A dificuldade do Brasil de não avançar em acordos de livre-comércio com outros países ou blocos, como é o caso da União Europeia, é porque o País está "amarrado" ao Mercosul. Ou, seja, depende da vontade dos demais integrantes do bloco (Argentina, Paraguai e Uruguai) para concluir os acordos. A interpretação é do ex-secretário de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic) e atual consultor do setor, Welber Barral. Ele também atribui à forte situação do setor agricultor a dificuldade dos processos internacionais.
"Na prática, o fato de o País não fechar mais acordos de livre-comércio é devido ainda ao temor que existe com relação à competitividade da agricultura brasileira. A força deste setor assusta. O nosso agronegócio é provavelmente o mais competitivo do mundo e, ao mesmo tempo, o setor é o mais protegido com altas tarifas e muitas barreiras técnicas", disse ele ao DCI, após participar do Café Setorial de Comércio Exterior realizado pela Câmara Americana de Comércio (Amcham), em São Paulo.
Segundo Barral, além desses dois fatores (Mercosul e agricultura), às vezes, a falta de acordos também é explicada pela desaprovação de alguns setores industriais, por não quererem a liberação de produtos internacionais para evitar a concorrência no País.
Questionado se há uma guerra comercial no Mercosul, Barral brinca. "Guerra impossível, paz improvável". Mas ele acredita que, no caso da Argentina, algum acordo será fechado. Mas ressalta que pelo fato de não haver nenhum avanço, não há muito que opinar. "Pelo fluxo de comércio entre Brasil e Argentina essas negociações irão ocorrer sempre", prevê.
Ainda na sua opinião, o Brasil precisa identificar quais parcerias têm menor participação da indústria brasileira.
Contudo, para Barral, a importância do comércio com o país vizinho no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro vai diminuir dos atuais 17% do PIB para 10% do PIB em dois anos. "O Brasil cresce mais rápido que a Argentina, sendo que esta ainda passa por um processo de recuperação econômica. Além de que a moeda brasileira está mais valorizada, o que favorece o aumento do seu PIB. Na Argentina ocorre o contrário."
Pesquisa
Ainda ontem, a Amcham divulgou uma pesquisa com empresários sobre a situação do comércio exterior no Brasil. Para a maioria dos 103 entrevistados (entre presidente, diretores e gerentes), infraestrutura e custo logístico (24%), sistema tributário e alta carga tributária (21%) e burocracia aduaneira (19%) são os principais fatores que afetam as operações no País. "São fatores que afetam todos os setores brasileiros", entendeu a diretora de produtos e serviços da câmara, Mara Lacerda.
Para Barral, o sistema tributário é o mais problemático de todos os gargalos. "Sistema tributário pune os exportadores, principalmente aqueles que comercializam manufatura", diz.
Segundo a pesquisa, 35% sugerem o reforço na infraestrutura como o principal desafio para o País se tornar uma potência mundial no comércio exterior. Para 30%, simplificar o sistema tributário é a principal barreira, seguido por criar políticas que incentivem operações internacionais (27%).
Questionado sobre a proposta de implementação de alíquota única do ICMS cobrado na importação em portos brasileiros, que para governos, como o de São Paulo, deve ser a primeira definição dentro da reforma tributária, Barral concorda que é preciso ter uma conclusão deste item, já que os altos custos de produzir aqui afugentam empresas para o exterior, e resulta ao comércio interno somente a distribuição dos produtos. Por outro lado, ele comenta que há também companhias que mudam para outros mercados, a fim de se internacionalizar e gerar mais escala de produção.
Na pesquisa da Amcham, 40% dos entrevistados querem abrir escritório em outro país, destes, 18% preferem os Estados Unidos; 16% a União Europeia; e outros 16% demais países do Mercosul.
Barral também comenta que a questão da infraestrutura começou a ser apontada como problema a partir deste ano. No ano passado, segundo ele, o câmbio, por exemplo, era uma grande preocupação, hoje 5% dos respondentes na pesquisa consideram ser um fator negativo. "O fato de o comércio exterior ter crescido no País, ao mesmo tempo em que a infraestrutura permaneceu a mesma, começa a ser um forte gargalo", justificou. "Com relação à questão cambial, há uma acomodação com o atual nível de câmbio, de modo que aumentar a eficiência produtiva passou a ser mais preponderante", acrescentou Welber Barral.
Ainda de acordo com a pesquisa feita pela Câmara Americana, Mara Lacerda observa que há um equilíbrio entre aqueles que enxergam um futuro positivo ao setor nos próximos anos (55%) e que aqueles que projetam o contrário (45%).
Veículo: DCI