Os produtos importados ganham cada vez mais espaço no mercado interno. No segundo trimestre deste ano, a participação das importações no consumo doméstico de bens industriais atingiu 21,6%, o nível mais alto da série calculada pela LCA Consultores - no mesmo período de 2010, o número estava em 19,1%.
O aumento reflete o crescimento das importações a ritmo bem superior ao da produção local, num cenário de câmbio valorizado e de expansão da demanda a um ritmo ainda razoável. A fatia dos importados avançou tanto em setores beneficiados pela nova política industrial, como têxteis, calçados e móveis, como em outros segmentos importantes da indústria, caso de produtos químicos, veículos automotores e máquinas, aparelhos e materiais elétricos.
No primeiro semestre, a produção industrial cresceu 1,7% em relação ao mesmo período do ano passado, uma alta bem mais modesta que a registrada pelo volume importado, de 13,7%, segundo a Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex). O economista Thovan Tucakov, da LCA, vê o câmbio valorizado como o fator fundamental para explicar a perda de espaço do produto nacional ante o importado, por minar a competitividade dos bens fabricados no país.
O setor têxtil sofre bastante com o avanço dos importados. No primeiro semestre, a produção local do segmento caiu 12,6%, período em que a importação aumentou 21,8%. Com essa diferença a fatia dos importados no setor alcançou 22,9% no segundo trimestre. Em 2005, estava em torno de 8%.
O presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), Aguinaldo Diniz Filho, diz que a importação "predatória" explica os péssimos resultados do setor. Ele alerta que o ramo, segundo maior empregador da indústria de transformação, com 1,7 milhão de empregos diretos, já começou a demitir em junho, ao eliminar 560 vagas. Segundo Diniz Filho, isso pode parecer pouco, mas se for levado em conta que cada posto de trabalho na indústria têxtil gera quatro empregos indiretos, o número de demitidos devido às importações é bem maior.
Diniz Filho afirmou que está otimista com a nova política industrial do governo, mas que é preciso dar um senso de urgência ao setor têxtil. "Neste ano vamos faturar R$ 90 bilhões. Em reunião com a presidente Dilma, falei que seria uma ingenuidade entregarmos nosso mercado interno para a China. Se esse quadro continuar, aumentará o desemprego e cairá até o consumo de importados."
O economista-chefe da corretora Convenção, Fernando Montero, também vê as importações tomando espaço da produção doméstica, num cenário de aumento forte da demanda. Em maio deste ano (dado mais recente), as vendas do varejo ampliado (que inclui veículos, autopeças e material de construção) estavam 23,3% acima do nível atingido antes do agravamento da crise global, em setembro de 2008. Já a produção industrial se encontrava em junho 1,3% abaixo do registrado no pré-crise. Grande parte do aumento da demanda foi abastecida por produtos importados.
No setor de calçados e artigos de couro, a fatia dos importados no consumo doméstico ficou em 10,8% no segundo trimestre. Um ano antes, estava em 8,9%. O setor de máquinas e equipamentos já tem uma fatia expressiva do consumo interno atendido por importações: 35,5%, bastante acima dos 29,5% de igual período de 2010. Em 2005, o número era pouco superior a 20%. No setor de veículos, em que a importações de carros asiáticos cresce com força, a fatia dos estrangeiros está em 20,6%, o dobro do que ocorria em 2005.
Para Tucakov, os importados devem continuar a ganhar terreno da produção nacional, mas o avanço tende a ser mais moderado. Ele acredita que o câmbio deverá seguir valorizado, apostando num dólar a R$ 1,55 no fim do ano, nível próximo do atual, que facilita muito as importações. A perspectiva de uma demanda mais fraca, contudo, tende a reduzir o ímpeto das importações, acredita Tucakov
Veículo: Valor Econômico