O déficit mensal recorde no comércio exterior brasileiro, em fevereiro, confirmou uma tendência que vem desanimando investidores nacionais do setor de bens de capital: aumentam as importações de máquinas e equipamentos, desviando para o exterior parte do estímulo à demanda criado com as grandes obras de infra-estrutura. Em fevereiro, puxadas pelo aumento de 1% na importação de maquinaria industrial e de 68% nas compras de "equipamento móvel de transporte" como locomotivas (mais de 8,6 mil % de aumento) e veículos para inspeção de vias (mais de 1 mil%), a média diária nas compras externas de bens de capital cresceu 5,4% em relação ao mesmo mês de 2012.
Em janeiro, o aumento já havia sido de quase 15%, o que leva a 10% o crescimento nas importações de bens de capital no primeiro bimestre. "A gente tem um grande problema aí, que é a perda de competitividade, com câmbio, juros e tributos", desabafou o presidente da Associação Brasileira de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Luiz Aubert Neto. "Do valor de meu produto, 40,3%, são impostos; isso é um absurdo", comentou Aubert.
Na semana passada, em Brasília, ao discursar na reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, o presidente da Abimaq queixou-se à presidente Dilma Roussef dos efeitos do que chamou de "tripé do mal": a política de câmbio desvalorizado e juros e tributos mais altos. "O investimento não pode ser penalizado, tem de ser promovido", criticou. "O investimento o Brasil é caro, por isso há 18 anos não sai de 19%, 20%". Embora não haja dados consolidados, muitos fabricantes passaram a complementar a própria linha de produção com equipamentos importados, admite ele.
No setor de bens de capital de encomenda, voltado a fabricação de máquinas e equipamentos confeccionados com especificações exclusivas para determinados projetos industriais, apesar do impulso dado pelos incentivos do governo, os empresários foram surpreendidos pela mudança na balança comercial que passou de superavitária até 2007 a uma situação de equilíbrio, em 2008 e, desde então, vem registrando sucessivos déficits.
"Foi uma guinada histórica brutal", comentou para o Valor o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Base, Paulo Godoy, que representa grandes empresas do setor. Em 2008, as importações de bens de capital sob encomenda chegaram a US$ 5,1 bilhões, número que caiu para US$ 4,4 bilhões no ano seguinte e começou uma trajetória de alta. Em 2012, as importações caíram 1,5% em relação ao recorde de US$ 6,2 bilhões de 2011; mas a queda ainda maior nas exportações do setor fez com que o balanço final ficasse negativo, em quase US$ 1,1 bilhão.
Por enquanto, nesse subsetor, as importações não são vistas como uma grande ameaça, devido à criação, pelo governo, do Programa de Sustentação de Investimentos (PSI), com juros favorecidos na compra de equipamentos nacionais, especialmente, em grandes obras de infra-estrutura. "O PSI deve ajudar a frear a tendência de aumento de importação", acredita o presidente da Abdib, que desaconselha mudanças como uma maior desvalorização do real. Mas a chegada de grandes companhias chinesas como investidoras, principalmente em obras de geração e transmissão no setor elétrico, levantam um "certo alerta", segundo Godoy.
"São empresas gigantescas, com o Estado por trás, sem dificuldade de financiamento na China", diz ele. Esses investidores dão preferência a equipamentos chineses, financiados pelo governo local. "Um dos temas que se discute hoje é se não caberia também para o setor elétrico uma política de conteúdo nacional."
Veículo: Valor Econômico