade na condução das políticas de combate à inflação, cambial e fiscal, o que não é visto desde 2002, quando o País passou por uma crise econômica às vésperas da eleição do presidente Lula.
Esse mix de sucesso e desconfiança tem causado um clima de "estranheza no ar". O sucesso é evidenciado pela nova elevação do grau de investimento dado pela agência Fitch de classificação de risco e pelo volume recorde de investimentos estrangeiros diretos que ingressam no País.
Uma das preocupações da equipe econômica é com o risco de deterioração do cenário o internacional, a começar pela pressão altista do preço do petróleo.
Segundo uma fonte de uma instituição financeira estrangeira, a estratégia do governo brasileiro tem sido bem compreendida pelos investidores externos. A maior desconfiança estaria na política fiscal, após dois anos de manobras contábeis para cumprimento das metas.
70% do mercado espera alta da Selic para 12,25%
A taxa Selic, juro básico de referência da economia do País, deverá ser aumentada em 0,50 ponto porcentual pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC), na próxima quarta-feira, de atuais 11,75% ao ano para 12,25%. É o que esperam 49 de 70 instituições do mercado financeiro consultadas pelo serviço AE Projeções, da "Agência Estado", ou seja 70% do total. A pesquisa foi feita antes de o presidente do BC, Alexandre Tombini, indicar, na sexta-feira, novo aumento na taxa de juros.
No levantamento, chama a atenção, no entanto, as 20 instituições, ou 28,57% do total pesquisado, que trabalham com uma alta de 0,25 ponto porcentual da taxa, para 12% ao ano.
O Banco Santander é a única instituição a contemplar estabilidade da taxa nominal de juros. Levantamento preliminar feito com 35 casas na segunda-feira já mostrava que 12 destas instituições trabalhavam com um aumento de 0,25 pp da Selic, o que indicava a falta de consenso no mercado em relação ao que o BC irá fazer com a Selic. A última vez que o mercado fechou consenso em torno de uma alta da Selic foi em outubro do ano passado.
Naquele momento, era unânime entre os analistas a expectativa de que o Copom manteria a taxa parada em 10,75% ao ano, o que foi confirmado pelo comitê.
Inflação de março põe Copom sob pressão
Tombini vai para sua 3ª reunião sobre juros sem ter obtido sucesso em conter o mau humor do mercado
Depois de ter sinalizado que o ciclo de aperto monetário estaria perto do fim e que a taxa básica de juros (Selic) poderia subir em um ritmo menor, a alta da inflação em março - acima do esperado até pelo governo - e a incerteza sobre o grau de desaceleração da economia tornaram mais difícil a tarefa do Banco Central (BC).
Enquanto a maior parte dos economistas trabalha com alta de 0,50 ponto porcentual na Selic, o mercado de juros futuros mostra que há uma divisão entre quem aposta em 0,25 ponto e quem aposta em alta de 0,50 ponto, com maior peso para o primeiro grupo (0,25 ponto).
Além da piora da inflação e da incerteza sobre o ritmo da economia, as expectativas do mercado financeiro para a inflação estão piorando, aumentando a pressão sobre o BC.
Na última semana, a pesquisa Focus, realizada pelo BC junto ao mercado, mostrou que a projeção central do mercado para a inflação neste ano é de 6,26%, já bem próximo do teto de 6,5% da meta de 2011. Na semana anterior, a previsão era de 6,02%.
O presidente do BC, Alexandre Tombini, adicionou dúvidas ao dizer, na sexta-feira, que "estamos no meio de um ciclo de aperto monetário". A declaração foi interpretada como indicação que o processo de alta na Selic não deverá parar em abril.
Tombini vai para sua terceira reunião à frente do Comitê de Política Monetária (Copom) sem ter obtido sucesso em conter o mau humor do mercado. Apesar do esforço do governo de mostrar que o BC tem sido o mais ativo do mundo no combate à inflação, utilizando alta de juros, medidas prudenciais e um aperto fiscal, grande parte dos analistas ainda acha que o mix de política econômica é só um caminho para se usar menos o remédio amargo da Selic. E que isso representa um risco muito alto.
"Acredito em alta de 0,5 ponto na Selic. Mas o correto seria ir além disso, por uma questão de aversão ao risco. A estratégia pode dar certo, mas pode dar errado. É muito arriscado", diz o professor da USP, Fabio Kanczuk.
O economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini, diz que a estratégia gradualista de política monetária "não será suficiente para vencer a alta da inflação e, tampouco, preservar a credibilidade do sistema de metas de inflação e da própria autoridade monetária".
Veículo: O Estado de S. Paulo