O que está tirando o sono dos presidentes

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Existem três temas principais que estão tirando o sono dos presidentes de empresas brasileiras neste fim de ano: a necessidade de promover uma redução de custos em suas companhias, as demissões que provavelmente terão de fazer e as ações do governo relacionadas à crise. Pesquisa realizada com 532 comandantes de companhias no país, 30% com faturamento acima de R$ 5 bilhões, entre novembro e o início de dezembro, mostra que a maioria dos dirigentes espera que a crise tenha um impacto negativo nos negócios em 2009. Depois de crescer em ritmo acelerado nos últimos anos, eles afirmam que precisarão adequar suas estruturas, moldadas para outra realidade. Embora vislumbrem um cenário ruim nos próximos meses, 83% acreditam que sairão da crise com planos de crescimento redimensionados e fortalecidos.

 

Para reposicionar o negócio em um novo cenário econômico turbulento, a palavra de ordem entre os presidentes é ser espartano e até conservador em suas organizações. No estudo conduzido pela pesquisadora Betania Tanure, da Fundação Dom Cabral e PUC Minas, 85% dos executivos dizem que a crise terá um impacto negativo ou muito negativo nos negócios. "Nossas jovens multinacionais estão desesperadas. Elas não têm um portfólio internacional equilibrado, justamente porque são novas e estão vivendo sua primeira crise mundial", diz. Quase 90% dos comandantes afirmam que antes de o cenário escurecer mundialmente este ano, suas companhias, em especial aquelas com faturamento superior a R$ 5 bilhões, estavam muito focadas em crescimento. Agora, os esforços estão voltados para a redução de custos. "Todo investimento precisará justificado e associado a um benefício", afirma Betania. 

 

O presidente da Fiat, Cledorvino Belini, diz que treinamento, por exemplo, é investimento e não custo, mas neste momento "tudo que sai do caixa está automaticamente cancelado". O que tem tirado seu sono nos últimos meses é a preocupação em estabelecer uma estratégia para sair da crise. A Fiat vive hoje em regime de austeridade. O mercado de automóveis já caiu 30% este ano, segundo ele. "Cortamos viagens e demos férias coletivas", conta. A companhia ainda está decidindo se haverá necessidade de demitir. "Mantemos um mapeamento dos talentos estratégicos", revela. 

 

Na pesquisa, mais de 50% dos entrevistados disseram que a redução de pessoas no nível operacional e gerencial está em fase de decisão, implementação ou está decidida e não implementada. "Neste momento será preciso separar o joio do trigo, manter os mais competentes e depois administrar a competição interna", diz Betania Tanure. 

 

Aos 59 anos de idade e 35 de Fiat, Belini conta que já enfrentou muitas turbulências e hoje faz a lição de casa estudando o passado. "Essa crise é bem diferente das outras, pois é externa e não interna, como as anteriores", diz. Ele lembra que na crise do petróleo de 1982, quando comandava a área de tratores da companhia, as vendas despencaram de 130 unidades ao mês para 9. No Plano Collor, elas caíram 40% por cinco meses consecutivos. "Acredito que vamos sair dessa até 2010", diz. Para ele, o Brasil ainda tem um mercado grande a ser explorado no setor automotivo. "Se quisermos ter um carro para cada dois habitantes, teremos que vender mais 75 milhões de automóveis", diz. Ele diz que os problemas conjunturais não podem afetar essa visão de longo prazo. 

 

Para o diretor-presidente da mineradora Samarco, José Tadeu de Moraes, 53 anos, pensar no longo prazo é uma questão de sobrevivência nesse momento. "A maturação dos negócios em muitos setores leva anos", lembra. Sua companhia também aderiu a um regime de austeridade financeira. Foram cortadas viagens e alguns treinamentos foram postergados. "Só mantivemos o que era necessário para tocar a operação", diz. Depois de ter dado férias coletivas aos funcionários pela primeira vez nos anos 80, a Samarco repetiu a medida. Seus empregados só voltarão ao trabalho em janeiro. "É preciso ganhar fôlego para atravessar esse período", diz. A companhia investiu US$ 1,5 bilhão em seu plano de expansão este ano. A segunda etapa desses investimentos continua prevista para 2010. 

 

O grande desafio, segundo os presidentes entrevistados, é equilibrar a redução de custos com os planos de crescimento. "Não dá para saber exatamente o impacto dessa crise e a sua duração", diz Moraes. Se para os executivos mais experientes como ele o futuro é motivo de apreensão, para os mais jovens este é um momento de intensa ansiedade. Existe uma geração de líderes que chegou ao topo nos últimos anos e não atravessou outras crises. "Eles estão muito pessimistas ou otimistas demais. Na verdade, não conseguem dimensionar o que está acontecendo porque não viveram nada parecido", acredita Betania Tanure. "O executivo brasileiro que foi durante anos reconhecido pela competência em empreender em ambientes de crise agora está perplexo." 

 

Na pesquisa, quem está no topo da pirâmide parece estar mais pessimista do que aqueles que ocupam cargos gerenciais. "Isso pode significar que as empresas estão operando com dois parâmetros diferentes, o que é muito ruim", diz a pesquisadora. Para ela, fica claro que a mensagem não está sendo levada adiante dentro das organizações. "Assim fica mais difícil comprometer as pessoas neste momento", diz. 

 

Embora os dirigentes menos pessimistas sejam aqueles cujos negócios estão voltados para o mercado interno, segundo a pesquisa, existem outros que enxergam neste momento uma oportunidade de expandir suas operações no exterior. "Temos um produto barato e queremos ser uma marca global", diz Márcio Utsch, 49 anos, presidente da Alpargatas, referindo-se às sandálias da marca Havaianas, um dos carros-chefe do grupo. "Em toda crise conseguimos crescer, acho que não será diferente desta vez", acredita. Ele diz que implantou um programa de redução de custos em julho deste ano. "Fizemos uma reengenharia na fabricação de nossos produtos", diz. Utsch conta que conseguiu fechar o ano cumprindo as metas estabelecidas. "Vamos ver agora o que acontece com o varejo", diz. 

 

Utsch acredita que o Brasil está bem posicionado em relação aos outros países considerados emergentes. "É o mais bem estruturado com uma política constante que favorece os investidores", diz. Para ele, o papel do governo brasileiro será muito importante para as companhias no ano que vem. 

 

A maioria dos dirigentes pesquisados apontou o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, como aquele que garante equilíbrio ao governo. Outros se mostraram preocupados com o posicionamento do Presidente da República, Luis Inácio Lula da Silva, frente a onda de desemprego em uma ano eleitoral. O presidente da Fiat diz que a redução do IPI já melhorou as vendas e foi uma medida concreta do governo em relação à crise. "Como líderes temos a obrigação de não deixar que ela chegue no Brasil como um tsunami, mas sim como uma marola", diz. 

 


Veículo: Valor Econômico


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