Órgão tem investido numa variedade maior de investigações e acaba elevando a receita de autuações
Em 2007, a participação das importações de pisos laminados chegou a 20% do mercado doméstico e acendeu um sinal amarelo entre os fabricantes nacionais. As indústrias levantaram dados e encaminharam informações sobre produtos e preços a órgãos do Ministério do Desenvolvimento e do Ministério da Fazenda. Nos dois anos seguintes houve forte fiscalização no desembarque de pisos. Além de apreensões de produtos que não cumpriam as normas técnicas exigidas, houve verificação do valor declarado nas importações e maior fiscalização para o enquadramento fiscal correto dos itens.
As medidas deram resultado, segundo Carlos Eduardo Mariotti, relações institucionais da Abiplar, que reúne a indústria de piso laminado. Atualmente, diz, os preços médios de importação estão 20% acima do que era cobrado em 2007 e o nível de falta de cumprimento de normas técnicos foi reduzido. Esse é apenas um exemplo numa tendência da Receita de aumentar a fiscalização nas importações em situações diversas.
Na Delegacia Especial de Maiores Contribuintes (Demac), que fiscaliza em todo país as grandes empresas, com faturamento anual superior a R$ 90 milhões, a fiscalização na importação também tomou mais espaço. Instalada em maio do ano passado, a Demac sucedeu a antiga Delegacia de Assuntos Internacionais, cujas ações de fiscalização eram baseadas quase que totalmente em pagamento do Imposto de Renda por empresas com estabelecimentos no exterior, em preços de transferência e em planejamento tributário.
Segundo Monica Sionara Schpallir Calijuri, titular da Demac, como resultado de uma mudança de foco no início deste ano, a fiscalização das importações ganhou mais espaço dentro da delegacia. Do total de 250 processos de fiscalização mantidos atualmente pela Demac, cerca de um quinto verifica o valor aduaneiro declarado no momento do desembarque. Envolve, portanto, as importações. Por enquanto, diz Monica, o foco na análise do valor aduaneiro são os royalties. Pagos a proprietários de produtos, marcas e patentes, os royalties fazem parte do preço do produto e devem ser integrados no valor declarado na importação. A ideia é verificar se o valor dos royalties não está menor do que o devido ou se não foi omitido.
Em São Paulo, a Inspetoria da Receita Federal, orgão responsável por verificar o desembaraço aduaneiro nos portos secos, é outro exemplo de maior fiscalização nas importações. Houve uma mudança recente nas funções da inspetoria. Antes ela prestava serviços para o desembaraço de mercadorias, além de atuar na fiscalização. Desde dezembro, porém, a delegacia deixou de fazer o desembaraço aduaneiro. A especialização no trabalho de fiscalização fez diferença. Segundo José Paulo Balaguer, titular da inspetoria da Receita Federal em São Paulo, no primeiro quadrimestre de 2010 houve 33 ações fiscais que resultaram em autuações de R$ 154,3 milhões. No mesmo período deste ano, o número de ações fiscais saltou para 45 e as autuações, para R$ 920,6 milhões.
Segundo Balaguer, o salto no valor autuado deve-se não só à concentração de esforços da inspetoria na fiscalização, como também na ampliação do tipo de operação, que passou a ser verificado. Tradicionalmente voltado para operações de drawback e uso de empresas laranjas na importação, o foco da fiscalização foi ampliado. Hoje a inspetoria também analisa o uso de incentivos fiscais na importação em grandes setores, como automotivo, aeronáutico e de embarcações. A ideia é verificar todos os tributos devidos na importação: PIS, Cofins, Imposto de Importação e IPI.
"Os novos focos de fiscalização representam 70% do valor das autuações fiscais", diz Balaguer. Segundo ele, é fiscalizado principalmente o uso de incentivos fiscais destinados a esses setores. Duas das principais causas das autuações são a falta de regularidade fiscal em termos de documentos necessários para o uso dos incentivos, problema presente em metade das autuações fiscais, e a classificação fiscal dos itens importados. "A suspensão de tributos costuma ser concedida somente para uma lista definida de partes e peças, por exemplo. As empresas muitas vezes declaram irregularmente vários itens nas classificações que estão dentro do incentivo." De acordo com o inspetor, a classificação fiscal "errada" está presente em cerca de 30% das autuações.
A atenção maior da Receita para as importações não tem passado despercebida por quem defende os contribuintes. Luiz Gustavo Bichara, sócio do Bichara, Barata, Costa e Rocha Advogados, diz que o escritório acompanha 15 casos de autuações fiscais relacionadas a importações. "Dois terços são deste ano", diz. Há cerca de dois anos, conta, essas autuações eram raras. "Surgiam uma ou duas por ano." Outra coisa que chama sua atenção é que quase todas são resultado de fiscalização feita após o momento do desembaraço aduaneiro. Isso revela, diz, que a Receita tem reservado um olhar mais cuidadoso para essas operações. E tem reforçado o caixa com elas.
Mariotti, do setor de laminados, conta que em 2007 cerca de 90% do produto importado usava a classificação errada, que resulta num pagamento de Imposto de Importação (II) de 10%. O correto, defende ele, era uma classificação para a qual o imposto é de 14%. Atualmente, somente 5% dos produtos desembarcados entram com a classificação tributada em 10%.
"Houve um interesse da Receita Federal na fiscalização, porque o quadro anterior resultava em menor arrecadação de tributos", diz Eduardo Ribeiro Augusto, sócio do De Vivo, Whitaker, Castro e Gonçalves Advogados, escritório que acompanha o caso dos laminados.
Veículo: Valor Econômico