A queda na produção industrial em outubro foi superior à desaceleração dos custos com folha de pagamento e levou a indústria a registrar aumento de 1,5% no custo unitário do trabalho, incremento superior ao da inflação do período. O Índice Geral de Preços - Disponibilidade Interna (IGP-DI) atingiu 1,09% no mês e o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) variou 0,45%. No mês, houve queda na produtividade de 1,4%, resultado de uma retração mais forte na produção (1,7%) do que no total de horas pagas (0,2%), de acordo com cálculo da Tendências Consultoria Integrada baseada em dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
No acumulado de 12 meses, o custo do trabalho (indicador que mede a evolução do salário real descontada a produtividade) apresentou incremento de 0,44%, a primeira variação positiva desde fevereiro de 2006, quando o indicador variou 0,02% e o mais alto desde novembro de 2005, quando subiu 0,82%. Cálculos do Valor revelam que apenas o setor de papel e gráfica apresentou melhora no custo de produção, com queda de 7,07% no acumulado de 12 meses até outubro (no intervalo de 12 meses até setembro, a queda foi de 6,77%). Nos outros 16 setores que compõem a indústria de transformação, houve aumento nos custos produtivos ou redução inferior à observada até setembro.
Nos 12 meses até outubro, houve aumento no custo unitário do trabalho nos setores de coque, refino de petróleo, combustíveis nucleares e álcool (15,94%), madeira (7,35%), produtos de metal, excluindo máquinas e equipamentos (6,96%), fumo (6,84%), produtos químicos (5,16%), metalurgia básica (4,76%), minerais não-metálicos (4,51%), máquinas e aparelhos elétricos, eletrônicos, de precisão e comunicações (1,92%) e alimentos e bebidas (0,83%).
Outros oito setores tiveram queda no custo do trabalho, mas em menor escala que no intervalo de 12 meses até setembro. Foi o caso de borracha e plástico (4,69%), fabricação de meios de transporte (3,52%), calçados e couro (2,49%), vestuário (1,9%), máquinas e equipamentos (1,83%), têxtil (0,44%) e outros produtos (2,95%).
A elevação do custo do trabalho é mais um reflexo de que a desaceleração da economia começa a causar perda de eficiência no setor industrial. Já o incremento superior à inflação é motivo de preocupação para alguns economistas, que vêem nesse resultado um fator de pressão inflacionária para os próximos meses. "Pode haver pressão inflacionária de salários se o custo do trabalho se mantiver superior ao custo de produção por mais tempo", afirma a economista Ariadne Vitoriano, da Tendências, observando que a produção em outubro foi impactada por paralisações técnicas em refinarias e concessão de férias coletivas não planejadas. "A expectativa é de que haja quedas mais fortes na produtividade em novembro e aumento no custo do trabalho", diz.
Alguns indicadores da atividade industrial sinalizam redução do ritmo também no mês de novembro. O fluxo de veículos pesados nas estradas registrou queda de 2% em comparação com outubro, com ajuste sazonal, e de 1% em relação a novembro de 2007, informou na semana passada a Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR).
A indústria automotiva, de maior peso dentro do setor, registrou queda na produção de veículos de 33,4% em relação a outubro e de 28,9% sobre novembro de 2007, conforme dados da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). O segmento, que está entre os que sofreram mais impacto da crise financeira internacional, também registrou redução no número de empregados, mas em percentual bem menor, de 0,4% no mês.
O Sinalizador da Produção Industrial (SPI) da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e da AES Eletropaulo, que indica a atividade do setor no Estado de São Paulo com base no consumo de energia, apontou queda de 6% na produção de novembro em relação a outubro, com ajuste sazonal. O Estado responde por cerca de 40% da produção industrial no país.
O economista da área de análise do Banco Itaú, Aurélio Bicalho, considerou o aumento nos custos uma etapa natural no processo de desaquecimento da atividade. "A produção cai e o custo aumenta; se o processo de desaceleração se prolonga, a redução do nível de emprego torna-se inevitável. O mais importante é que o aumento foi conseqüência da redução da produção, e não de uma elevação excessiva nos salários", afirma. O custo elevado por alta de salário, diz, produz necessariamente pressão inflacionária. "Já esse resultado deve levar a uma redução da contratação e de algum ajuste que permitirá às indústrias voltarem a reduzir os custos em alguns meses", avalia. Para ele, os ajustes devem ocorrer primeiro nos setores de bens de consumo duráveis e naqueles voltados à exportação.
Também para o professor do Núcleo de Economia Industrial (Neidi) da Unicamp Célio Hiratuka, o aumento no custo do trabalho como reflexo da queda maior na produção tem um efeito menos pessimista que no caso do aumento por conta de salários. "A indústria vinha num ritmo de crescimento muito forte e parou. Mas a empresa não olha só o curtíssimo prazo. Tudo vai depender de como o empresário vai encarar as medidas de ajuda", pondera. Ele reconhece, no entanto, que alguns setores já sentem os efeitos da crise e devem promover ajustes na mão-de-obra, como siderúrgico, metalúrgico, automotivo, de autopeças e os vinculados à construção civil.
Veículo: Valor Econômico