BC agora mira no dólar para tentar segurar a inflação

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Leilão faz cotação cair para R$ 2, a menor em 7 meses.Para analistas,objetivo é segurar preços

  

Depois de baratear a conta de luz, adiar o aumento da gasolina e das tarifas de ônibus, a próxima cartada do governo na batalha contra a inflação é segurar a cotação do dólar, na opinião de analistas. Essa estratégia ficou clara na investida do Banco Central (BC), ontem, no mercado de câmbio. A autarquia fez um leilão para rolar US$ 1,85 bilhão em contratos de swap cambial, que venceriam em 1º de fevereiro. Na prática, o BC injetou esse dinheiro no mercado e empurrou a cotação para baixo. Com isso, o dólar fechou ontem na menor cotação em sete meses, a R$ 1,999 na compra e a R$ 2,001 na venda, com queda de 1,33%.

Após o anúncio do leilão, pela manhã, o dólar comercial, que estava em alta, passou a se desvalorizar e fechou na menor cotação desde 2 de julho, quando fechou a R$ 1,98. A queda de 1,33% foi a maior num dia desde 26 de dezembro, data do último swap cambial. Na máxima de segunda-feira, o dólar foi negociado a R$ 2,037 e na mínima, R$ 2,001.

Havia expectativa no mercado de que o BC não fosse rolar esses contratos futuros de dólar, o que poderia fazer a moeda voltar a se valorizar ante o real. A rolagem, que reduz a procura dos bancos pela divisa americana, reforçou a avaliação de especialistas de que o BC quer um dólar mais baixo para reduzir as pressões sobre a inflação. Por isso, a moeda cedeu tanto.

— Ao fazer a rolagem dos contratos que venceriam em fevereiro, o BC sinalizou que vai usar o câmbio como instrumento de combate à inflação, já que a expectativa do mercado era de que não fossem rolados. Por isso, embora o governo sinalizasse que queria um dólar mais próximo de R$ 2, os investidores mantinham as posições compradas. Com o anúncio do leilão, o mercado reagiu imediatamente, vendendo dólares. Agora, os bancos devem reforçar suas posições vendidas em moeda americana — disse o gerente de câmbio da corretora Treviso, Reginaldo Galhardo.

Focus: expectativa de inflação em alta, crescimento em baixa

De acordo com a pesquisa semanal Focus, que o BC faz com as principais instituições financeiras do país, divulgada antes do leilão de contratos de câmbio, a projeção para a média do dólar no ano caiu de R$ 2,06 para R$ 2,05. Os economistas esperam que este seja o início de uma tendência, já que a previsão de inflação não para de subir, mesmo com a de crescimento em queda.

Segundo o levantamento do BC, as principais expectativas pioraram pela quarta semana seguida. A projeção para a inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação oficial, subiu de 5,65% para 5,67% neste ano. Já a perspectiva de crescimento foi no sentido contrário: caiu de 3,19% para 3,10%.

Mesmo com esse cenário, o BC deixou claro, na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que manter os juros estáveis em 7,25% ao ano é a melhor estratégia. Com isso, os economistas descartaram novos cortes e mudaram de visão: acham que o BC voltou a focar em inflação e não mais em crescimento. E apostam que o câmbio será utilizado para controlar os preços.

— Ficou claro que o BC não vai cortar os juros e está mais comprometido com a inflação — avaliou o economista-chefe do Banco ABC Brasil, Luis Otavio Leal. — Certamente vão aumentar as apostas de que o câmbio pode ficar abaixo de R$ 2 para controlar a inflação.

Já para o economista-chefe da corretora Gradual, André Perfeito, mexer com o câmbio para controlar a inflação não tem muita eficácia pois os formadores de preços olham para a cotação no fim do ano. Ele acredita que o dólar mais baixo não foi uma ação orquestrada pelo BC para controlar a inflação, já que a autarquia não tem meta de câmbio:

— O BC tem de se posicionar nessa discussão. O que vimos hoje foi o mercado reagir de forma violenta só à possibilidade de a autoridade monetária tentar controlar a inflação pelo câmbio.

Perfeito criticou ainda a falta de clareza na comunicação do BC.

Em novembro, quando o dólar chegou a R$ 2,10, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que o câmbio estava numa posição “razoável”, mas ainda não satisfatória. Segundo ele, o dólar mais forte era uma forma de ajudar a indústria a ficar mais competitiva. À época, o ministro explicou que o governo estava praticando uma política monetária em que o controle da inflação se dava por meio do juro mais baixo, e não com o câmbio.

Mas, no fim do ano, com o dólar pesando sobre a inflação e o aumento da procura pela divisa americana, o governo mudou de estratégia: começou a afrouxar as medidas regulatórias que freavam sua entrada no país. Em dezembro, reduziu de dois para um ano o prazo dos empréstimos externos sujeitos a 6% de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). E ampliou de um para cinco anos o prazo para antecipação de receitas de exportação sem a incidência do IOF.

Ainda em dezembro o BC fez leilões de linhas — que equivalem à venda de dólares conjugada com recompra feita diretamente aos bancos — no valor de US$ 1,5 bilhão. O objetivo era que as instituições financeiras repassassem os recursos a seus clientes. Tiveram pouco impacto sobre a cotação, mas ajudaram a suprir a procura pela moeda americana.

Além disso, o BC fez dois leilões de swap cambial em 26 de dezembro, movimentando US$ 1,8 bilhão. A moeda americana, que flutuava entre R$ 2,05 e R$ 2,10, banda informal mantida pelo governo, segundo analistas, passou para R$ 2 a R$ 2,05. Na época, o diretor de Política Monetária do BC, Aldo Mendes, disse que havia “um pouco de gordura” na taxa de câmbio.

— A rolagem de contratos de swap cambial feita hoje (ontem) mostra que a palavra do Aldo Mendes é que está valendo. Apesar do volume da operação não ser tão expressivo, veio ao encontro ao que o governo estava sinalizando (dólar mais próximo de R$ 2) e por isso a moeda cedeu tanto — avaliou João Medeiros, sócio da corretora Pionner e especialista em câmbio.

No mercado de ações, a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) fechou em queda de 1,87% ontem, aos 60.027 pontos, com volume de R$ 7,4 bilhões. Ações de bancos pesaram sobre o índice, após o resultado mais fraco que o esperado divulgado pelo Bradesco, cujos papéis PN recuaram 3,15%. As ações do Itaú Unibanco PN caíram 2,79% e as ON do Banco do Brasil, tiveram queda de 2,55%.

Os papéis da Vale, um dos mais líquidos, tiveram o maior giro financeiro do pregão: R$ 497 milhões. E registraram queda de 2,43% (ações PNA). A empresa informou ontem que sua diretoria executiva aprovou, e submeterá a seu Conselho de Administração, proposta para pagamento de dividendos (parcela do lucro distribuída aos acionistas) para este ano de US$ 4 bilhões (US$ 0,776190372 por ação ordinária ou preferencial em circulação). O valor será distribuído em duas parcelas, em 30 de abril e 31 de outubro.



Veículo: O Globo - RJ


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