Depreciação de 40% do yuan ante o dólar e valorização do real encarecem mercadoria produzida no país.
O produto brasileiro pode custar, em média, quase o dobro de seu similar chinês, tanto no mercado interno quanto no externo. Segundo cálculos do economista e consultor José Aristides Souto, nos últimos 15 anos, o yuan se desvalorizou aproximadamente 40% ante o dólar, enquanto o real foi sobrevalorizado em mais de 20%, o que deixaria o preço da mercadoria nacional 60% mais alto. Se além do câmbio também fossem levados em conta fatores como custo de mão de obra e tributação, a diferença poderia ultrapassar os 80%.
Na prática, os cálculos podem ser facilmente comprovados na ponta do consumo, a partir da comparação do preço final dos produtos. De acordo com o proprietário da fabricante mineira de eletrodomésticos Suggar, José Lúcio Costa, em alguns casos, a mercadoria nacional chega a custar mais do que o triplo dos equivalentes asiáticos. Dos 154 produtos da marca, apenas nove são fabricados no Brasil.
"Tentamos fabricar ferro de passar roupa, mas desistimos porque apenas o cabo de tomada custa R$ 13,70, enquanto a mercadoria chinesa pronta custa US$ 2. Mesmo com as taxas de importação, ela chega aqui por US$ 7, ou seja, o produto importado acabado custa menos do que um dos componentes nacionais", exemplifica.
Em outros setores, o cenário não é diferente. Conforme o presidente do Sindicato das Indústrias de Aparelhos Elétricos, Eletroeletrônicos e Similares do Vale da Eletrônica (Sindvel), em Santa Rita do Sapucaí (Sul de Minas), Roberto de Souza, todos os investimentos e a tecnologia desenvolvida para a produção de conversores de sinal digital de TV foram desperdiçados por causa do alto custo do produto, que não consegue concorrer com os similares chineses.
"Lideramos as pesquisas e o desenvolvimento do equipamento, que já foi testado, aprovado e está pronto para ser vendido. Apesar disso, não há demanda pelo aparelho nacional. Quase 100% dos modelos vendidos no Brasil são chineses porque o nosso custa US$ 300 e o do país asiático US$ 150", revela.
A solução para fazer frente às importações foi apostar na adequação dos equipamentos à necessidade dos clientes. "A China, por exemplo, se preocupa com a quantidade produzida, enquanto nós passamos a desenvolver soluções tecnológicas para atender à demanda, como o chicote elétrico para residências, que é um componente inovador que elaboramos para sanar uma necessidade mercadológica", ressalta Souza.
Outras causas - Na avaliação do economista da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flávio Castelo Branco, a desvalorização do dólar não é o principal agravante para a queda da competitividade no país. Ele explica que a baixa cotação da moeda americana fez com que os altos encargos e os elevados custos da mão de obra, logística e do capital, fatores que mais contribuem para o encarecimento do produto brasileiro, ficassem mais evidentes.
"Não podemos esperar que a solução seja apenas a alta do dólar, até porque não há indícios de que isso deva ocorrer no curto ou médio prazos. A melhor forma de reduzir o problema seria a implementação de uma mudança na estrutura tributária, que sofre o efeito cascata. Ou seja, impostos incidem sobre impostos e aumentam o custo final. O atual sistema não permite uma compensação às empresas, como ocorre em outros países, como Argentina, por exemplo", observa.
"Há ainda o custo do capital, sujeito aos altos juros, e as despesas com logística, já que o país carece de infraestrutura portuária, aeroportuária e rodoviária. Além disso, também há o custo da mão de obra e os encargos da folha de pagamento. Todas estas condicionantes ficam mascaradas pela valorização do dólar, mas quando a cotação da moeda americana está baixa, os fatores voltam a assombrar a indústria", diz.
O primeiro passo, segundo ele, seria a desoneração dos investimentos e da folha de pagamento. "A realização de uma reforma tributária é complexa e demorada, embora urgente", sugeriu. Segundo os cálculos do economista um investimento de US$ 355 milhões no país sofre influência de tributação indireta equivalente a US$ 60 milhões, enquanto na China, não há acréscimo de impostos.
Veículo: Diário do Comércio - MG