Especialistas alertam para o fato de que há uma massa salarial diferenciada que não está sendo estudada pelo governo para fins de conter a inflação. O professor da Escola de Negócios e Direito da Anhembi Morumbi, Marcello Gonella, acredita que criar medidas paliativas para diminuir o consumo, como a restrição de crédito, não irá resolver o problema da pressão inflacionária originada pela demanda interna. "O rendimento da população cresceu e tende a continuar em expansão, e por isso o governo tem de ser efetivo na redução dos seus gastos para que a inflação não seja um problema para o futuro", diz.
Pesquisa da Fundação Getúlio Vargas (FGV) divulgada ontem comprova esse aumento do rendimento da população brasileira na última década. E para o professor do Centro de Política Social da FGV, Marcelo Néri, a diminuição da pobreza e a maior distribuição de renda devem continuar a avançar nesta década. "Se o governo brasileiro melhorar a qualidade da educação, da gestão pública, fazer mais com menos recursos, tem como elevar o rendimento populacional nesta década (2011 a 2020), assim como foi no período passado. Temos plataformas para fazer isso, como o bolsa-família", entende o professor da Fundação.
Pesquisa
De acordo com o estudo da FGV, a pobreza caiu 50,64% entre dezembro de 2002 e dezembro de 2010, época do governo do então presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva. O resultado superou a queda de 31,9% registrada no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, a incluir o período de implementação do Plano Real. "É possível chamar a década passada (anos 2.000) como a década da redução da desigualdade. A desigualdade atingiu seu menor nível mínimo histórico", comemorou Néri.
Segundo o estudo, o Brasil conseguiu em oito anos atingir meta que as Organizações das Nações Unidas (ONU) estabeleceu para ser alcançada em 25 anos. "A primeira meta do milênio da ONU é reduzir a pobreza a 50% em 25 anos (1990 a 2015). Ou seja, pela métrica da ONU, o Brasil fez 25 anos em 8", destaca a pesquisa.
O estudo foi feito com base dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) e Pesquisa Mensal de Emprego (PME), do Instituo Brasileiro de Geografia e estatística (IBGE).
Para Néri, o destaque foi a redução de 67% da pobreza no País nos anos 2000. "Essa diminuição é reflexo da diminuição da desigualdade de renda. Entre os 50% mais pobres a distribuição cresceu 68%, enquanto que para os 10% mais ricos aumentou 10%. Podemos dizer que para os mais pobres a década passada mostra um país com expansão semelhante ao da China, enquanto que para os mais ricos, o País sofreu estagnação", conclui o professor da FGV, ao acrescentar que esse crescimento de renda entre os mais pobres foi devido, principalmente, pelo maior acesso à educação em geral.
Salário mínimo
Outro ponto de preocupação com relação à inflação no curto prazo é que o salário mínimo deve continuar a ser reajustado. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse ontem, ser "possível um reajuste de 13% a 14% em 2012, até porque este ano não teve aumento real". "É preciso conciliar desenvolvimento social com desenvolvimento econômico", analisa Guido Mantega.
Para o ministro o aumento do salário mínimo em 2012 não preocupa. Segundo ele, "é coisa do passado" a mentalidade de que aumento do salário gera pressão inflacionária. "Aumento do salário mínimo é mercado, é consumo, é estímulo à produção e ao investimento", defendeu o ministro, em audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado.
O ministro, no entanto, destacou que é preciso ter cuidado para manter o equilíbrio das contas da Previdência no longo prazo. "A Previdência é o maior gasto que o Estado tem", disse. Segundo ele, o déficit no INSS tem caído. Já foi de 1,8% do Produto Interno Bruto (PIB) e caiu para 1,2% do PIB.
Alternativas
O diretor de Relações internacionais da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), Andrew Frank Storfer, também reconhece que há uma pressão bastante forte e contínua da demanda interna sobre a inflação. "Mais da metade do PIB é de serviços e a inflação deste setor está descontrolada e é difícil de conter", explica. Porém, ele aponta alternativas para frear este consumo que seriam mais eficazes neste momento. "Reduzir os prazos de financiamento, direcionar melhor o crédito ou enxugar o crédito para evitar o compulsório seriam medidas com melhor efeito prático. Por exemplo, não alongar os prazos para compra de eletrodoméstico, limitaria a capacidade de compra de determinados produtos", afirmou o especialista.
Veículo: DCI