Presidente diz que situação é gravíssima e Guido Mantega afirma que se Congresso aumentar salários de PMs e bombeiros ''efeito será catastrófico''
A presidente Dilma Rousseff e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, aproveitaram a reunião de ontem do Conselho Político do governo para pedir aos aliados que não aprovem despesas novas e derrubem qualquer proposta de aumento salarial no Congresso Nacional. Dilma cobrou responsabilidade para o Brasil conseguir enfrentar o impacto da crise econômica mundial, definida por ela como "gravíssima".
Em tom incisivo, Mantega disse que, se o Congresso aprovar a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) regulamentando um piso nacional de salários para policiais e bombeiros, a chamada PEC 300, o efeito no Brasil será "catastrófico". O ministro chegou até a comparar as consequências do eventual aumento ao clima de fim de mundo observado com a turbulência global nos últimos dias.
Na avaliação de Mantega, reajustes salariais para o Judiciário provocariam "efeito cascata" - já que entidades como Ministério Público e Polícia Federal tendem a reivindicar o mesmo aumento -, inviabilizando o equilíbrio das contas públicas.
O ministro já havia feito apelo semelhante na véspera, quando participou de uma audiência na Câmara para discutir a nova crise financeira internacional. Mantega deixou claro que tanto o Congresso como o Judiciário terão que ajudar o Executivo a manter as contas equilibradas.
Preocupada com as insatisfações na base aliada, Dilma também fez um apelo pela unidade e "compreensão". Afirmou que os aliados não podem deixar caducar o projeto que prevê a prorrogação, por mais quatro anos, do mecanismo que permite ao governo manejar livremente 20% dos recursos do Orçamento federal, a Desvinculação de Receitas da União (DRU).
A proposta precisa ser votada até dezembro, quando expira a vigência atual do mecanismo. "A DRU é fundamental para nós", disse Dilma.
Troco. A presidente deseja manter a DRU até 2015, mas aliados revoltados acham que a votação será a oportunidade para dar o troco no Palácio do Planalto. O Conselho Político é formado por 15 partidos da base de sustentação do governo no Congresso, mas desde as demissões que atingiram o Ministério dos Transportes - no rastro de denúncias de corrupção - tornou-se um fórum de reclamações.
No PR do senador Alfredo Nascimento, o ministro que caiu com o escândalo nos Transportes, tanto deputados como senadores dizem que a votação da DRU é "muito difícil". Furioso com as demissões no setor de transportes, o PR está prestes a deixar a base aliada. "Nós ficaremos numa posição de independência. Projetos que forem claramente do PT, mas ruins para a população, nós não vamos apoiar", disse o senador Blairo Maggi (PR-MT).
Com a manutenção da DRU, Dilma planeja utilizar como bem entender a margem de 20% de recursos livres do Orçamento. A presidente disse com todas as letras que, se o Congresso não contribuir, seu governo será muito prejudicado.
Contenção de R$ 50 bilhões deve virar corte
Governo deve tomar decisão como estratégia de segurar gastos para proteger o País da crise
O governo pretende transformar em corte efetivo de despesas a contenção de R$ 50 bilhões do Orçamento federal deste ano. A decisão faz parte da estratégia de segurar os gastos para proteger o País dos efeitos da crise financeira internacional. A trava nas despesas, anunciada no início do ano, será seguida à risca, o que pode auxiliar o Banco Central a cortar juros mais à frente, se necessário.
Tradicionalmente, o governo anuncia em fevereiro um corte nas despesas programadas no Orçamento, após aprovação da proposta no Congresso. Ao longo dos meses, entretanto, parte do dinheiro contingenciado é liberado, à medida em que a arrecadação de tributos cresce. Este ano, entretanto, a tradição será rompida. O aperto nos cintos também abrange a contratação de novos funcionários para o governo, que será praticamente paralisada. Servidores que já foram aprovados em concursos públicos ainda podem ser chamados para trabalhar, mas a análise será feita caso a caso.
A ideia é convocar os já aprovados em momento bem próximo ao vencimento do concurso, para não onerar a folha mais do que o necessário. Não há previsão de aumento dos cargos de confiança. O racionamento inclui, ainda, viagens e diárias, que serão reduzidas em até 50%, seguindo diretrizes de um decreto da presidente Dilma Rousseff deste ano. A economia terá prioridade sobre políticas públicas, que podem ser prejudicadas ou interrompidas temporariamente em nome do ajuste fiscal.
Salários. As negociações salariais com servidores também serão duras. A estratégia traçada é mostrar aos sindicatos que durante os oito anos do governo Luiz Inácio Lula da Silva os servidores tiveram ganhos salariais acima da inflação. Agora, com a perspectiva de desaceleração da economia mundial, é hora de pisar no freio. A ordem é aumento zero de salário. Na melhor das hipóteses, o valor seria apenas corrigido pela variação da inflação.
Diante da atmosfera de tensão com a base aliada, a palavra nos bastidores do governo é "sensibilizar" a coalizão sobre a necessidade de cortar despesas neste ano. As propostas de emendas constitucionais (PECs) que fixam piso nacional para salários de policiais e o porcentual mínimo de investimento em saúde também devem ficar na prateleira, mesmo que impliquem mais gastos apenas para o Orçamento dos próximos anos.
O plano de voo traçado por Dilma e sua equipe econômica pode ampliar a margem de manobra do Banco Central caso seja necessário cortar a taxa básica de juros, hoje em 12,5% ao ano. Ao reduzir os gastos, e consequentemente manter a trajetória de queda da dívida pública em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), o Ministério da Fazenda contribui para a redução da inflação.
Veículo: O Estado de S.Paulo